sábado, 5 de dezembro de 2015

Marketing, Terceirização e Laudos Falsos

O problema do “marketing social” é ser mais marketing que social

samarco
Hoje, me deparo com um anúncio da Samarco na homepage da Folha. Outro, imenso, do tipo “pop-up”, do Estadão.
Não fazem menção, mas me dei conta.
É que faz um mês que a barragem de rejeitos da empresa se rompeu, despejou lama, destruiu casas e vidas, algumas no sentido literal, centenas ou milhares no sentido emocional, como se vê no comovente vídeo do jornal O Estado de Minas, que posto ao final.
Fui ver se os relatos da empresa traziam algo de significativo.
Nada.
Parece que está tudo bem para as famílias que perderam tudo.
Uma vez sequer a palavra “responsabilidade”.
A maré de lama nos rios vira “pluma de turbidez”.
O comunicado 89 descreve as sirenes de alerta que nunca tinham sido colocadas.
No 90, para falar dos peixes mortos em Regência, Espírito Santo, diz que “estão sendo removidas do rio as espécies sem vida.”
No 91, afinal, alguma leve menção às culpas da empresa: “Neste momento, estamos sendo muito questionados, mas continuamos firmes para esclarecer os fatos.”
Esclarecimentos, nenhum.
E, embora algumas investigações técnicas possam demorar, outras não estão concluídas inexplicáveis 30 dias depois, como a falta de sistemas de monitoramento e alarme que minimizassem os danos humanos em caso de acidente.
Como sempre acontece nestes casos, a direção da empresa busca dividir as responsabilidades: “Somos mais de 3 mil pessoas orgulhosas do trabalho que realizamos há 40 anos no Brasil.”.
Quantas destas três mil – inclusive algumas que perderam a vida – têm alguma culpa no desastre? Ninguém está questionando coisa alguma sobre os empregados da Samarco, mas seus donos e dirigentes.
Este é o grande problema do “marketing de responsabilidade social”.
Primeiro o marketing, muito.
Depois o social, o mínimo necessário para fazer o marketing.
E por último, a responsabilidade, nenhuma antes do desastre e autolouvação do que faz depois dele.
Fonte: TIJOLAÇO
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Terceirização de laudos pode ser raiz de desastres

No Brasil, empreendimentos pagam empresas privadas para atestar segurança de barragens.
05/12/2015
Por Rafaella Dotta,
De Belo Horizonte (MG)
Crédito: Rodrigo Alves / TV Senado
Há um mês do rompimento da barragem em Mariana, especialistas continuam a debater os motivos e resultados do desastre. Na quinta (3), um debate na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apresentou a legislação brasileira sobre planos de emergência e responsabilizações acerca de barragens de rejeitos.
A palestrante Karen Alvarenga, advogada e doutora em Economia Agrária pela Universidade de Cambrigde, da Inglaterra, explicou o modelo de Alerta e Preparação de Comunidades para Emergências Locais (Apell), elaborado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para auxiliar os países na prevenção de desastres, “depois de muitos acidentes com barragens”, lembra.
Para a advogada, o Apell é um avanço, mas possui inúmeros procedimentos que as empresas mineradoras não colocam em prática. Um exemplo são os dez passos para a construção do próprio plano, desde o mapeamento de lideranças locais, até os testes práticos realizados com a comunidade. “Isso leva muito tempo, principalmente nas cidades do interior, e os empreendimentos não vão atrasar seus lucros por isso”, critica.
Fiscalização baseada em laudos de terceiros
Na segunda parte do debate, Marcelo Kokke emendou com uma descrição das leis brasileiras sobre licenciamento, fiscalização e responsabilização sobre barragens. Procurador da Advocacia Geral da União junto ao Ibama e doutor em direito pela PUC, Marcelo frisa que o licenciamento ambiental e, principalmente, a fiscalização de barragens são todas feitas via parceira do órgão público com entes privados.
Segundo o procurador, o Brasil usa um modelo comum em vários países, que é trabalhar com laudos feitos por empresas terceirizadas, contratadas pelo empreendimento minerário. Assim, de acordo com a Lei Complementar 140, a fiscalização a barragens é competência do ente licenciador, que no caso de Minas Gerais é o governo estadual, mas que parte de um julgamento prévio dado pelos técnicos contratados.
“Imagine: você é um fiscal. Você tem uma pilha com relatórios, assinados por profissionais, dizendo que a barragem está bem. Você tem uma segunda pilha com barragens mais ou menos. E uma terceira com barragens em estado ruim. Qual você irá visitar primeiro?”, questiona Marcelo. Deve-se lembrar que, apesar das ações do Ministério Público, a barragem de Fundão estava atestada como uma barragem em bom estado.
Responsabilidades
Marcelo Kokke explica que, no Brasil, os danos causados por acidentes de empreendimentos minerários são classificados como “risco integral”. Isso quer dizer que a empresa deve assumir os possíveis problemas ambientais e sociais causados pela sua atividade, ainda que a culpa seja de um engenheiro ou um terremoto. De acordo com a Lei 12.334, é possível cobrar dela a reversão dos danos, as indenizações e os gastos que a União, estados e municípios estão tendo.
“É preciso ficar atento. Pelo histórico de casos, quando a poeira se assenta começam as discussões sobre as responsabilidades. Houve empresas que negaram indenizações porque atingidos tinham apenas provas testemunhais. Ou seja, não tiraram foto ou vídeo dos bens que possuíam. Mas como, se precisou sair às pressas somente com a roupa do corpo?”, questiona o promotor.
Fonte: BRASIL DE FATO
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Mineração: o banqueiro predador e o sonho dos assentados

