terça-feira, 25 de outubro de 2016

Capitalismo, teu nome é barbárie

Capitalismo, teu nome é solidão

POR GEORGE MONBIOT– ON 24/10/2016CATEGORIAS: CAPA, COMPORTAMENTO, SOCIEDADE


Os seres humanos, mamíferos ultrassociais cujos cérebros precisam do estímulo do outro, estão sendo separados por mudanças tecnológicas e pela ideologia do individualismo. Este apartamento é causa de uma epidemia de doenças psíquicas

Por George Monbiot  ;Jornalista, escritor, acadêmico e ambientalista do Reino Unido. Escreve uma coluna semanal no jornal The Guardian.| Tradução: Inês Castilho | Imagem: Andrzej Krauze

O que poderia denunciar mais um sistema do que uma epidemia de doença mental? Pois ansiedade, estresse, depressão, fobia social, desordens alimentares, automutilação e solidão atingem cada vez mais pessoas em todo o mundo. A última ocorrência — divulgação de dadoscatastróficos sobre a saúde mental das crianças inglesas — reflete uma crise global.

Há muitas razões secundárias para esse sofrimento, mas a causa fundamental parece ser a mesma em todos os lugares: os seres humanos, mamíferos ultrassociais cujos cérebros estão conectados para responder uns aos outros, estão sendo separados. Mudanças econômicas e tecnológicas, assim como a ideologia, desempenham o papel principal nessa história. Embora nosso bem-estar esteja indissociavelmente ligado à vida dos outros, onde quer que estejamosdizem-nos que só prosperamos pelo auto-interesse competitivo e extremo individualismo.

No Reino Unido, homens que passaram a vida inteira em espaços públicos – na escola, na universidade, no bar, no parlamento – nos doutrinam para que permaneçamos sozinhos. O sistema educacional torna-se a cada ano mais brutalmente competitivo. O emprego é uma luta quase mortal com uma multidão de outras pessoas desesperadas caçando empregos cada vez mais raros. Os modernos feitores dos pobres atribuem à culpa individual a circunstância econômica. Intermináveis competições na televisão alimentam aspirações impossíveis, no exato momento em que as oportunidades reais estão cada vez mais reduzidas.

O consumismo preenche o vazio social. Mas, longe de curar a doença do isolamento, intensifica a comparação social a ponto de, depois de consumir todo o resto, começarmos a ser predadores de nós mesmos. As mídias sociais nos unem e nos separam, possibilitando que quantifiquemos nossa posição social e vejamos que outras pessoas têm mais amigos e seguidores do que nós.

Como Rhiannon Lucy Cosslett documentou brilhantemente, meninas e jovens mulheres alteram, como rotina, as fotos que postam para parecer mais bonitas e mais magras. Alguns celulares com dispositivos “de beleza” fazem isso sem que você peça; agora você, magra, pode tornar-se sua própria inspiração. Bem-vindo a uma distopia pós-Hobbesiana: uma guerra de todos contra todos

Haverá algum encantamento nesses mundos interiores solitários, nos quais tocar foi substituído por retocar, e mulheres jovens estão se afundando de agonia? Estudo recente realizado na Inglaterra sugere que uma em cada quatro mulheres entre 16 a 24 anos automutilaram-se e uma em cada oito sofrem de distúrbio de estresse pós-traumático. Ansiedade, depressão, fobia ou distúrbio compulsivo-obsessivo afetam 26% das mulheres nesse grupo etário. Parece ser uma crise de saúde pública.

Se a ruptura social não é tratada tão seriamente quanto um membro quebrado, é porque não podemos vê-la. Mas os neurocientistas podem. Uma série de artigos fascinantes sugere que a dor social e a dor física são processadas pelos mesmos circuitos neurais. Isso pode explicar arazão por que, em várias línguas, é difícil descrever o impacto da ruptura de vínculos sociais sem as palavras que usamos para designar injúria e dor física. Tanto em humanos quanto em outros mamíferos sociais, o contato social reduz a dor física. Essa é a razão por que abraçamos nossas crianças quando elas se machucam: o afeto é um analgésico poderoso. Opiáceos aliviam tanto a agonia física quanto a angústia da separação. Talvez isso explique a ligação entre oisolamento social e a drogadição.

