terça-feira, 8 de agosto de 2017

7 - Nossa imprensa esportiva...




O ano de 1982. O Brasiiiiil jogava na copa do mundo, disputada na Espanha, uma partida contra a seleção italiana. O Brasiiiiiiiiil encantava com o futebol apresentado. A nossa alegre, empolgada e animada imprensa esportiva dava aquele titulo como certo. O adversário era a Itália, na fase de quartas de final. Uma Itália que chegou aos tropeços empatando os jogos, ou ganhando sem brilho. Já o Brasiiiiiiil, era a seleção dos sonhos. Bastava apenas um empate, no jogo contra a Itália, para que o Brasiiiiiiil avançasse na competição. O clima era de confiança e euforia total. Na tv que detinha os direitos de exclusividade para a transmissão dos jogos, um repórter, Ricardo Pereira, entrevistava o jogador Zico, na véspera do jogo, na piscina do hotel onde o Brasiiiiiiil estava concentrado. Repórter e jogador, ambos de sunga, dentro da piscina, com microfone e tudo, em total clima de oba-oba, já ganhou. Veio o jogo e o Brasiiiiil perdeu por 3x2. O dia cinco de julho de 1982 entrava para história como uma das maiores tragédias do país. Um dia de inverno, que no Rio de janeiro a temperatura chegava próximo dos quarenta graus, em um céu azul, limpo, e uma brisa confortante. Inconformados com o resultado, nossa alegre, empolgada e animada imprensa esportiva inventou uma tese que o jogo poderia ser anulado por conta de uma suposta irregularidade de um jogador da seleção italiana. Durante três dias, mais precisamente até a seleção italiana entrar em campo para a próxima partida, nossos briosos jornalistas discutiram, em mesas esportivas, debates e inúmeros programas esportivos as "reais" possibilidades de anulação da partida. Advogados especialistas no esporte, pessoas de notório saber deitaram falação ao extremo sobre o tema fictício, até que a realidade falou mais alto, e a aceitação da derrota foi inevitável, mesmo para os mais apaixonados. Durante três dias nossa alegre, empolgada e animada imprensa esportiva surtou. Discutiu, com apoio dos patrocinadores, um tema que não tinha o menor fundamento, que não existia e que fora motivado pela imensa frustração da derrota. Aquele 05/071982, aqui no Rio , pós-jogo permitiu que cariocas mais atentos, pudessem vivenciar uma cidade sem vestígios do ruído urbano ( veículos sumiram das ruas , os aparelhos elétricos pareciam desligados, vozes altas não se ouviam, ruídos de obras despareceram e outros ruídos que compõem um barulho constante na cidade ). Nem mesmo um 25 de dezembro, domingo, com chuva, seria tão silencioso. Era possível ouvir os pássaros cantando. Paradoxalmente, um dia fantástico.
8 - Nossa imprensa esportiva...



Estávamos no ano de 1993. A seleção brasileira, que na tv que detêm a exclusividade das transmissões é conhecida como Brasiiiiil entrava em mais uma eliminatória para a copa do mundo de futebol. Vinte e três anos do último título mundial de 1970, deixavam nossa alegre, empolgada e animada imprensa preocupada com tamanho jejum. O Brasiiiiil caiu nas eliminatórias em um grupo com Uruguai, Bolívia , Equador e Venezuela com duas vagas para a copa. Barbada!, diziam nossos animados especialistas . No jogo contra a seleção do Equador, que até então nunca disputara uma copa, em Quito, nosso Brasiiiil, comandado por Carlos Alberto Parreira, adotou uma postura defensiva e de respeito ao adversário, esperando o momento para o bote. Na tv, o narrador da partida, com sua equipe de respeitados comentaristas, demonstrava profunda irritação pelo comportamento da equipe brasileira. Dizia ele:


- narrador: O Brasiiiiiil não pode jogar assim. Somos tricampeões do mundo. Temos que agredir o adversário. Aí, o Brasiiiiil está com medo. Esse time do Equador tirando onda com a gente. Esse jogadorzinho do Equador..... Bate nele.
- comentarista de arbitragem: ele está provocando nossos a atletas.

narrador: ele é folgado. issso é porque o time deles está empatando como o Brasiiiiiil . Se esse time do Brasiiiiiiil jogar assim está arriscado de não se classificar para a copa do mundo e, caso classifique não vai ganhar nada.