Empresa do grupo de Daniel Dantas ameaça um assentamento de despejo para explorar jazidas de minerais que deixam um rastro de destruição ambiental

Najar Tubino

EBC
Cáceres (MT) – O assentamento Roseli Nunes está localizado a 90 km da cidade, no município de Mirassol d’oeste (MT), onde 331 famílias, em torno de 1.500 pessoas e uma escola estadual com 400 alunos movimentam a vida de uma antiga fazenda, cujo proprietário – um coronel aposentado, da família Prata – ameaçava os sem-terra de morte. O sonho da terra foi uma luta durante oito longos anos. O assentamento completa 13 anos de existência oficial em 2015, conta com a Associação de Produtores Agroecológicos (ARPA), produz mais de 200 toneladas de hortaliças, distribuídos em escolas, creches e asilos de vários municípios da região.

Nélio Gomes de Souza é o presidente da entidade e também vereador em Mirassol. Ele é mineiro, nasceu em Ipatinga, no Quadrilátero Ferrífero. Fugiu da mineração décadas atrás e agora enfrenta a indústria da extração novamente. Neste caso uma empresa chamada Bemisa – Brasil Exploração Mineral S/A -, controlada pelo Grupo Opportunity, do banqueiro predador Daniel Dantas. Depois que suas relações com o poder na era FHC começaram a dissolver, e as brigas judiciais dentro do setor telefônico aumentavam, nos anos 2000, ele começou a migrar os seus investimentos. Comprou 500 mil hectares de terra no Pará e virou pecuarista. E montou a Global Mine Exploration (GME4) e passou a registrar sucessivos pedidos de lavra no Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM. Em 2009 eram 1.381, envolvendo ferro, ouro, diamante, terras raras e fosfato.

Daniel Dantas e o maior banco de ativos minerais

As notas nas colunas de economia relatavam a última sacada do economista gênio, cria do falecido conterrâneo, Antônio Carlos Magalhães: o maior banco de ativos minerais da América Latina. Na verdade perseguia a trilha de Iene Batista, porém, sem ter um pai especialista em minérios. A Bemisa, criada em 2007, executa estes projetos que eram apenas pedidos de pesquisa de lavra. São oito projetos em seis estados. A única operação mineral começou com a mina Baratinha, no Vale do Aço em 2014. Mas também envolvem o sul do Piauí, onde descobriram mais de dois bilhões de toneladas de ferro e pretendem explorar a partir de 2016, para infortúnio e sofrimento das comunidades de Curral Novo do Piauí assediadas por todos os lados para venderem as terras ou abandonarem a área.

O roteiro dos extratores é velho, autoritário, ultrapassado, fora de contexto, mas continua sendo usado. Primeiro o anúncio de uma grande jazida, como ocorreu em Mirassol d’oeste, em 2010 pelo governador Sinval Barbosa (PMDB) com a descoberta de 450 milhões de toneladas de fosfato e 11 bilhões de toneladas de ferro na região, o que caracterizaria um “novo pré-sal”. Uma mentira que não sustentaram por muito tempo, porque o Serviço Geológico do Brasil confirmou a existência dos minerais, mas no caso do ferro, com apenas 40% de pureza – é preciso 58% para validar a exploração. O fosfato precisaria de mais pesquisas e avaliações. Sem contar que a jazida é intercalada – por rochas fosfáticas e ferro. Uma tecnologia que somente a China possui, segundo comentários dos meios minerários.