Experimentos resumidos no jornal Psicologia & Comportamento do mês passado sugerem que, diante de uma escolha entre dor física ou isolamento, os mamíferos sociais escolherão a primeira. Macacos-prego mantidos sem alimento e contato por 22 horas irão juntar-se a seus companheiros antes de comer. Crianças que experimentam negligência emocional, segundo certas descobertas, sofrem piores consequências de saúde mental do que crianças que sofreram tanto negligência emocional quanto abuso físico: apesar de hedionda, a violência envolve atenção e contato. A automutilação é frequentemente usada como forma de tentar aliviar sofrimento: outra indicação de que a dor física não é tão ruim quanto a dor emocional. Como o sistema prisional sabe muito bem, uma das formais mais efetivas de tortura é o confinamento em solitária.

Não é difícil perceber quais podem ser as razões evolucionárias para a dor social. A sobrevivência entre os mamíferos sociais é significativamente ampliada quando eles estão ligados por fortes laços ao resto do grupo. Os animais isolados e marginalizados são os que mais provavelmente serão apanhados por predadores, ou morrerão de fome. Assim como a dor física nos protege de lesões físicas, a dor emocional nos protege de danos sociais. Ela nos leva a nos reconectar. Mas muita gente acha isso quase impossível.

Não é surpresa que o isolamento social esteja fortemente associado a depressão, suicídio, ansiedade, insônia, medo e percepção de ameaça. Mais surpreendente é descobrir o leque de doenças físicas que ele causa ou exacerba. Demência, pressão sanguínea alta, doenças cardíacas, AVCs, queda de resistência a vírus, até mesmo acidentes são mais comuns entre pessoas cronicamente solitárias. A solidão tem umimpacto na saúde física comparável a fumar 15 cigarros por dia: parece aumentar o risco de morte precoce em 26%. Isso se dá, em parte, porque eleva a produção do hormônio do estresse cortisol, que inibe o sistema imunológico.

Estudos realizados tanto em animais como em humanos sugerem uma razão para o bem-estar alimentar: o isolamento reduz o controle dos impulsos, levando à obesidade. Como aqueles que estão na base da pirâmide socioeconômica são os que têm maior probabilidade de sofrer de solidão, será esta uma das explicações para a forte ligação entre baixo status econômico e obesidade?

Qualquer pessoa pode perceber que algo crucial — muito mais importante do que a gande maioria dos problemas que nos atormentam — deu errado. Por que razão continuamos mergulhados neste frenesi de autodestruição, devastação ambiental e deslocamento social, se tudo o que isso produz é uma dor insuportável? Essa pergunta não deveria queimar os lábios de todos os que estão na vida pública?

Há instituições de caridade maravilhosas fazendo o que podem para lutar contra essa maré. Trabalharei com algumas delas como parte do meu projeto sobre solidão. Mas, para cada pessoa que elas alcançam, muitas outras são deixadas para trás.

Fonte: OUTRAS PALAVRAS
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Que fique bem claro:

Viver só enquanto uma opção responsável, é algo bem interessante e inspirador.

Por outro lado, a solidão enquanto fuga ante o real, já pode ser considerado com patologia.

Pior ainda, quando um sistema econômico-social através de seu conjunto de valores e práticas aprisiona as pessoas em uma solidão coletiva, o resultado é devastador para o conjunto da sociedade. É a realidade do capitalismo.

Pessoas ávidas por referências e minutos de fama fazem da sociedade um espetáculo, onde, ao mesmo tempo, se procura visibilidade e referências para fugir da angústia crônica, fruto de um vazio imenso que o consumo preenche apenas por curto período de tempo. O capitalismo é uma linha de produção em série de doentes e alienados, e, em assim sendo, setores lucram, e muito, com os doentes. O processo de auto destruição que caracteriza o capitalismo, principalmente no que tange ao meio ambiente, se manifesta em todos os níveis, chegando nas práticas, cada vez em maior número, de suicídios e mutilações das pessoas.

Nesse processo, que pode ser entendido como macabro, os grandes meios de comunicação assumem o papel dos músicos em uma orquestra de violinos, executando peças musicais enquanto as pessoas são encaminhadas bovinamente para fornos crematórios, como nos campos de concentração nazistas da segunda guerra mundial.

A dor social imposta às pessoas pelo capitalismo, foi retratada pelo PAPIRO, na poesia, abaixo, de junho de 2012. Vale ler mais uma vez :


segunda-feira, 18 de junho de 2012
Encontros Cariocas - 5 Crianças & Sábados

Hoje não tem escola.


Não tem aula nem bronca, não tem prova nem cola.

Hoje é dia de brincadeiras com os amigos do bairro, do condomínio.

