segunda-feira, 7 de novembro de 2016

A bovinidade brasileira avança

O gigante que querem que seja anão  

POR FERNANDO BRITO · 05/11/2016

Ontem, todos os jornais deram destaque ao trabalho do japonês Hajime Narukawa, que redesenhou, muito mais proximo da realidade, o mapa do mundo que “vigia” desde que Gerardus Mercator transformou, há quase 500 anos, a Terra em um cilindro, para representá-la num mapa plano.

O resultado, claro, foi que “quem” estava mais próximo do Equador ficou “menor” e quem estava mais próximo dos pólos “cresceu”.

O que, afinal, correspondia em parte à importância cultural e econômica do mundo “desenvolvido”: subtropical, europeu.

O mapa de Narukawa, se olhado com mais que simples curiosidade, mostra que somos maiores do que sempre pensamos olhando o velho mapa de Mercator

Repare: maiores que os EUA, sem o Alasca.

Quase do tamanho da China, esse gigante.

Mas temos uma elite que pensa que um gigante assim pode ser anão.

Pequeno e “bem-comportado”.

Com um governo que faça “o dever de casa” como uma criança, em corpo de homem.

Obediente, quieto, fazendo “tudo o que seu mestre mandar”.

(...)

Fonte: TIJOLAÇO
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Fonte: CARTA MAIOR
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Classe média: o fetiche do igual

POR MARIA BITARELLO– ON 01/11/2016CATEGORIAS: BRASIL, COMPORTAMENTO, DESTAQUES, SOCIEDADE


Vive de aparências e acha isso chique. 
E se tudo isso te parece apenas medíocre e inofensivo, não se engane: há garras e dentes. 
Pois é nela que é feita a engorda do ódio. 
É ela que legitima atrocidades.

Fonte: OUTRAS PALAVRAS
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Em uma aguda crítica sobre a irracionalidade do mundo atual, o PAPIRO produziu e publicou em maio de 2012 o conto abaixo:


razão e emoção
                                              arte PAPIRO de maio de 2012
             

Encontros Cariocas - 1 

Insano Mundo Novo

11.05.2012


Entrava em um restaurante, na Praça Mauá, no centro da cidade do Rio de Janeiro, quando sinto alguém segurando meu braço. Olhei rapidamente para a pessoa e vi um rosto familiar. Fiquei parado tentando me lembrar e ele me perguntou:

- e aí, perdeu a memória ?

- Carninha !!, respondi com alegria.

Carninha é um grande amigo. Passamos bons momentos no ano de 1982 na Brizolândia. Eram reuniões e mais reuniões para debater o cenário político e criar agitações para colocar o Brizola no governo da estado. Sempre depois das reuniões tudo mundo ia para um bar. Carninha, alto e bem gordo, com quase 150 kg, era o primeiro a sugerir algo para comer. Sempre sugeria uma carninha, fazendo um gesto com as mãos que imitava uma faca tirando um filé de um suculento churrasco. O apelido pegou. Seu nome é Leôncio da Silva Albuquerque, mas todo mundo conhecia como Leo Carninha.


- não consegui reconhecê-lo de imediato. Você emagreceu bem. É outra pessoa.

- nada disso. continuo o mesmo , apenas eliminei depósitos de lipídeos. falou e deu uma gargalhada.

Carninha era uma pessoa bem humorada e extremamente culto . Era psiquiatra e psicanalista. Quando o conheci trabalhava em um hospital psiquiátrico.

- e o trabalho ?

- me aposentei pelo hospital e atualmente tenho apenas meu consultório. Trabalho só dois dias por semana.

- até o trabalho ficou mais leve, perguntei rindo.

- é verdade. lá era barra pesada, meu caro. Lembra do Teo ? 

- aquele teu amigo , também psiquiatra.

- ele mesmo.

- o que houve com ele ?

