sábado, 9 de janeiro de 2016

Marvada em alta

A Cachaça: o resgate



Recentemente fui jantar no Restaurante Brigite’s, no Leblon e a dupla Leo “Black”, o bartender e Isadora Bello Fornari, especialista em cachaças (cachacelière?) me convenceu a provar um Negroni “tropical”.



Receita: Carpano Punta e Mês, Vermute (seco) e (em vez de gim) … cachaça envelhecida em barris de carvalho. Uma delícia.

Observação: eu não poderia “falar” de cachaça sem mencionar a minha amida Deise Novakovsky que há um par de anos (e põe tempo nisso) entende, defende e … prova as melhores Cachaças.



Ou seja, de uns 50 anos para cá (eu acho), a Cachaça saiu do botequim e vem ganhando status de bebida de entendidos em blogs, “clubes”, bares chiques e restaurantes da moda. Participa de concursos. Está no display de hotéis quatro e cinco estrelas. Industrializada ou artesanal.



Mas nem sempre foi assim. Durante todo o ciclo da cana de açúcar, do ouro e do café, a marvada foi a bebida do escravo, do negro … do cachaceiro.



Isso explica, talvez, porque o substantivo Cachaça é o vocábulo em português com mais sinônimos (para uns, 2000, para outros, 5000). Fazia parte da psicologia “do imigrante” desses despossuídos totais disfarçarem seu gostos, seus sentimentos — com medo do pelourinho.

Mas, e talvez por isso mesmo, como bem observou Câmara Cascudo no seu livro Preludio da Cachaça, publicado na sua Natal, em 1967, “ ela assegurou a sua sobrevivência ficando com o povo”.

Sobrevivência e expansão: a Cachaça era produzida em larga escala nos engenhos de Pernambuco, Bahia, sul do Rio de Janeiro e nas Minas Gerais. Paraty chegou a engarrafar 800 mil litros por ano, no final do século XVII. E assim foi até a abolição da escravatura, quando a produção entrou em franco declínio por óbvios motivos.

Mas mesmo durante essa gangorra que durou cerca de 400 anos, a imagem da Cachaça sempre esteve associada à escumalha.

Foi preciso que fatos políticos primeiro, e só depois econômicos, viessem em seu socorro.

O primeiro, A Revolução de Arte Moderna, em 1922. O manifesto/movimento Pau-Brasil defendia a cachaça no elenco de produtos brasileiros a serem valorizados em detrimento dos estrangeiros e o chamado Grupo dos cinco, integrado pelos escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Menotti Del Picchia e pelas pintoras Tarsila do Amaral e Anita Malfatti, bebia cachaça nos restaurantes chiques de São Paulo e nos salões da Av Paulista.

Mais de 70 anos depois coube a outro carioca-paulista, o sofisticado FHC, assinar o decreto Decreto n° 4.072/2002 que regulamentou a Lei n° 8.918/1994. No texto, se protege a propriedade da denominação da cachaça como aguardente de cana típica e exclusivamente produzida no Brasil. A bebida também conquistou o interesse da academia no desenvolvimento de estudos, fomentando, gradativamente, a especialização profissional daqueles que atuam no setor.

Resultado: depois de uma humilhada peregrinação por nosso território, nossa cultura e nossa sociedade, sempre de 3º classe, mas durante a qual chegou a gerar filhotes como o quentão de pinga (misturada com gengibre) e a batida de limão (originariamente com mel ou rapadura, para aliviar a garganta dos seresteiros) a Cachaça chegou aos dias atuais como um dos valiosos produtos de consumo no Brasil e no exterior.

Uma commodity verde-amarela.

E além de ser servida “in natura” ela transferiu o seu DNA para um dos drinques mais consumidos aqui — e lá fora: a caipirinha, também declarada verde e amarelo(a) por decreto.



Em 2013, o IBRAC (Instituto Brasileiro da Cachaça) informou que a Cachaça é o segundo destilado mais consumido no país. E o terceiro no mundo. A capacidade produtiva instalada hoje, em fronteiras nacionais, é de 1,2 bilhão de litros por ano. São cerca de 4 mil marcas registradas e mais de 600 mil empregos gerados, direta e indiretamente.

Passou de capote o Rum, a Tequila, as bagaceiras, eau-de-vies e congêneres… Viva ela!

E por falar na escalada da Cachaça para ganhar status, outro passo de gigante foi o aval do então presidente Lula. Ele sempre assumiu que um operário alivia as mágoas com goles da “marvada” e também regulamentou a composição da cachaça.

..

Obs: foto publicada no site www.futepoca.com.br (futebol, política e cachaça).

Mas a glória, mesmo, se deu em abril de 2012, quando a Presidente Dilma aproveitando a visita a Washington, assinou um acordo com o governo dos EUA pelo qual ambos os signatários reconheciam – de uma lado, que a nossa tão querida cachaça é um produto genuinamente brasileiro e, do outro, que o Tenessee Bourbon (uísques de milho) também é uma bebiba genuianamente (norte)americana.

E, para celebrar, ambos brindaram com cachaça!!!



Mas independentemente desses “picos de prestígio”, a cachaça vem ganhando um novo espaço na área cultural e do turismo, principalmente no Estado do Rio. Para nossa sorte (cariocas-fluminenses), a Primeira-Dama do Estado, D. Maria Lúcia Horta Jardim, está pessoalmente empenhada na criação do Museu da Cachaça, no Rio. Aliás, graças a ela (e outros “devotos”, é claro) foi criado o Polo da Cachaça do Vale do Café, que envolve 14 municípios da região e 15 alambiques.

Industrializada ou artesanal, envelhecida em tonéis de carvalho por 2 a 10 anos ou novinha, a Cachaça está na mídia. E aqui vai a lista das 50 marcas preferidas pela Seleção dos Especialistas, publicada no O Dia de dezembro agora (2015), pelo Dirley Fernandes, também colunista da Revista Gula e titular do blog Devotos da Cachaça

Anísio Santiago/ Havana
Áurea Custódio 3 anos
Authoral
Bento Albino Extra Premium
Canabella Ouro
Canarinha
Caraçuipe Ouro
Casa Bucco Ouro
Cedro do Líbano
Claudionor
Companheira Extra Premium
Coqueiro Prata (amendoim)
Da Quinta Umburana
Da Tulha Carvalho
Dona Beja Extra Premium
Engenho Pequeno
Espírito de Minas
Germana
Germana Heritage
Harmonie Schnaps Extra Premium
Harmonie Schnaps Prata
Havaninha
Indaiazinha
Leblon Signature Merlet
Magnifica Carvalho
Magnifica Reserva Soleira
Maria Izabel Carvalho
Mato Dentro Amendoim
Mazzaropi Carvalho Francês
Porto Morretes 12 anos Exp.
Porto Morretes Premium
Reserva 51
Reserva do Gerente Carvalho
Reserva do Nosco Ouro
Reserva do Nosco Prata
Sanhaçú Amburana
Sanhaçú Freijó
Santo Grau Cel Xavier Chaves
Santo Grau Paraty
Santo Grau PX
Sapucaia Reserva Família
Sebastiana Castanheira
Serra Limpa
Vale Verde 12 anos
Vale Verde 3 anos
Weber Haus Amburana
Weber Haus Carvalho/Cabriuva
Weber Haus Lote 48
Werneck Ouro
Werneck Safira Régia


Haja fígado!

Postado por reinaldo | Comentar


Fonte: JORNAL DO BRASIL
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