Hoje é dia de diversão, andar de bicicleta, jogar futebol, virtual , de campo ou de salão.

Hoje é o dia que as crianças esperam, por dias, cinco dias, para fazer o que mais gostam, durante todo o dia

Hoje é sábado.

O sábado não é um dia qualquer, é o mais esperado, desejado, festejado.

É um dia de encontros, com outros, com os próprios desejos, com o ideal que se deseja.

As manhãs de sábado , aqui em Ipanema, ou em outros lugares como Saquarema, Itapema, Guararema, Diadema, são sempre manhãs de sábado.

Manhãs estendidas até a metade do dia, afinal sábado não é apenas mais um dia.

Inevitável não sair às ruas, enquanto as crianças brincam.

Momento de rever os "amigos do bairro ou do shopping", que nunca cumprimentamos ou trocamos uma mísera palavra, mas que conhecemos por décadas.

Referências mútuas, insumos para assuntos de vidas enfadonhas

Em sociedades em que o trabalho significa apenas uma forma de ganhar a vida, as manhãs de sábado são válvulas de escape.

A maioria aguarda, por dias, cinco dias, pelo dia sem obrigações, sem bronca do chefe, sem cartão de ponto.

Caminhando por Ipanema, mas poderia ser Diadema, Itapema, Saquarema vou revendo os "amigos".

Alguns posso avistar ainda à distância, anunciando um cruzamento pelo passeio.

Logo que sou identificado , a expressão do "amigo" muda.

Olha em direção ao chão, como se estivesse verificando algo nos pés, quando na realidade busca referências internas sobre mim para que possa rearrumar o rosto, e ter a expressão correta para o cruzamento inevitável.

Ao cruzar comigo, os rostos falam no cumprimento mudo, entre "amigos" de décadas que nunca se cumprimentaram mas que dizem tudo o que pesam um do outro, sem saber que a verdade foi dita pelo susto , expresso e impresso na face ao avistar o "amigo" ao longe.

Avisto um colega com quem trabalhei em uma empresa, há alguns anos.

Estrangeiro, viveu dez anos na cidade, em Ipanema e voltou para seu país.

Certamente estava de férias.

Seu caminhar, pelo calçadão da praia, demonstrava segurança, satisfação, revelando , para ele e outros atentos, conhecimento da cidade, dos hábitos, das esquisitices das pessoas.

Fazemos o mesmo quando visitamos cidades em que já conhecemos.

Sábado é um dia fantástico, para as crianças e adultos.

É no sábado, por exemplo, que se vai comprar aquilo que se viu em um "amigo" ou "amiga" no sábado anterior, e que foi motivo de longas conversas em família durante toda a semana, entre crianças, adultos, pais , filhos e até mesmo com os animais domésticos.

Na sociedade do consumo turbinado e insustentável, sábado é o dia do consumo.

Consumo de bens, a maioria dispensável, consumo de referências, necessidade de pertencimento, do bairro , da cidade, de ser igual entre os "amigos" solitários na solidão ávida por referências, que se conhecem há décadas.

As crianças, entre amigos, brincam com seus brinquedos.

Os adultos , homens na maioria, levam seus brinquedos para lavagem em um posto de combustível.

Sim, o sábado é o dia nacional da lavagem de carros.

Muitos ficam horas nos postos de combustível aguardando pacientemente o momento em que seus carros serão tocados por mãos estranhas, ameaçadoras, descuidadas, perigosas e, que por isso , devem ser observados atentamente até o momento final, quando o veículo, com um brilho diamantino, é devolvido para o êxtase de seus proprietários.

No meu caminhar, na manhã de sábado em Ipanema, que poderia ser em Saquarema, Diadema, Itapema, avisto um grupo , umas quatro pessoas, todos homens, parados na calçada em descontraída conversa.

Reconheço um dos participantes, com quem mantive contatos em situações profissionais.

Ao me reconhecer, sua expressão de sorriso vai diminuindo, já que fora flagrado em descontração, sua boca se contrai, necessário uma nova face para o encontro repentino, mesmo que mudo, apenas um cumprimento com movimentos de rostos.

Sábado é o dia do consumo.

Consumo que na sociedade de consumo se transformou em um valor em si.

Consumo que é estimulado para adultos e crianças.

Crianças que pedem aos pais e ganham seus brinquedos e, a medida que crescem, descartam alguns, e partem para outros, até que um dia levam os brinquedos para lavagem em postos de combustível.

