terça-feira, 23 de agosto de 2016

A nova novela e a selfie de um gordo tonto

O que está em jogo é a própria ideia de país
22 de agosto de 2016 às 16h03


Truculência

por Eleonora de Lucena, na Folha de S. Paulo, em 22/08/2016

O Brasil entrou no centro da disputa geopolítica mundial. Tem riquezas naturais, mercado interno, posição estratégica. Construiu economia diversificada e complexa, terreno para grandes empresas nacionais e ambiente potencial para desenvolvimento de tecnologias de ponta.

Os Estados Unidos, acostumados a nadar de braçada no continente, começaram a ver o avanço chinês no que consideram seu quintal. Investimentos, comércio, parcerias com os orientais cresceram de forma exponencial.

Não parece ser coincidência a intenção norte-americana de voltar a ter bases militares na América do Sul (na sempre sensível tríplice fronteira e na Patagônia, que vigia o estreito de Magalhães, curva entre dois mundos). Nem parece ser ao acaso a escolha dos alvos do momento: a Petrobras, as grandes empresas e até o programa nuclear.

Nos últimos anos, o país mostrou zelar por sua autonomia e buscou alianças fora da influência dos EUA. Com China, Rússia, Índia e África do Sul, o Brasil ergueu os Brics e um banco de desenvolvimento inovador.

Aqui, reforçou o Mercosul -alvo imediato de ataque feroz do interino, afoito em mostrar serviço para o Norte e ressuscitar relações subalternas.

Esse contexto maior escapa da verborragia conservadora, ansiosa em reduzir a crise atual a um confronto raso entre supostos corruptos e hipotéticos éticos.

Bastaram poucas semanas para deixar evidente a trama hipócrita e podre do bando que tenta abocanhar o poder.

O que está em jogo é muito mais do que uma simples troca de governo. É a própria ideia de país.

Falar de luta de classes e de projeto nacional deixou alguns leitores ouriçados. Mas, apesar da operação de marketing em curso, os objetivos do atropelo à Constituição são claros: concentrar riqueza, liberar mercados, desnacionalizar a economia, desmantelar o Estado.

O discurso dos sem-voto que se aboletaram no Planalto tenta editar um macarthismo tosco, elegendo um inimigo interno. Agridem os de vermelho (sempre eles!), citados como os culpados de todo o mal, numa manobra conhecida dos movimentos fascistas desde o início do século 20.

Quem se atreve a discordar do rolo compressor elitista é logo tachado de “maluco” pelos replicantes da direita raivosa. Dizem que os que apontam as contradições atuais são saudosos do século 19.

Viúvos do século 19 são os que querem agora surrupiar direitos e restabelecer condições de exploração do trabalho daqueles tempos. Com a retórica de uma suposta modernidade, atacam conquistas sociais e pregam o desmonte da corajosa Constituição de 1988.

Alegam que a matemática não permite que o Estado cumpra suas funções perante os cidadãos. Para eles, a matemática deve servir apenas aos mais ricos e a seus juros maravilhosos. Num giro chinfrim, mandam às favas o tal controle do deficit público: gastam tudo para atender corporações, amigos e ganhar votos.

Com uma cortina de fumaça, arriscam confundir esquerda com autoritarismo. Projetam, assim, no adversário, os seus desejos ocultos. Afinal, o programa dos não eleitos só poderá ser implantado integralmente num regime de força, que censure e elimine a voz dos mais fracos.

As exibições de truculência absurda nos estádios da Olimpíada, proibindo manifestações de “Fora, Temer!” e rasgando os direitos constitucionais de livre manifestação e opinião, parecem ser uma terrível amostra de tempos sombrios pela frente.

O Senado vai enfrentar o julgamento da história

Fonte: VIOMUNDO
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Um procurador messiânico e um apresentador de boa fé

Jô, se pessoas, com seu alto nível cultural, não sabem distinguir o que é avanço e o que é regresso de civilização, estamos em maus lençóis.

J. Carlos de Assis


Carta a Jô Soares:

Vi a gravação de sua entrevista com o procurador-chefe da força tarefa da Lava Jato, Dalton Dallagnol. Decidi procurá-la na rede depois que, em entrevista posterior, você apresentou uma carta do advogado de Lula protestando contra o uso de provas ilegítimas em processo penal. Você desqualificou o advogado subscrevendo integralmente os conceitos do procurador, dados na véspera, segundo os quais provas obtidas ilicitamente poderiam ser aceitas no processo desde que produzidas de “boa fé”.

