sábado, 23 de abril de 2016

O Vexame do Golpe

Impeachment: farsa jurídica e degradação das instituções
Dalmo de Abreu Dallari

O tema do impeachment tem sido objeto de amplo e intenso noticiário na grande imprensa e depois da vergonhosa sessão da Câmara de Deputados, na qual, com desempenho ridículo e desmoralizante, a maioria decidiu a favor do impeachment, muitos pensam que o processo já teve início e que dentro de poucos dias estará terminado. O que tem faltado, no entanto, é uma informação sobre ponto da máxima importância que tem sido omitido pela imprensa, por ignorância ou má fé: a decisão da Câmara de Deputados apenas autoriza o Senado a iniciar o processo de impeachment, se os Senadores estiverem convencidos de que existe fundamento para isso. Isso é o que dispõe expressamente o artigo 51: “Compete privativamente à Câmara de Deputados: I. autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República...” E no artigo 52: “Compete privativamente ao Senado Federal: processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República...”. Assim, pois, a Câmara de Deputados apenas autoriza, não determina, não obriga, a instauração do processo, o que pode, inclusive, não ocorrer, se assim decidirem os Senadores.

A transmissão ao vivo da votação do pedido de impeachment da Presidente Dilma na Câmara de Deputados, ocorrida no dia 17 deste mês, foi um espetáculo deprimente e revoltante, que deveria despertar a consciência do povo brasileiro para que um bando de delinqüentes e oportunistas não tome decisões arbitrárias e antidemocráticas dizendo falar em nome do povo. O que se viu naquele dia foi a conjugação de vários fatores negativos, vergonhosos e desmoralizantes, para uma decisão que afronta o povo brasileiro porque tomada em seu nome por falsos representantes. Basta assinalar, como um dos pontos básicos, que, contrariando os princípios da ética política e da constitucionalidade democrática, um bando de deputados, sem legitimidade e sem representatividade, porque a maioria não se elegeu com votos próprios mas na sobra de votos de terceiros, decidiu revogar um mandato concedido em eleições livres e democráticas por mais de 54 milhões de brasileiros.

Para a avaliação ética, jurídica e política da sessão da Câmara de Deputados e da decisão tomada naquela oportunidade será suficiente assinalar vários aspectos daquela encenação, a começar pela absoluta falta de autoridade e de legitimidade ética e jurídica do presidente da sessão, o deputado Eduardo Cunha, que é o Presidente da Câmara de Deputados. Contra ele existe um processo em andamento no Supremo Tribunal Federal, resultante de pedido formulado pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, em 16 de Dezembro de 2015. Em contato com o Ministério Público da Suíça o Procurador Janot obteve a confirmação, com dados minuciosos, de que Eduardo Cunha tem movimentado quatro contas bancárias naquele País, uma das quais tem como titular sua esposa. Denunciado ao Conselho de Ética da Câmara de Deputados pela prática de ilegalidades, entre os quais a remessa de dinheiro ao exterior por via ilegal, como também por comportamento ofensivo ao decoro parlamentar, Cunha negou a existência daquelas contas quando prestou depoimento naquele Conselho, verificando-se, portanto, que além da movimentação irregular de dinheiro no exterior e da prática de arbitrariedades e manipulação corrupta dos meios da Câmara de Deputados, ele mentiu ao Conselho de Ética.

Na ação que está em curso no Supremo Tribunal Federal o Procurador Janot pediu o imediato afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara de Deputados por falta de condições éticas e jurídicas e por considerar que permanecendo na Presidência ele irá, certamente, pressionar os parlamentares e fazer barganhas prejudicando a apuração de fatos. Além disso, como já tem sido assinalado por jornalista e militantes políticos, sua permanência na Presidência da Câmara de Deputados, sendo réu em ação criminal, acarretará a desmoralização do Parlamento. O processo teve como Relator o Ministro Teori Zavascki, que no dia 2 de Março proferiu seu voto. Num texto objetivo e minucioso de 79 páginas, afirma o ilustre Ministro que existem elementos básicos para o recebimento da denúncia. Segundo ele, “a materialidade e os indícios de autoria relativos aos crimes de lavagem de dinheiro, elementos básicos para o recebimento da denúncia, encontram-se presentes”. Acrescenta, ainda, que a análise dos autos mostra que há indícios robustos para receber a denúncia, pois “os elementos colhidos confortam sobejamente o possível cometimento de crime de corrupção passiva majorada (artigo 317, caput e § 1º, do Código Penal”. Isso ao incorporar-se à engrenagem espúria protagonizada pelo então diretor da Petrobrás, Nestor Cerveró, bem como dela se fazendo beneficiário”. O Supremo Tribunal concluiu que há base para o processo, mas não determinou o afastamento de Cunhada presidência da Câmara.