Adultos que tem no consumo uma válvula para amenizar angústias, sofrimentos, vazios existenciais, que logo voltarão para mais consumo, pequenos momentos de felicidade com a novidade.

Na sociedade de consumo de crescimento ilimitado, de bens descartáveis que cada vez duram menos, onde o valor da cultura e do conhecimento não é um valor, o vazio existencial impera.

No momento em que a conferência da ONU discute a sustentabilidade, o modelo de consumo é insustentável para o planeta, e o consumo como valor não sustenta as pessoas, não garante felicidade.

A sustentabilidade, assim compreendida, é muito mais que a preservação dos recursos naturais do planeta.

O sábado, também, é o dia da insustentabilidade.

As crianças brincando, inevitavelmente, nos levam ao pensamento de Nietzsche;

" Maturidade é quando atingimos a seriedade, o comprometimento, a dedicação, a transparência, a sinceridade das crianças quando brincam"

Hoje é sábado , aqui em Ipanema, em outra cidade grande ou pequena, ou em outra localidade agitada ou serena, que pensa em momento de reflexão sobre sustentabilidade que a vida apenas pelo consumo não vale a pena.


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Críticas sobre o capitalismo e ao seu estilo de vida associado, são muitas e vem de longe.

As sequelas que o capitalismo imprime nas pessoas são diretamente
proporcionais aos lucros das indústrias farmacêutica e médica.

Quanto maior o número de pessoas descompensadas e doentes, maiores os lucros da indústria. 

Fabricar doenças também é uma tarefa do capitalismo, assim como difundir nas sociedades o medo sobre doenças. 
As doenças estão presentes , diariamente, nos noticiários das emissoras de rádio e de televisão, não como forma de educar as pessoas , mas como uma maneira de espalhar o pânico e a insegurança, sobre um assunto que versa sobre vida e morte, algo em que a civilização ocidental tem enorme dificuldade de compreender. 
Nascimento e morte são momentos na vida das pessoas quase que idênticos. São momentos de sofrimento, muito frio e desespero. Se você já nasceu, não tem porque temer a morte, principalmente a morte anunciada diariamente em notícias da mídia sobre doenças e também em comerciais de remédios, que se não usados corretamente e mesmo usados corretamente, matam gente de montão todos os dias.

O melhor é viver, isso segundo os mortais e também segundo os rapazes da banda de rock Rolling Stone. E viver não é consumir como um idiota, como deseja o mórbido sistema capitalista impondo o consumo de tudo a todo tempo.

Assim sendo, o capitalismo é incompatível com a vida, com todas as formas de vida, e vê as pessoas, apenas, como peças de uma engrenagem que movimentam as máquinas sempre para crescer, crescer e reproduzir, de forma ilimitada, tal qual uma metástase planetária.

Ainda sobre textos que de alguma forma fazem uma crítica ao estilo de morte do capitalismo, vale a leitura, abaixo, da letra Alucinação, de Belchior, do ano de 1976:



Alucinação - Belchior
Eu não estou interessado

Em nenhuma teoria

Em nenhuma fantasia

Nem no algo mais

Nem em tinta pro meu rosto

Ou oba oba, ou melodia

Para acompanhar bocejos

Sonhos matinais

Eu não estou interessado

Em nenhuma teoria

Nem nessas coisas do oriente

Romances astrais

A minha alucinação

É suportar o dia-a-dia

E meu delírio

É a experiência

Com coisas reais

Um preto, um pobre

Uma estudante

Uma mulher sozinha

Blue jeans e motocicletas

Pessoas cinzas normais

Garotas dentro da noite

Revólver: cheira cachorro

Os humilhados do parque

Com os seus jornais

Carneiros, mesa, trabalho

Meu corpo que cai do oitavo andar

E a solidão das pessoas

Dessas capitais

A violência da noite

O movimento do tráfego

Um rapaz delicado e alegre

Que canta e requebra

É demais!

Cravos, espinhas no rosto

Rock, Hot Dog

"Play it cool, Baby"

Doze Jovens Coloridos

Dois Policiais

Cumprindo o seu duro dever

E defendendo o seu amor

E nossa vida

Cumprindo o seu duro dever

E defendendo o seu amor

E nossa vida

Mas eu não estou interessado

Em nenhuma teoria

Em nenhuma fantasia

Nem no algo mais

Longe o profeta do terror

Que a laranja mecânica anuncia

Amar e mudar as coisas

Me interessa mais

Amar e mudar as coisas

Amar e mudar as coisas

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