sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Apple versus FBI: o impasse do Estado ilegítimo

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Após praticarem vigilância maciça contra cidadãos de todo mundo, EUA já não podem usar “terrorismo” como pretexto para atacar privacidade

Por Yochai Benkler, no The Guardian |Tradução: Rafael A. F. Zanatta


O confronto entre a Apple e o FBI (Federal Bureau of Investigation) não é, como muitos sustentam, um conflito entre privacidade e segurança. É um conflito sobre legitimidade.

As agências de segurança nacional dos Estados Unidos insistem em exercer um poder sem controle juntamente com o discurso “confie em nós, nós somos os caras bons”, mas a maioria dos usuários não tem essa confiança. O terrorismo é real, e a vigilância pode às vezes ajudar a preveni-lo, mas o único caminho para a acomodação sustentável entre tecnologias de sigilo e o policiamento adequadamente informado é por meio de uma reforma profunda nos freios e contrapesos do sistema nacional de segurança.

O princípio mais importante que o governo Obama e o Congresso norte-americano precisam considerar nesse conflito é: “Médico, cura-te a ti mesmo”.

O FBI, para recapitular, está exigindo que a Apple desenvolva um software que lhe permita acessar os dados protegidos do telefone de trabalho de um dos autores do ataque de San Bernardino1.

A Apple recusou-se a fazê-lo, argumentando que, para construir a habilidade de acessar um telefone, estaria efetivamente criando um “backdoor” que tornaria vulneráveis todos os seus telefones.

O debate está sendo enquadrado publicamente pelos dois lados como um profundo conflito entre segurança e liberdade; entre direitos civis dos usuários para garantir sua privacidade e os fins legítimos da aplicação da lei e da segurança nacional. No entanto, essa é a maneira errada de pensar sobre isso.

O problema fundamental é a quebra de confiança nas instituições e organizações. Em particular, a perda de confiança na supervisão da estrutura de segurança nacional estadunidense.

É importante lembrar que a decisão inicial da Apple de redesenhar seus produtos de modo que a própria Apple seja incapaz de obter os dados de um usuário foi uma resposta direta às revelações de Snowden. Aprendemos com ele que o sistema de segurança nacional norte-americano passou os anos após o 11 de setembro esvaziando o sistema de supervisão delegada que limitou a vigilância da segurança nacional após o escândalo Watergate e a denúncia de abusos de órgãos de inteligência nos anos 1960 e 70.

A criação, pela Apple de um sistema operacional impermeável até mesmo a seus eventuais esforços para quebrá-lo foi uma resposta à perda global de confiança nas instituições de supervisão da vigilância. Ela encarnou uma ética que dizia: “Você não precisa confiar em nós; você não precisa confiar nos processos de supervisão de nosso governo. Você simplesmente precisa ter confiança na nossa matemática”.

Muitas pessoas que conheço e admiro estão preocupadas com o presente impasse. Afinal, e se você realmente precisar de informações de um terrorista prestes a agir, ou um sequestrador com uma criança de refém? São preocupações reais e legítimas, mas nós não vamos resolvê-las olhando para os lugares errados. A dependência do FBI no All Writs Act de 1789 diz: “Eu sou o governo e você deve fazer o que é ordenado!”. De acordo com tal lógica, é irrelevante saber se os atos do governo são legítimos ou ilegítimos – porque o dever dos cidadãos é obedecer uma ordem legalmente emitida.

O problema com a abordagem do FBI é que ela trai exatamente a mentalidade que nos colocou na bagunça em que estamos agora. Sem comprometimento do governo norte-americano com a transparência e a supervisão democrática com instituições que funcionem efetivamente, os usuários irão escapar para a tecnologia. Se a Apple for forçada a abrir seus sistemas, os usuários irão para outros produtos. As empresas estadunidenses não possuem o monopólio sobre a matemática.

Nos dias tumultuosos após as revelações de Snowden, houve diversos comitês e forças-tarefa criados para propor reformas. Até mesmo um grupo de revisão formado por ex-funcionários da Casa Branca e da Agência de Segurança Nacional (NSA) propuseram reformas estruturais extensivas sobre como a vigilância operava e com era supervisionada. Nem o governo nem o Congresso conseguiram implementar de forma significativa qualquer uma dessas reformas.

A tecnologia da Apple é uma resposta à sede dos usuários por tecnologias que possam garantir privacidade e autonomia, em um mundo onde eles não podem confiar em qualquer instituição, seja do governo ou do mercado.

Por isso, é do interesse vital da segurança nacional dos EUA construir um sistema institucional de supervisão robusta e prestação de contas da vigilância e dos poderes investigativos. Precisamos de restrições significativas sobre a coleta e uso dos dados; precisamos de mecanismos de avaliação verdadeiramente independentes, com completo acesso à informação necessária e capacidade técnica proficiente para exercer tal avaliação.