A seleção brasileira de futebol, ao final das eliminatórias se classificou em primeiro lugar no seu grupo, tendo a seleção boliviana ficado com a segunda vaga. Na copa do mundo, em 1994, a seleção brasileira ganhou a competição sagrando-se tetra campeão mundial de futebol. Nosso narrador da tv com exclusividade nas transmissões de futebol, ficou empolgadísssimo com a conquista do Brasiiiiiil. Ao seu lado, na narração estava Pelé como comentarista. Ao se confirmar a dramática conquista do titulo, comemorada com um penalty que o adversário bateu para fora, nosso narrador agarrou Pelé pelo pescoço, deu-lhe uma gravata, e com gritos intensos dizia;

- é tetra !!! é tetra "!!!!   é téééééééééééééééééééétra! ´

é tééééééééééééééétra!

Uma imagem registrou a cena e mostrou os demais profissionais de imprensa assustados com a comemoração de nossa alegre, empolgada e animada imprensa. O mesmo narrador que disse que o Brasiiiiiil não iria ganhar nada, naquele momento vibrava com a conquista. Conquista que certamente assegurou melhores índices de audiência na emissora que detêm a exclusividade das transmissões de futebol, melhores audiências de programas esportivos, maior interesse das pessoas por futebol, mais jornais sendo vendidos, e consequentemente mais verbas de patrocínio para os jornais, tv e rádios. Verbas que também garantiram o emprego de muitos profisssionais de nossa animada, empolgada e alegre imprensa esportiva, para que eles pudessem seguir falando e escrevendo as asneiras de sempre.
9 - Nossa imprensa esportiva...

Uma partida de futebol, sem muita importância, como é a maioria, rolava no Maraca. Um Fluminense x Bangu de dar sono, a não ser pela participação do narrador e do comentarista da tv. O time do Fluminense estava em decadência e o Bangu, sequer estava em alguma coisa. Terminado o primeiro tempo e o placar apontava vitória de 2x0 para o tricolor. Poucos minutos antes do início do segundo tempo, um diálogo sério e compenetrado , sim o diálogo foi sério e compenetrado, entre o narrador e comentarista. 

Vamos lá:

narrador : E aí , como está o jogo?

comentarista: Tá uma moleza só, tá certo ? Alí no meio passa tudo, tá entendendo ? O meio do Fluminense tá metendo todas nas costas do Bangu. Só tem baranga naquela defesa, tá certo ? É só encostar, tranquilo, toca a bola, tá certo ?, que mete mais . Agora, tem que tocar. Tocando é mais fácil.

narrador: Quer dizer que tá de bom tamanho ou cabe mais ? 


comentarista; Cabe, cabe. Cabe mais sim. Olha aqui, o que não pode é forçar. Tem que tocar, tá entendendo? Agora, por enquanto tá de bom tamanho, mas se se chegar junto, ali no meio, mete todas. Tem que trabalhar ali no meio e encostar, tá certo ?


narrador : Taí o que você queria. Bola rolando para o segundo tempo.
l0 - Nossa Imprensa Esportiva...

Uma partida de futebol acontecia normalmente. Como de costume, nossa briosa e animada imprensa radiofônica, disponibiliza profissionais no campo de jogo para informações mais precisas e repleta dos mais variados detalhes. Um repórter, daqueles que fica posicionado atrás dos gols, foi chamado pelo narrador para detalhar um lance. Ele começou bem a narrativa, seguiu com elegância mas o final foi uma tragédia. Tudo aconteceu quando um jogador de um dos times cobrou uma falta, bem perto da área do time adversário. O jogador que cobrou a falta tinha um chute violentíssimo que acabou acertando um jogador que estava na barreira· 

Aí vai o diálogo:

narrador - E aí fulano, o que vocẽ viu ?

repórter - Um falta cobrada com extrema violência atingiu as partes baixas de uma atleta que caiu , imediatamente, e grita de dores. Felizmente todo o departamento médico do clube já se posicionou para o atendimento ao atleta. Ao que parece ele sofreu falta de ar mas já se recupera lentamente. O serviço médico está aplicando um spray para amenizar a dor e flexionando as pernas do atleta. Esse é o único momento que quando um jogador sofre uma pancada não são permitidas massagens. É , meu amigo, bola com bola não é mole não. Informou Capemisa, as pessoas seguras são mais felizes.
ll - Nossa Imprensa Esportiva...