Quanto ao desempenho dos deputados naquela sessão, praticamente a unanimidade dos que acompanharam a transmissão feita pela televisão tem manifestado indignação e decepção, pelo baixíssimo nível das manifestações de grande número dos parlamentares. Demonstrando baixo nível intelectual, falta de consciência da responsabilidade de atuar como membro de uma das Casas do Parlamento, muitos declararam os seus votos com palavras que iam do ridículo à revelação de pertencerem a bandos que tiveram acesso a um alto cargo do sistema político-representativo brasileiro por via ilegítima introduzida na legislação eleitoral. Com efeito, muitos manifestaram o seu voto, quanto à proposta de impeachment, dizendo que tomavam sua decisão para agradar as avós, os netos, as mães, os filhos, as cunhadas, os tios e os sobrinhos. E com isso fizeram lembrar o comportamento dos integrantes da máfia italiana, que se dizem membros de uma “famiglia”. A par disso, houve manifestações de homenagem a criminosos contra a humanidade, como fez o deputado Jair Bolsonaro, que ao votar fez o louvor de um criminoso que foi reconhecido e condenado como um dos mais violentos e desumanos torturadores durante o período da ditadura militar. A esses desvios acrescentaram-se ainda as manifestações simuladamente religiosas de membros de diferentes organizações, sendo oportuno lembrar que o próprio Presidente da Câmara de Deputados se apresenta como evangélico.

Um dado muito expressivo e de fundamental importância é que nenhum dos que votaram a favor do impeachment disse qual era a base jurídica das acusações contra a Presidente Dilma Rousseff, nem como fundamentavam suas posições. Assim, pois, pela absoluta falta de fundamentação jurídica é muito provável que o Senado, tendo recebido a autorização para instaurar o processo de impeachment, reconheça a absoluta precariedade das alegações e decida não dar continuidade a essa farsa. Certamente os Senadores presenciaram, diretamente ou pela televisão, a desmoralizante sessão da Câmara de Deputados e não irão contribuir para a degradação do sistema representativo brasileiro.

* jurista

Fonte; JORNAL DO BRASIL
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Câmara censura por ordem de Cunha


por Cynara Menezes, no blog Socialista Morena:

Eu já tinha denunciado aqui o PIG de Eduardo Cunha: a mão-de-ferro com que o presidente da Câmara passou a gerir os órgãos de comunicação da Casa, sobretudo a TV Câmara, sem nenhum republicanismo, favorecendo a si mesmo. Esta semana, após o impeachment da presidenta Dilma passar no plenário, uma matéria de 2014 da agência Câmara começou a circular nas redes sociais, mostrando que apenas 36 dos 513 deputados se elegeram de fato com votos próprios, uma demonstração de que precisamos urgente fazer uma reforma política.

Para surpresa de quem compartilhou o texto, dois dias depois, porém, o conteúdo tinha sido INTEIRAMENTE MODIFICADO. Um quadro com os deputados realmente eleitos pelo povo e os que foram beneficiados pelo quociente eleitoral também foi suprimido (ele está reproduzido no alto deste post). A justificativa, dada ao pé da matéria da agência Câmara:

(*) Esta matéria foi atualizada em 19/4/2016 para garantir uma explicação correta do funcionamento do sistema de eleição proporcional no Brasil. Ao contrário do que dizia o texto anterior, não foi apenas um determinado número de deputados que se elegeu com os seus próprios votos. Todos os deputados são eleitos com os seus próprios votos dentro das regras do sistema proporcional. Portanto, todos os deputados têm a mesma legitimidade nos seus mandatos.