Levar pânico aos moradores

Basta uma mentira desse tipo, para logo surgir um bando de aventureiros e especuladores interessados no negócio. E as terras dos assentados do Roseli Nunes abrigam parte da jazida. Na sequência uma geóloga do INCRA visitou o assentamento acompanhada de um engenheiro e pedindo autorização para a realização de sondagens. A gestora da Escola Estadual Madre Cristina, Maria José de Souza Gomes relatou o encontro:

-“Nós fomos surpreendidos. Não tínhamos nenhuma informação. Resolvi perguntar sobre a ordem de serviço do INCRA para saber o motivo do trabalho. Ela não tinha. Ninguém concordou e eles foram corridos”.

Este tipo de expediente é característica destes projetos pelo interior do país. As corporações lidam com a falta de informações, exercem seu autoritarismo com objetivo de assustar os moradores, normalmente despreparados para enfrentar tais situações. Levar o pânico faz parte do negócio, porque elas sempre têm pressa em começar a exploração. No caso do banqueiro predador mais ainda, porque ele recolhe dinheiro no mercado, de cotistas, que tem um prazo para receber o dinheiro de volta com os lucros contabilizados.

Não são milionários, mas produzem comida de verdade.

Ocorreram outros episódios desse tipo, até conseguirem fazer uma sondagem na terra de dois assentados, que quase foram expulsos do assentamento. Em outra ocasião, descobriram que uma equipe de sondagem estava próxima do assentamento e um grupo correu atrás e por pouco não vira uma tragédia, porque eles pretendiam queimar o carro da equipe. O Roseli Nunes é dividido em 23 núcleos, todos com coordenadores, além de uma coordenação geral. As propostas são discutidas nos núcleos e depois levadas à coordenação. Além do trabalho de conservação do ambiente, da água, do solo, da produção agroecológica e da pecuária leiteira eles mantêm uma área social – coletiva – onde produzem verduras, legumes e frutas.

Não são milionários, não exportam commodities, produzem comida de verdade, sem veneno e cuidam da terra como o maior bem que possuem, porque ela registra a história de sofrimento de milhares de vidas. A proposta de exploração mineral na área do assentamento foi rechaçada pela maioria e eles pretendem enfrentar a situação, com tudo o que aprenderam nos últimos 20 anos. O banqueiro predador pode ter certeza que a exploração, como foi divulgada no assentamento, envolver a expropriação de 110 lotes, não será uma batalha simples.

A Bemisa informa em seu site que em 2015 foi concluída a quarta e última campanha de sondagem do Projeto Jauru, é o nome oficial da exploração de fosfato e que ainda foi realizada uma sondagem de 15 mil metros. Também iniciará a construção da planta piloto, que começará operar em 2016 em Mirassol d’oeste, sudoeste do Mato Grosso, onde a linha ferroviária mais perto está em Rondonópolis, no sudeste.

Bemisa vai produzir fertilizantes fosfatados

Qual é a importância do fosfato no Brasil? É a fonte de fósforo dos fertilizantes químicos, sendo que a metade ainda é importada – 80% da rocha fosfática é Abastecida pelas empresas nacionais – basicamente Vale, que comprou a Fosfértil e Ultrafértil, a Cobras, da Anglo American e a Galvani, que tem um complexo de produção de fertilizantes na Bahia. É preciso explicar o seguinte: a Bemisa, conforme informação do presidente, Augusto Cezar Calazans Lopes, executivo com experiência em Private Equity, vai produzir fertilizantes fosfatados, conforme testes da rocha avaliados pela USP, Fundação Gorceix e na UFMG. Os resultados demonstram a viabilidade técnico econômica para produção de concentrado fosfático e fertilizantes fosfatados. Um detalhe: a pesquisa foi financiada em parte com verba do FINEP, uma linha de financiamento público para quem investe em inovação tecnológica.

É uma operação química 

Para explorar o ferro no sul do Piauí, que segundo a empresa custará mais de três bilhões de reais, 55% vai ser requisitado como financiamento via SUDENE.