- pois é, você falou em barra pesada e o Teo pirou. Já estava achando que ele andava meio estranho quando se converteu àquela religião. Não pela religião propriamente, mas o movimento dele em direção a religião já anunciava alguma coisa. Em uma certa ocasião lá no hospital, uma paciente adulto e inofensivo, resolveu fazer uma barquinho de papel e ficou brincando com o barco no pequeno lago da entrada. Quando Teo se aproximou, o paciente falou que aquele era o titanic. Teo , para surpresa de algumas pessoas , disse para o paciente que aquilo não era o titanic, pois o titanic tinha chaminés. O paciente falou que era o titanic sim. Teo iniciou uma discussão dizendo que não pois insistia nas chaminés. De repente, Teo pegou o barquinho, rasgou, amassou e pisoteou o que sobrou do papel. O paciente entrou em crise nervosa e partiu pra cima do Teo. Os seguranças conseguiram agir e evitar uma briga. Depois dessa , Teo foi chamado pela direção e sugeriram que ele se aposentasse, pois já tinha tempo suficiente de serviço. E foi o que aconteceu. Mas não parou por aí. Depois de aposentado se tornou pastor na igreja dele. Em um dos cultos, em um procedimento de exorcismo para retirar um diabo de uma pessoa, ele agiu com violência e feriu feio a cabeça de uma mulher. Outra confusão. Os familiares da vítima , supostamente tomada pelo demônio, não gostaram do que viram e o caso acabou numa delegacia de polícia. O delegado, um sujeito experiente e vivido, pois por ali passam delinquentes, descompensados , psicopatas, se assustou com a versão contada pelo Teo. Teo disse que agiu com um pouco de força porque viu nos olhos da mulher a presença do diabo, inclusive com fumaça saindo dos olhos e cheiro de enxôfre . O caso não deu em nada, mas o delegado ficou mais assustado quando soube que ele era psiquiatra.

- é, muito estranho. Que tal se sentássemos ali, vou comer algo, sugeri.

- vamos lá.

- tem algum problema se for ali perto da chaminé das carnes ?

- isso é com o Téo, falou rindo. E tem mais. Outro dia fui visitar os colegas lá no hospital e eles me disseram que o problema do Teo é excesso de sana.

- como é que é ?

- Sana significa sanidade, saudável, saúde. 

- Excesso ???

- foi uma brincadeira. Eles criaram uma doença pro Teo por conta das chaminés, fumaça e brinquedos. Sana, seriam as iniciais de síndrome da ausência natalina adquirida, algo como reflexo de um trauma de infância no período natalino.

- não teve papai noel com brinquedo descendo pela chaminé , perguntei

- é por aí. É meu caro, as pessoas tem uma ideia equivocada sobre os médicos. Isso que aconteceu com Teo é muito comum entre médicos. Tem hora que não seguram a barra. Quando alguém procura um médico , normalmente é por conta de alguma doença, e doença sempre fragiliza a pessoa. Diante do médico, o paciente frágil deposita suas esperanças. Para ele, aquela figura de branco tem o poder sobre a vida e a morte. Com isso confere ao médico uma aura de poder e força, mas na realidade não é bem assim. Nós também temos os mesmos problemas, mesmo treinados para entender as angústias do outro. Chega um dia que a barra pesa. Um amigo meu, que você não conhece, trabalhou trinta anos como médico legista no IML. Passou a vida serrando crânio, metendo concha dentro do corpo para retirar sangue, enfiando as mãos para retirar órgãos, analisando matéria sem vida. Encontrei com o filho dele e perguntei sobre o pai. O filho disse que o pai tinha se aposentado e vivia em uma casa de campo. Disse que o estava achando meio estranho, pois o pai passava a maior parte do dia plantando, cuidando e conversando com flores.

- dá pra entender, comentei.

- pois é, mudou radicalmente quatro das cinco referências sensoriais. O que tocava, o que via, o que ouvia e o que cheirava.

- trocou a morte pela vida. Não tá nada doido, disse.