Fontes na agência Câmara informaram ao blog que a ordem para “atualizar” a matéria partiu da presidência da Casa. Confira a seguir o texto original da matéria da agência Câmara e compare com o que está escrito agora neste link.

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Apenas 36 deputados se elegeram com seus próprios votos
Os outros 477 eleitos foram “puxados” por votos dados à legenda ou a outros candidatos de seu partido ou coligação.

Apenas 36 dos 513 deputados federais que vão compor a Câmara na próxima legislatura (2015-2018) alcançaram o quociente eleitoral com seus próprios votos. Desses, 11 são parentes de políticos tradicionais em seus estados. Os outros 477 eleitos foram “puxados” por votos dados à legenda ou a outros candidatos de seu partido ou coligação. O número é o mesmo de 2010, quando também houve apenas 36 deputados eleitos com votação própria.

Os números foram calculados pela Secretaria Geral da Mesa da Câmara. O quociente eleitoral é calculado dividindo-se o número de votos válidos no estado pelo número de vagas na Câmara a que tem direito cada estado. Por exemplo, o Distrito Federal tem direito a oito deputados. Dividindo-se os 1,45 milhões de votos válidos por oito, chega-se ao quociente eleitoral de 181,7 mil. Este é o número de votos necessários para um candidato se eleger por conta própria no DF. Porém, nenhum deputado atingiu esse quociente na última eleição.

Além do Distrito Federal, nenhum deputado dos seguintes estados alcançou o quociente eleitoral na última eleição: Acre, Alagoas, Amapá, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Rio Grande do Sul e Tocantins.

Entre os 36 deputados que conseguiram atingir o quociente eleitoral, cinco são de São Paulo, cinco de Minas Gerais e cinco do Rio de Janeiro. Em Pernambuco, quatro deputados foram eleitos com seus próprios votos; e, na Paraíba e no Ceará, três. Em Goiás e Santa Catarina, dois atingiram o quociente eleitoral. No Amazonas, Bahia, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Sergipe e Roraima, apenas um atingiu o quociente eleitoral.

A forma de eleição baseada no quociente eleitoral é chamada de sistema proporcional. Segundo o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz, esse sistema, somado ao quadro de pulverização partidária e formação de alianças no País, tem levado a algumas distorções: “Na Câmara, muita gente se elege com votação muito pequena. Tivemos, na Região Norte, pessoas eleitas com menos de 10 mil votos.”

Em contraposição, dezenas de candidatos foram muito bem votados e ainda assim não foram eleitos. É o caso, por exemplo, do deputado Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB): ele recebeu 106,6 mil votos em São Paulo, mas não foi reeleito. Entretanto, o candidato Fausto Pinato (PRB) foi eleito com 22 mil votos, graças à votação expressiva de Celso Russomanno, do mesmo partido.

Com 1,52 milhão de votos, Russomanno foi o deputado mais votado de São Paulo e “puxou” quatro candidatos para a Câmara: além de Fausto Pinato, ele ajudou a aleger o cantor sertanejo Sergio Reis (45,3 mil votos); Beto Mansur (31,3 mil) e Marcelo Squasoni (30,3 mil). Todos são do PRB, já que o partido não fez coligação.

O segundo colocado em São Paulo, deputado Tiririca (PR), teve pouco mais de 1 milhão de votos e elegeu sozinho dois deputados, além de si próprio: Capitão Augusto (46,9 mil votos) e Miguel Lombardi (32 mil), ambos do PR, que também não se coligou.

Fonte: Blog do Miro
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O mundo inteiro denuncia o golpe

Quem executa o golpe não são os militares, mas um condomínio integrado pela mídia, pelo judiciário, e sacramentado por uma 'assembléia de bandidos'.
Jeferson Miola



A democracia brasileira está ameaçada de um golpe de Estado. O impeachment da Presidente Dilma Rousseff, segundo a imprensa internacional, foi aprovado por “uma assembléia de bandidos comandada por um bandido chamado Eduardo Cunha fazendo a destituição de uma Presidente sem qualquer base jurídica nem constitucional”.