Aqui é necessário uma explicação: para transformar a rocha fosfática, onde está o elemento P2O5 – pentóxido de fósforo – precisa ser escavada ou explodida. Depois britada e moída, posteriormente lavada e sofrer um choque químico com ácido sulfúrico, senão o fósforo não é concentrado. O pentóxido de fósforo não é solúvel em água e precisa ser acidificado para ser usado como fertilizante. Resumo da ópera: não é uma operação de extração mineral, mas sim uma operação química, por isso mesmo as empresas que fazem a exploração em Cajati (SP), em Uberaba ou Cubatão tem complexos industriais, onde são explorados fertilizantes e produtos intermediários.

O produto básico para chegar aos fertilizantes é o ácido fosfórico, que é o resultado do choque do ácido sulfúrico, depois de filtrado. Para cada tonelada de ácido fosfórico sobra como rejeito cinco toneladas de fosfogesso. No Brasil existem 150 milhões de toneladas de fosfogesso acumuladas. Parte dessa montanha é usada como gesso agrícola, ou industrial – na construção civil e aterros sanitários. Entretanto, o problema e as consequências da mineração sempre está nos detalhes.

“- Todos os fertilizantes fosfatados de acordo com a origem da rocha podem conter vários metais, que podem ser considerados como micronutrientes e metais considerados tóxicos.” Trecho de uma trabalho do IPEN, autarquia associada à USP. O Centro de Tecnologia Mineral (CETEM) é mais claro ao analisar a exploração em Cajati (SP), no Vale da Ribeira:

“- O principal aspecto negativo do fosfogesso é a sua impureza, sobretudo devido a presença de fósforo, metais pesados, radioatividade e acidez residual. Poeira, infiltração no solo e águas ácidas das lagoas de decantação são alguns dos impactos causados pelo fosfogesso no solo”.

Metais pesados e radioatividade

A questão é que no Brasil não existem metodologias específicas e apropriadas para avaliação de metais em fertilizantes e condicionadores de solo, como é chamado o fosfogesso – não é o mesmo gesso oriundo da gipsita, um mineral que é a fonte de quase 100% no Brasil.

Metais como chumbo cádmio e cromo, além do rádio estão presentes na rocha fosfática. Todos considerados tóxicos e cancerígenos mesmo em baixas concentrações. O que os assentados do Roseli Nunes vão enfrentar nos próximos anos é um complexo industrial, equivalente com o da Galvani na Serra do Salitre, em Angico Dias (BA):

-Mina em lavra a céu aberto, usina de concentração, unidades de ácido sulfúrico, ácido fosfórico, acidulação, granulação de fertilizantes e fosfato bicálcico. Mais as barragens de rejeito e as lagoas de decantação. A Serra do Caeté, com sua mata exuberante- transição para a Amazônia-, com a biodiversidade característica, onde se encontra a área da jazida de fosfato na região, numa área de 70km2, será detonada. Seus córregos e nascentes de água secarão. O ar será contaminado pela reação do ácido sulfúrico com a chuva, que gera chuva ácida. Enquanto isso, o banqueiro predador vai valorizando seus ativos até conseguir um comprador, talvez a Sinosteel Corporation, cujos representantes estiveram no sul do Piauí para avaliar a operação do ferro.

Para encerrar: está no boletim semestral do DNPM 2015- “queda nos preços dos metais e fertilizantes que evidenciam menor demanda global por metais, China principalmente, problemas de excesso de oferta, elevados estoques, além da influência do dólar americano. Aumento na oferta de minério de ferro em função da entrada em operação de novas minas e aumentos na capacidade de produção na Austrália e Brasil, além do excesso de oferta de aço na China”. O preço atual do ferro – 63 dólares a tonelada é um terço do maior preço em 2011. A tendência divulgada pelo Banco Mundial: a queda nos preços dos metais e fertilizantes continuará.

Esqueci de especificar: o processo de aproveitamento da rocha fosfática é úmido e como ocorre em outras extrações minerais precisa de muita água. Em Anitápolis (SC), onde a população já enfrenta a extração mineral do fosfato – embora o projeto esteja suspenso, depois da compra pela Vale – a retirada é calculada em 773 m3 por hora, ou o equivalente a 30% da vazão do rio Pinheiros, onde fica o projeto.

Fonte: CARTA MAIOR


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