- será ??? O que ele acumulou durante os anos de trabalho ? Talvez esse novo comportamento possa ser passageiro, fruto de algo que ele não mais aguentava, sonhos, reações. De qualquer forma ele trocou o morto e o feio, pela vida e o belo.

- mas vamos mudar de assunto, me fala como você perdeu tanto peso ?

- pois é. Lembrei de você várias vezes nas reuniões na Brizolândia. Na época achava que você era um pouco radical com suas obsessões de nutrição e saúde, mesmo porque éramos bem jovens. Não entendia suas preocupações como equivocadas, apenas um tanto obsessivas. Então. Um dia , já estava com quase 170 Kg, respirando mal, sem agilidade resolvi mudar. Fiz uma cirurgia de redução de estômago, mudei radicalmente meu hábitos alimentares.

- mas não abandonou a carninha, não é ?

- claro que não. mas só como carne vermelha , no máximo uma vez por semana. e , também, fui reeducado para comer pouco e com qualidade. O resultado é esse. Perdi quase 80 kg, hoje tenho um índice de massa corporal dentro dos limites saudáveis, e , melhor, tenho saúde, alegria. Aquele tempo, nunca mais. Era dificuldade para tudo, ônibus, avião, roletas. O mundo não é feito para gordos.

- mas o mundo incentiva e cria condições para que as pessoas fiquem gordas e obesas, não é ? Como é que fica ?

- você continua cortante como um bisturi, hein ?
- é verdade. Se você prestar atenção nos comerciais de alimentos e bebidas que saturam as telas de tv, verá que só se incentiva porcaria. Refrigerantes, biscoitos vagabundos, carnes gordurosas, embutidos, doces, bebidas alcoólicas, fast food. São alimentos de baixo valor nutricional e altamente calóricos. E o que acontece ? Surgem, então, os programas de tv para educar as pessoas em hábitos saudáveis. É comum , nas manhãs, programas com médicos, e são muitos inclusive com desenvoltura de apresentadores de programas de auditório, ensinado como viver melhor. Quando chamam o intervalo comercial, a propaganda de alimentos sugere o oposto. O mesmo em novelas. Essa novela para adolescentes da tv globo, quando coloca cenas de alimentação , põe os jovens comendo sanduíches com refrigerantes em praças de alimentação de shoppings centers.

- essa novela é uma putaria e pegação entre crianças, comentei.

- também tem isso. Então. Aparece o médico e depois o monstro. Os médicos de tv, nesses programas aproveitam para apresentar medicamentos que possam combater males da obesidade.

-- Hummmm. Propagandistas midiáticos. Nova modalidade de propagandistas de laboratórios farmacêuticos ?

- Isso aí. A força desses segmentos , alimentícios e bebidas, impõe as mídias os estilos de vida desejados por eles e, esses estilos nada tem de saudáveis.

- os médicos do programa fazem um teatrinho de saúde, não é ?

- é isso aí. O lucro dessas empresas tem que crescer cada vez mais, é a lógica do modelo capitalista. Por outro lado, os lucros com a doença também tem que crescer cada vez mais. Se uma pessoa é intoxicada pela ingestão de metais pesados, comum nos dias de hoje por conta de contaminação dos mananciais hídricos, todo o foco na mídia é para o tipo de tratamento médico a ser seguido. Pouco, muito pouco se fala sobre o que motiva a contaminação.

- o capitalismo e suas práticas não podem ser questionadas, comentei.

- exato. banaliza-se a poluição ambiental e a contaminação de solos e recursos hídricos. colocando o foco no tratamento. Nas propagandas de ofertas de supermercados, comuns nas tvś, raramente aparecem ofertas de frutas , legumes , verduras ou alimentos saudáveis.

- só produto industrializado, comentei.

- exato. A quem interessa esse estilo de vida ?

- a mim nunca interessou.