O impeachment está numa etapa avançada: o Senado Federal deverá decidir, dentro de poucas semanas, se continua ou se arquiva o processo aprovado na “assembléia de bandidos”. Caso o Senado prossiga o processo, a Presidente Dilma, que foi eleita para governar o Brasil até 31 de dezembro de 2018, será afastada por até 180 dias até a decisão final. Na prática, porém, praticamente equivale à sua destituição.

Se isso acontecer, em lugar da Presidente eleita com os votos de 54.501.118 brasileiros/as, assume o cargo Michel Temer, um vice-presidente ilegítimo e conspirador, um político sem nenhum voto popular que chefiou a concepção, a preparação e a execução do golpe.

Hoje, concatenando-se os acontecimentos dos últimos 16 meses, é possível reconhecer o papel ativo de Temer na trama golpista. Como presidente do PMDB, ele sempre estimulou a dubiedade do Partido, dividindo-o no apoio ao governo.

Temer traiu a confiança da Presidente Dilma no governo. Ao invés de fazer de verdade a articulação política, sabotou e enfraqueceu o governo, minou a estrutura e os postos-chave com conspiradores e, terminado o serviço que lhe interessava, jogou tudo às favas e saiu dizendo que “o Brasil precisa de alguém [ou seja, ele mesmo] que tenha a capacidade de reunificar a todos” [em 4 de agosto de 2015].

Temer nunca enfrentou o “bandido chamado Eduardo Cunha”, como se esperaria de alguém comprometido com a defesa dos interesses do governo e do país ameaçados pelas pautas-bomba do presidente da Câmara. Ao contrário disso, hoje as evidências permitem concluir que ele e Cunha são sócios da empreitada golpista desde o início.

O espetáculo deplorável da “assembléia de bandidos” de 17 de abril de 2016 impactou o mundo, e cristalizou a percepção de que o impeachment aprovado por 367 “bandidos” é uma violência contra a Constituição e o Estado Democrático de Direito.

Como o Brasil ofereceu este espetáculo deplorável ao mundo? Essa pergunta só pode ser respondida se anotado o papel determinante e fundamental da Rede Globo – secundada por outras empresas da mídia – e de setores do Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal.

O mundo inteiro está convencido de que há um golpe em curso no Brasil. Nessa guerra pela verdade, como não contam com uma Rede Globo mundial, os golpistas estão perdendo.

E estão perdendo de goleada: The Economist, Guardian, El país, Le monde, Financial Times, Reuters dizem que é golpe; Wall Street Journal, Washington Post, El País, Le Parisien, Irish Times, New York Times, Pravda, Granma também dizem que é golpe; La Nación, Ladiaria, El observador, Clarín dizem o mesmo; Al Jazeera, Fox News Latina, CNN etc etc dizem o mesmo: é um golpe de Estado.

Apesar da percepção do mundo inteiro de que está em andamento um golpe de Estado, só no Brasil tem um punhado de gente que insiste no contrário: Temer, Cunha, Bolsonaro, Aécio, FHC, Gilmar Mendes, Celso de Mello, Dias Toffoli, FIESP, Globo e os sócios golpistas.

O sofisma mais recente dos golpistas para sustentar a aparência de “normalidade institucional” é que Temer está substituindo normalmente a Presidente Dilma, que retornará ao cargo depois do retorno da viagem a Nova York para a reunião da ONU sobre clima.

Os golpistas aproveitam esta substituição eventual como fachada para a propaganda e o discurso mentiroso da “normalidade institucional”. O epílogo do golpe, todavia, se dará com o seqüestro da cadeira da Dilma ao fim do julgamento de exceção no Senado – que, tudo indica, a Casa será uma sucursal golpista, um puxadinho da “assembléia de bandidos”.

O impeachment jurídico-midiático-parlamentar é o golpe de novo tipo do século 21, é um golpe diferente daquele clássico que a Globo e a UDN de então – hoje PMDB, PSDB, DEM, PPS, PTB, PP – desferiram em 1964, com a deposição e exílio do Presidente Jango.

No golpe de Estado do século 21 quem executa não são os militares, mas um condomínio integrado pela mídia, judiciário, ministério público e sacramentado por uma “assembléia de bandidos”. Nesta nova modalidade golpista, o rito é parte essencial das aparências – mas o mundo inteiro não acredita nesta farsa.

Fonte: CARTA MAIOR
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