Talvez mais importante, precisamos pôr fim à cultura de impunidade que protege as pessoas que dirigem programas ilegais e continuam a prosperar em suas carreiras depois de serem expostas, mas persegue vingativamente os whistleblowers que expõem tais ilegalidades.

Somente um sistema assim, que oferece supervisão significativamente transparente e consequências reais para aqueles que violam a confiança, possui qualquer chance de ser confiável o suficiente para remover a reivindicação global por plataformas que preservem a privacidade do usuário e segurança mesmo às custas do enfraquecimento das capacidades de policiamento e das agências nacionais de segurança.

O caso da Apple não tem a ver com o equilíbrio entre liberdade e segurança; mas com a confiabilidade das instituições ou tecnologias que independem de confiança. Não será possível resolver tal caso passando um rolo compressor na tecnologia a serviço de instituições não confiáveis.

1 Referência a atentado praticado em San Bernardino (Califórnia), em dezembro de 2015. Dois atiradores mataram 14 pessoas e feriram 22. Foram apontados pelo FBI como extremistas islâmicos. Leia mais naWikipedia. [Nota de Outras Palavras]


Fonte; OUTRA PALAVRAS
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MST exige veto completo da lei antiterrorismo: Vai criminalizar ainda mais movimentos sociais

publicado em 26 de fevereiro de 2016 às 11:07
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NOTA MST repudia Lei antiterrorismo e exige o veto completo do projeto
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra vem à público repudiar o projeto de lei enviado pelo Poder Executivo que tipifica o crime de terrorismo. A proposta é desnecessária e inconsequente. Infelizmente, soma-se a outras iniciativas de setores conservadores do Congresso Nacional que querem implementar uma escalada autoritária nas leis brasileiras, mudando inclusive a própria Constituição, como é o caso da maioridade penal.
Vivemos tempos em que tudo é criminalizado. Jovens pobres e negros são os maiores alvos da violência e de um sistema de justiça criminal seletivo e com claro recorte de classe.
Por essa razão, ao invés de enviar projetos de lei que reforcem a escalada conservadora legislativa, o governo poderia começar por retirar do ordenamento jurídico entulhos autoritários como a Lei de Segurança Nacional que, vez ou outra, serve para criminalizar legítimas lutas sociais.
A proposta é desnecessária, por que já existem leis mais que suficientes para enquadrar qualquer eventual ação de grupos terroristas no Brasil.
O Estado brasileiro oferece mais polícia e menos justiça indistintamente. O projeto de lei intensificará o que já tem sido aplicado aos movimentos e organizações sociais que lutam por seus direitos.
Acerca desse fato, destacamos a afirmação do Relator Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Edison Lanza, acerca dos riscos em relação aos movimentos sociais.
Segundo o relator Lanza, “leis antiterrorismo muito ambíguas ou abertas têm sido utilizadas para criminalizar movimentos sociais no continente. A própria Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Chile, em 2014, por usar sua lei antiterror contra ativistas do povo indígena Mapuche. A definição que está sendo construída no Brasil usa termos complicados, como extremismo político, ocupação de prédios públicos e apologia ao terrorismo”.
Por isso, o MST segue na defesa da luta, nas ruas e nas ocupações, reafirmando: lutar não é crime e nem terrorismo!
Exigimos que a presidenta VETE integralmente o projeto de lei 2016/2015 que tipificou o terrorismo.

Coordenação Nacional do MST
Fonte: VIOMUNDO
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ONU critica aprovação de lei antiterrorismo

O projeto de lei inclui definições demasiado vagas e imprecisas, o que não é compatível com a perspectiva das normas internacionais de direitos humanos        


Direitos Humanos da ONU
Mídia Ninja
SANTIAGO (26 de fevereiro de 2016) – O Escritório para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) criticou hoje (26/02) a recente aprovação de uma lei antiterrorismo (PL 2016/15) no Congresso Federal do Brasil.

“O projeto de lei inclui disposições e definições demasiado vagas e imprecisas, o que não é compatível com a perspectiva das normas internacionais de direitos humanos”, disse o Representante do ACNUDH na América do Sul, Amerigo Incalcaterra.

“Essas ambiguidades podem dar lugar a uma margem muito ampla de discricionariedade na hora de aplicar a lei, o que pode causar arbitrariedades e um mau uso das figuras penais que ela contempla”, acrescentou.

O Representante ressaltou a necessidade de que o Brasil garanta os direitos às liberdades de reunião e associação pacífica e a liberdade de expressão, entre outros direitos, no contexto da luta contra o terrorismo. “As disposições do projeto por si só não garantem que essa lei não seja usada contra manifestantes e defensores de direitos humanos”, disse.

Incalcaterra citou ainda a opinião de quatro relatores especiais da ONU, que em novembro de 2015 julgaram a proposta de lei antiterrorismo no Brasil como “muito ampla”.

“A estratégia mundial contra o terrorismo deve ter como pedra angular a proteção dos direitos humanos, as liberdades fundamentais e o Estado de Direito”, finalizou o Representante do ACNUDH.


Fonte: CARTA MAIOR
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