- mas a maioria das pessoas não percebe e acredita que isso é o certo, saudável, porque as mídias fazem parte do esquema do lucro e saturam todas as pessoas com suas falsas verdades.

- e se você questiona, é rotulado como maluco.

- é uma outra questão. Nada pode ser questionado. Com a ascensão e hegemonia do neoliberalismo, a partir da década de 1990, começou-se a criação de padrões. Padrão de consumo, padrão na economia, padrão de entretenimento, padrão de comportamento, padrão de relações interpessoais. Qualquer ideia fora dos padrões deve ser combatida e eliminada, e a mídia está aí, também para fazer esse papel. Por que Cuba é perseguida? Por que é uma outra experiência, diferente dos padrões homogeneizados, não pode florescer, não pode ser um exemplo bem sucedido. Nada pode ser diferente do capitalismo neoliberal. Essa conversa de bloqueio por conta de violação de direitos humanos é balela. Os direitos humanos estão sendo corroídos, em larga escala no mundo capitalista e ninguém, no caso a grande imprensa e mídias, fala em defendê-los. A obesidade é uma grave epidemia mundial. Está associada aos valores do capitalismo, do sucesso pessoal ( se tenho dinheiro como sem parar o que quiser ) do hedonismo.

- a gula é um dos sete pecados capitais, comentei

- pois é. No tocante a esse pecado a Igreja faz vista grossa para não contrariar os lucros das empresas. Mas acusa de crime e pecado, políticas a favor do aborto.

- é a tal história de se ajustar aos padrões, comentei.

- é verdade. O neoliberalismo criou um estreitamento na produção intelectual, de ideias, no entretenimento, nas artes e óbvio na economia. Quando existiam os dois polos, capitalismo e socialismo, a amplitude era bem maior. Atualmente essa padronização, para blindar um modelo que já agoniza, tem criado sérios problemas nas relações interpessoais. O aumento da violência , da intolerância são decorrentes desse estreitamento produzido pela propaganda neoliberal. Nada pode ser diferente. Isso tem desdobramentos nas religiões e no conflito religioso, pois todas, de alguma forma, também querem a hegemonia. Ontem, mesmo presenciei uma discussão, em um bar entre duas pessoas. Um deles dizia pro outro que era importante que ele aceitasse Jesus em sua vida. O outro dizia que nunca tinha duvidado de Jesus. O primeiro insistia que ele estava equivocado e que no momento do julgamento ele teria que aceitar e seria punido. Por pouco não saíram no tapa por causa de um provável veredicto oriundo de notáveis em um tribunal na esfera celeste, pós morte. 

- iriam brigar por isso, perguntei.

- quer expressão maior da irracionalidade que nos rodeia. As pessoas não são estúpidas ou burras . Eles estão dominadas e eclipsadas por um grande sistema, com o apoio das grandes mídias, que tem por objetivo ditar regras e padrões em prol dos interesses das grandes corporações. Assim a intolerância vai aumento, o mesmo com a violência nas relações interpessoais, pois o espaço para opiniões e ideias é cada vez mais estreito. Minha esperança são as mídias sociais, que de alguma forma, conseguem quebrar essa barreira.

- nós conhecemos o enredo é já vimos esse filme antes. O estreitamento começa no campo das ideias, avança com xenofobia, depois com racismo, depois são os pobres, mais adiante os velhos e doentes, depois os negros, depois todos aqueles que não fazem parte da religião dominante, não é ?

- essa é exatamente a realidade que vivemos. Agora, você acredita que a maioria das pessoas percebe a realidade dessa maneira ? Estão sendo conduzidos. O entretenimento , o esporte são estratégias para condução, quando deveriam ser caminhos para cultura, conhecimento e formação de pessoas.

Nossa refeição acabara de chegar. Fizemos uma pausa para o almoço. Olhei , de relance pela janela do restaurante, e vi um transatlântico ancorado no pier da Praça Mauá. Ele tinha três chaminés.

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