quarta-feira, 18 de maio de 2016

Velha mídia mais suja que rua em final de feira livre

Cade abre processo para investigar monopólio da Globo no futebol

Divulgação Globo/Alex Carvalho

Galvão Bueno, o narrador oficial do futebol na Globo

Pela primeira vez desde que foi fundado (no início dos anos 60) o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) decidiu analisar a legalidade do monopólio das transmissões do futebol pela Rede Globo de Televisão.

O processo em andamento é o de número 0800.000721/2016-18.

A Globo tem hoje a exclusividade de transmissão dos principais campeonatos regionais e nacionais de futebol e há suspeitas de irregularidades e infrações à chamada livre concorrência.

O Cade foi instado a abrir o processo a pedido de outras emissoras de TV, que consideram o monopólio da Globo inaceitável. Desde março o conselho já acompanhava as negociações entre a Globo e os principais clubes brasileiros.

Tal "pacote" daria direito à exclusividade não só na TV aberta, mas também na TV paga e na internet.

Além disso, o Cade vai analisar a legalidade de a Globo exigir que as partidas de futebol no meio de semana ocorram apenas depois da novela, o que faz com que as partidas terminem perto da meia-noite.

Tal "cláusula" estaria ferindo os direitos do torcedor, obrigado a usar transporte público em horário ingrato.

Além do processo aberto pelo Cade, a Globo está sofrendo concorrência de empresa estrangeira na negociação dos direitos do futebol: o canal pago EI (Esporte Interativo).

Em 2012, por exemplo, a Globo acionou seu famoso "rolo compressor" durante a chegada do canal Fox Sports ao Brasil. O FS detinha a exclusividade de transmissão da Libertadores, e o torneio começou sem transmissão na TV aberta, porque o FS decidiu optar por sua exclusividade.

"Coincidentemente", após essa afirmação as principais operadoras, Net e Sky, retaliaram o canal ameaçando não incluí-lo em seus menus.

Somente depois de a Fox Sports aceitar "parceria" com o SporTV (Globosat) é que o FS passou a ser incluído em pacotes menores das operadoras. Essa negociação também deve ser alvo de investigação pelo Cade.

Desde o ano passado, a Globo tenta fechar um acordo com os principais clubes que, estima-se, ultrapassaria R$ 1 bilhão. A emissora pretende fechar um pacote de exclusividade até pelo menos 2020 (já fechou com o Corinthians).

Segundo esta coluna apurou, a emissora estudava deixar os campeonatos regionais apenas na TV paga, e mesmo os torneios nacionais só teriam uma partida exibida na TV aberta semanalmente.

Cinco anos atrás, a TV Record também tentou comprar os direitos de exclusividade do futebol, negociando diretamente com o finado Clube dos 13, mas por iniciativa do Cortinthians, que rapidamente fechou acordo com a Globo, a entidade acabou sendo implodida.

OUTRO LADO

A reportagem está aguardando o posicionamento da TV Globo a respeito da análise do Cade. A versão da emissora será incluída neste texto assim que chegar.



Ricardo Feltrin

Fonte: UOL
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Mario Vitor e o apocalipse do PiG

"Quando informações em "off" dão as cartas e o outro lado é uma formalidade, o jornalismo não existe senão como contrafação"
publicado 18/05/2016



O Conversa Afiada reproduz da Fel-lha excelente análise de Mario Vitor Santos:

Apocalipse do jornalismo

A ruptura institucional em via de ser completada no Brasil é resultado direto da degradação do jornalismo posto em prática por quase todos os meios de comunicação no país. Os cuidados éticos foram sacrificados a tal ponto que o jornalismo promove a derrubada de uma presidente até agora considerada honesta.

Jornalismo deve informar os fatos de pontos de vista diferentes e contrários, encarnar ideias em disputa, canalizar o entrechoque de versões, sublimar antagonismos.

Veículos brasileiros, ao contrário, quase todos em dificuldades financeiras e assediados pelos novos hábitos do público, uniram esforços na defesa de uma ideia única. Compactaram-se em exageros, catastrofismo e idiossincrasias. Agruparam-se de um lado só da balança, fortes para nocautear um governo, mas fracos para manter sua própria razão de existir, a autonomia.

Poderia ser diferente. As denúncias de corrupção da Operação Lava Jato deveriam mesmo merecer toda a atenção de uma imprensa aguerrida. Deveriam mobilizar controles e cuidados na mesma proporção. No entanto, se a justiça da Lava Jato tem alvo preferencial, o jornalismo não deveria ter. Quem defende o equilíbrio quando justiça seletiva e jornalismo discricionário se fundem?

Normas e técnicas jornalísticas não são meros enfeites para códigos ou lições esquecidas nos bancos da escola. São peças essenciais para a sobrevivência da democracia. Na Lava Jato, o que deveria motivar uma custosa operação de checagem independente e edição autônoma derivou numa repetição inglória dos piores momentos do jornalismo do passado. A audição generosa e justa do chamado outro lado das denúncias, tanto na apuração das informações como em sua edição, não existiu.

O abuso de reportagens baseadas exclusivamente em fontes mantidas em sigilo tornou-se a regra. Vazamentos com objetivo manipulatório foram a tônica. Quando informações em "off" dão as cartas e o outro lado é uma formalidade, o jornalismo não existe senão como contrafação.

O que foi feito do esforço de convivência de tantos profissionais de ponta com outras culturas jornalísticas mais avançadas, tolerantes e variadas? Onde estão as intenções de controle técnico, equidistância, sobriedade e isenção?

Os ombudsmans, os rigores autonomistas das técnicas de investigação independentes e as autocríticas não serviram para nada. Virou pó o empenho de ao menos uma geração de profissionais para que o jornalismo, depois do infame apoio majoritário ao golpe de 1964, viesse a seguir melhores padrões.

Não pode haver fracasso maior para quem ao longo dos anos aspirou a se legitimar como instituição pilar de uma jovem democracia. Veículos de mídia cederam ao populismo que inflama os ódios de classe e leva o país a vivenciar mais um golpe contra as instituições.

Fica para conferir se a mídia terá no governo Temer a mesma obsessão higienizadora e incriminatória que exibe contra a ordem petista.

Já se diz que a queda do governo Dilma marca o ocaso do arranjo democrático da Constituição de 1988. Corporifica também o fim do breve ensaio de jornalismo surgido no bojo do movimento que levou à Nova República.

Parodiando o poema trágico de Murilo Mendes, essa mídia nativa, em busca da sobrevivência, nasceu para a catástrofe.

MARIO VITOR SANTOS é jornalista. Na Folha, foi diretor da sucursal de Brasília, secretário de Redação e ombudsman (1991-93 e 97). É mestre em drama antigo pela Universidade de Exeter (Inglaterra) e doutor em letras clássicas pela USP

Fonte: CONVERSA AFIADA
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