Argumento idêntico já havia sido adotado pelo juiz da Lava Jato, Sérgio Moro, numa de suas palestras sensacionais. Neste caso, tratava-se de legítima defesa da audácia dado que o magistrado pretendia obviamente legitimar o uso judicial da gravação de Lula com a Presidenta Dilma, que ele liberou para a imprensa ilegalmente, agora incluída no processo de suposta obstrução da justiça. Temos agora três instâncias da legitimação da prova ilícita: o juiz, o procurador e a imprensa, esta representada por você, Jô Soares, em seu candente editorial. Poder-se-ia dizer que isso retrata uma conspiração para a obstrução não da justiça, mas da lei.

Não somos juristas. Sou jornalista, economista, doutor em Engenharia de Produção, hoje quase totalmente dedicado à economia política. Você é um dos homens sabidamente mais cultos do país. Entretanto, somos iguais num ponto: pertencemos a um mesmo ambiente histórico cujas raízes estão cravadas no início da era moderna da qual a característica mais marcante, no processo de construção de cidadanias, foi a consagração absoluta dos princípios jurídicos do habeas corpus, da presunção de inocência e do devido processo legal. Era a forma do cidadão escapar do sufocamento do Rei ou do Estado.

Não é difícil identificar no devido processo legal o imperativo inescapável da legalidade da prova. Isso não é Direito. Isso é civilização. O contrário seria deixar ao arbítrio do juiz, e na dependência de sua “boa fé”, aquilo que é a base factual dos julgamentos, ou seja, a prova material inequívoca. O juiz Moro e o procurador Dalton, e agora você, Jô, se tiverem realmente boa fé, devem à sociedade brasileira um esclarecimento franco sobre o que entendem por boa fé, e quem a determina num processo penal.

Sua explicação para acolher o argumento do promotor foi a imensa audiência que seu programa alcançou na data do programa. Trata-se de uma tautologia. Sua audiência lhe devolveu o que você deu a ela. Foram seus conceitos, e os conceitos expostos pelo procurador sem qualquer questionamento de sua parte, que refletiram na plateia e na tevê e lhe voltaram na forma de uma ovação geral. Pusesse você alguém de menos boa fé, que a sua, para entrevistar o procurador, alguém que não fosse dessa grande mídia sórdida, e ele seria massacrado.

Vou lhe dar apenas um exemplo da simplicidade idiota desse procurador de ares messiânicos. Ele disse ter estudado pós-graduação em Harvard e ali aprendeu métodos eficientes de combater a corrupção. Bom, terá ele aprendido em Harvard alguma coisa dos processos movidos, depois da crise de 2008, contra os fraudulentos Bank of America e o Citigroup, os maiores bancos norte-americanos? Acaso foi preso algum dos dirigentes desses maiores bancos americanos pelos golpes dados no mercado de subprime?

Bom, para que esse procurador, ou você mesmo não digam de novo que o escândalo da Petrobrás é o maior do mundo, vou lhe dar alguns dados que a grande imprensa omite: os dois bancos citados, para livrar seus executivos da cadeia, pagaram, cada um, cerca de R$ 70 bilhões, ou um total de R$ 140 bilhões em multas. Não é só isso. Ninguém pagou pela fraude da Libor, administrada pelos 14 maiores bancos do mundo, a despeito de bilhões e bilhões de dólares em prejuízos. Ninguém pagou pelas fraudes do Deutsche Bank e o UBS nos mercados mundiais de câmbio, também representando quantias bilionárias.

Se você me perguntasse se gostaria de ver esses bancos quebrarem da noite para o dia por causa da corrupção eu diria que você está louco. O grau de sofrimento no mundo seria intolerável. Aqui, entretanto, esses promotores messiânicos, movidos sobretudo por vaidade e nenhum escrúpulo social, não tomaram qualquer providência para salvar a parte sadia das empresas de engenharia, com centenas de milhares de empregos, envolvidas no escândalo. Ao contrário, embaraçaram como puderam os acordos de leniência. Que fizessem o que os americanos fazem: punam os executivos e salvem as empresas. De fato, eles salvam as empresas e sequer punem os executivos, que se safam com multas.

Seu procurador, Jô, não passa de um vaidoso. Ele se vê em vestes messiânicas para salvar o Brasil da corrupção. Sua entrevista é do tipo que agrada, pois ele se coloca na situação de um puro, um justo, um incorruptível e, sobretudo, como alguém que está sempre e absolutamente certo, combatendo os absolutamente maus com perfeita maestria. Você se revelou surpreendido com a audiência. Você se surpreenderia também, se estivesse lá, com Hitlter e Mussolni, ambos anunciando a grande solução para a Alemanha e Itália. Não passavam, como seu procurador messiânico, de demagogos ingênuos, talvez demagogos de boa fé.