O ano era 1972. Comemorava-se no país os 150 anos da independência do Brasil. O sequiscentenário, palavra que criou alguns constrangimentos na imprensa esportiva. Para comemorar a data o Brasil sediou uma competição de futebol, chamada de Mini Copa do Mundo ou Copa Independência. Participaram do evento 16 seleções de futebol, divididas em quatro grupos, assim como acontecia na Copa do Mundo na época. Por uma ironia do destino, chegam  para disputar a grande finalíssima as seleções de Brasil e Portugal. No dia da grande final, com o Maraca lotado, tribuna de honra repleta de autoridades, no momento em que as seleções entravam em campo, um empolgado repórter de uma emissora de rádio saiu com essa :

" Brasil e Portugal em campo. Chega o grande momento do Brasil reafirmar sua independência, esse país que tem o presidente gente como a gente"

Detalhe : O presidente era o general Médici, em anos de tortura, violência e repressão.
l2 - Nossa imprensa esportiva....

Estávamos no ano de 1969, mais precisamente no dia em que o sol entrava no signo de câncer, que tem como planeta regente a Lua. Por uma dessas coincidências, naquele dia o homem pisaria pela primeira vez em solo lunar. O assunto dominava todas as rodas, assim como a possibilidade de assistir pela TV, ao vivo, a epopeia espacial. Em se tratando de anos da década de 1960, aqueles acontecimentos fantásticos do dia , seriam apenas alguns mais da década. Como o assunto dominava, nossa alegre, empolgada e eclética imprensa esportiva não poderia ficar de fora e resolveu mandar seus pitacos. O diálogo , que reproduzo abaixo, aconteceu entre um narrador e um comentarista, ambos empolgados, antes do início de uma partida de futebol no Maraca;

narrador - prezados ouvintes. Hoje a humanidade viverá um momento histórico. Pela primeira vez o homem pisará o solo da lua. Vejo que nosso comentarista, que acaba de entrar aqui na nossa cabine de transmissão, traz um pequeno aparelho de tv .


comentarista - De fato. mesmo não podendo assistir em minha residência, não irei perder esse momento histórico. Um momento que irá inaugurar uma nova fase de conquistas e que , no futuro, fará da lua um local para o homem construir cidades e bases para novas explorações espaciais.


narrador . Você não acha que a conquista da lua vai acabar com o romantismo que existe em torno do satélite ?

comentarista- Veja bem. O romantismo não acabará nunca ,mesmo com o homem conquistando a Lua. Ela ( a Lua ) que inspira poetas, apaixonados, que dá luz aos nossos imensos campos desse Brasil grande, que encanta a todos com sua beleza, continuará a ser a fonte inspiradora para os namorados. O que seria dos namorados sem a lua ? O romantismo não acabará nunca.

narrador . Muito bem !!! Muito Bem !!! Depois dessas sábias palavras lunáticas , vamos as escalações das duas equipes .



Eiiiiiiiiita, lunáticos !!
l3 - Nossa imprensa esportiva...


Poucos meses atrás todos nós lamentamos o falecimento de um grande jogador de futebol e , principalmente, de um grande homem. Morreu o Doutor Sócrates.

Vítima de complicações hepáticas, oriundas de consumo excessivo de bebidas alcoólicas, como assumido por ele mesmo, o Doutor deixa saudades. Saudades de seu elegante futebol e de suas firmes posições no campo político, sempre na defesa dos ideais democráticos. No dia de seu falecimento, ocorria um jogo do Corinthians, time que lhe deu grande expressão nacional. A partida era transmitida pela emissora que detêm a exclusividade de transmissão de jogos de futebol. No início, o minuto de silêncio teve os atletas do Corinthians repetindo o gesto do Doutor quando comemorava seus gols. Um braço com o punho cerrado para o alto e outro atrás nas costas. No momento da homenagem, forte e marcante nas telas de tv de todo país, apareciam logotipos, no alto do vídeo, das empresas que patrocinam as transmissões esportivas da tv que detêm a exclusividade de transmissão. Um deles era de cerveja.