Talvez as partes mais extraordinárias da entrevista, você se deve lembrar, foram aquelas em que o procurador se descreveu como alguém que não tem poder econômico ou poder político, e justamente por isso a forma que encontrou para avançar nas investigações foi uma aliança com a imprensa. Você percebeu o que isso significa? Fora nas ditaduras, onde no mundo o processo judicial se inicia com uma aliança entre a promotoria e a imprensa? É justamente isso que nos leva à investigação-espetáculo, em muitos casos configurando a mais abjeta violação de direitos humanos. É esta aliança a matriz da exibição pública de simples suspeitos, destruindo injustamente reputações, assim como a escolha “científica e democrática” entre as grandes mídias dos documentos e depoimentos que serão vazados, a isso se chamando liberdade de imprensa.

Jô, se pessoas, com seu alto nível cultural, não sabem distinguir o que é avanço e o que é regresso de civilização, estamos em maus lençóis. Vivemos uma situação mundial de crise aguda, com guerras em andamento, fricções entre grandes potências, dramas de refugiados. No nosso caso, vivemos um quadro legislativo podre, uma presidência ilegítima e virtual ditadura judicial que ignora o sistema econômico combalido – 8% de contração em dois anos, 13% de taxa média de desemprego -, e até mesmo o avanço sobre o pré-sal pondo em risco a nossa própria soberania. Sabe-se como começam as revoluções. Nunca como terminam. Para que ninguém se sinta impune ao abusar de autoridade, lembrem-se da experiência turca recente: em face de um golpe judicial instigado pelos americanos, promoveu-se um contragolpe que acabou com mais de 2 mil juízes e promotores na cadeia, sob risco de pena de morte por alta traição.

*Jornalista, economista, professor, doutor em Engenharia de Produção, autor de mais de 20 livros sobre economia política brasileira.

Fonte: CARTA MAIOR
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Fonte: Blog da Luciana Oliveira
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Os jornais são aparelhos ideológicos cuja função é transformar uma verdade de classe num senso comum, assimilado pelas demais classes como verdade coletiva. Isto é, exerce o papel cultural de propagador de ideologia. Ela embute uma ética, mas a ética não é inocente: ela é uma ética de classe.” - Antonio Gramsci


De fato, o que está em jogo é um projeto-ideia de país.
O mesmo projeto-ideia que tem sido derrotado nas urnas, desde 2002, em eleições livres e democráticas.

Pelo voto livre, esse projeto anacrônico não passou, não passa, não passará. Cabe lembrar que até mesmo o FMI o considera anacrônico.

Como não passa pelos caminhos democráticos, a turma jurássica do golpe tenta empurrar pelos caminhos autoritários, truculentos, fascistas.

E para empurrar se faz necessário a construção de uma narrativa que convença a maioria da população, principalmente grande parte da classe média, tradicionalmente inculta, desinformada e preconceituosa.

A essência da narrativa construída, e ainda disseminada pelos meios de comunicação, tem na corrupção governamental e no desprezo pela política e políticos, os elementos de formatação das consciências. Agregado a esses elementos, também são disseminados conceitos de classe, de forma a incutir na parcela desejada da população a ideia de que representantes do povo no Poder denigrem a imagem do país e rebaixam o status de grande parcela da classe média ao redistribuir a renda e diminuir a pobreza e a miséria.


Despertar demônios, através da difusão de preconceitos, tem sido o trabalho da grande mídia nos tempos atuais, não apenas no Brasil como em todo o ocidente. Isso se explica, em parte, pelo fato do projeto-ideia em questão atingir um nível alto de rejeição em todo o mundo. Mais do que um posicionamento à extrema direita, esse projeto-ideia é uma aberração civilizatória que, comprovadamente, vem causando estragos e retrocessos em todo o mundo.

O Brasil atual, o país do golpe, com o apoio inestimável de uma parcela da classe média alienado-midiática, mergulha em turvas águas do século XIX, registrando narcisicamente, diariamente e obsessivamente, o próprio retrocesso.

A evolução da humanidade necessita, com urgência, acompanhar a evolução tecnológica, pois do contrário, teremos, como já presenciamos, uma legião de macacos brincando com aparelhinhos luminosos e coloridos.

É bom que se diga que a grande imprensa ocidental, deixou, já por mais de uma década passada, de cumprir o papel de informar para assumir o papel de guardião do projeto-ideia, enquanto a grande mídia promove a alienação da sociedade através de um entretenimento rasteiro e visual que visa interditar qualquer tipo de pensamento crítico e analítico.

E assim, multidões caminham pela ruas defendendo mudanças, impeachment, que quando consolidados, irão destroçar as vidas dessas mesmas pessoas que tanto defendiam as mudanças.

No entanto, nem tudo está perdido, já  que está chegando uma nova novela na TV Globo e em breve mais uma edição do big brother brasil, agora sem o bobalhão do Pedro Bial.

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