quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Descaso com a vida

“A Lei de Crimes Ambientais é apenas para prender velhinhas com papagaio?! 

Presidentes da Samarco, Vale e BHP não podem ficar impunes!”

publicado em 19 de novembro de 2015 às 14:16
Samarco, Vale e BHP
Da esquerda para a direita, os presidentes: Ricardo Vescovi, da Samarco, Murilo Ferreira, da Vale, e 
Jac Nasser, da BHP Billiton
por Conceição Lemes
Por mais que Samarco e suas controladoras, a Vale e BHP Billiton, contem com a complacência criminosa da nossa grande imprensa, elas carregarão para sempre a responsabilidade pela maior tragédia socioambiental do Brasil: o rompimento das duas barragens em Mariana (MG), em 5 de novembro de 2015.
Onde antes havia vida, a partir de 5 de novembro só há destruição. A associação do subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, cujas mulheres faziam a fantástica geleia de pimenta biquinho, não existe mais (no final, vídeo mostra como era antes da tragédia). Assim como desapareceram os animais e a vegetação daquela outrora pacata cidade mineira.
Por onde a avalanche  de lama tóxica da Samarco/Vale/BHP passou, espalhou morte, devastação, caos e dor. As perdas humanas, culturais, sociais e ambientais são incalculáveis.
Vai ser possível a recuperação total? Claro que não. As vidas humanas e animais não têm volta. E a reparação completa do meio ambiente? Tudo indica que também não. Será um trabalho para muitos anos, talvez décadas, sem conseguir chegar à perfeição do equilíbrio entre os ecossistemas existente até o fatídico 5 de novembro.
Indignadíssimo, o biólogo Rogério Bertani me enviou o seguinte e-mail:
Trabalho com animais, entre as minhas tarefas está a produção de conhecimento para utilização na conservação da natureza. É duro assistir o que está acontecendo em Mariana. Enquanto isso, sabemos que crimes menores são prontamente combatidos, às vezes de forma dura. Imagine agentes do Ibama indo pra cima de velhinhas que têm um papagaio em casa às vezes por 30, 40 anos. Eles vão lá, tomam os bichos, aplicam multas, podem até processar, prender. Por outro lado, os presidentes da Samarco, Vale e BHP vão ficar impunes? Para que serve a Lei de Crimes Ambientais? É só para prender velhinhas?!
Bertani é também doutor em Zoologia e pesquisador científico. É um profissional seriíssimo, de primeira linha.  Tem outra característica: baseado em evidências, fala o que pensa, mesmo que desagrade a chefia.
Resolvi aprofundar o conteúdo da sua mensagem de Rogério, entrevistando-o.

Viomundo – A mídia tem se referido ao rompimento das barragens em Mariana como acidente. Concorda?
Rogério Bertani – Não é o caso das duas barragens que se romperam. Era tragédia anunciada. Pelo que já foi apurado não havia um plano de gestão de riscos nem um plano de contingência para retirada da população. É, como bem observou o geólogo Álvaro Rodrigues dos Santos, ex- diretor do IPT [Instituto de Pesquisas Tecnológicas], em artigo publicado no Viomundo, um caso típico de irresponsabilidade na gestão de riscos.
De forma que me recuso a chamar de acidente o que aconteceu em Mariana.

Viomundo – Logo no início, a Samarco, com a cumplicidade de alguns setores da Academia, tentou vender que a causa do rompimento teriam sido abalos sísmicos. O que acha?
Rogério Bertani – Imagino que represas de forma geral têm de ser construídas para resistir a abalos sísmicos. Quantas represas existem no Brasil? Centenas. Se qualquer abalo sísmico rompesse uma barragem, não teríamos mais nenhuma. E a atividade sísmica no Brasil é muito pequena comparada com outros países, que mesmo assim possuem muitas barragens e represas e elas não vivem se rompendo.

Viomundo – O senhor classifica o que aconteceu como crime ambiental ou crime contra a humanidade?
Rogério Bertani – Veja bem. A região em que ocorreu o vazamento é de grande importância biológica. Ali, existem diversas áreas de endemismo, ou seja, flora e fauna, que só existem naquele local.
O próprio rio Doce é considerado uma barreira biogeográfica. A fauna e flora ao norte dele são distintas daquela existente ao sul. Pelas características do evento, todo o ecossistema será afetado, e durante muito tempo.
Apesar de o principal impacto ter ocorrido na fauna e flora aquáticas, a parte terrestre também será afetada, pois a natureza é toda conectada. Animais que vivem na terra dependem também dos que vivem no ambiente aquático, e vice-versa.
Embora os crimes ambientais não sejam tecnicamente considerados como crimes contra a humanidade, na essência o são, pois todos serão atingidos, de uma forma ou de outra, pelas consequências desse desastre.

Viomundo —  Quem no seu entender tem de ser punido?
Rogério Bertani — Cabe à polícia e ao Ministério Público avaliar. Porém, espero que desta vez a punição não fique limitada a técnicos e burocratas de quinto escalão. É preciso responsabilizar os dirigentes dessas empresas, ou nada mudará.

Viomundo – Pela lei brasileira quais são as penas para quem provoca dano como o de Mariana?
Rogério Bertani — A Lei de Crimes Ambientais, lei nº 9.605, de 12.02.1998, diz que os crimes ambientais poderão ser punidos por ação administrativa, civil e penal. Na área criminal, a legislação diz o seguinte:
Da Poluição e outros Crimes Ambientais
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
* 1º Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.
* 2º Se o crime:
I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
Pena – reclusão, de um a cinco anos.
* 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível

Viomundo – Considerando o número de vítimas humanas, espécimes animais e plantas atingidos, essas penas teriam de ser multiplicadas n vezes?
Rogério Bertani – Com certeza. Além de considerar o número de atingidos, tem de se considerar o tempo que os danos perdurarão. Como a recuperação em alguns casos vão demorar anos, em outros, talvez décadas, é um agravante importante para se definir as penas.

Viomundo – Quando a lei de Crimes Ambientais foi promulgada em 1998, lembro que ela foi muito comemorada pelos ambientalistas.
Rogério Bertani – Realmente, por ser um instrumento que unificava a legislação ambiental dispersa e poderia impedir ou pelo menos diminuir a destruição ambiental, como o tráfico de animais e plantas, desmatamento e poluição, por exemplo. Todas essas ações destrutivas estão intimamente ligadas à qualidade de vida e saúde da população.

Viomundo — Na prática, a minha impressão é que os agentes do Ibama são severos com os pequenos e deixam rolar com os grandes. É isso mesmo?  Por quê?
Rogério Bertani – Veja bem, de novo. Na seção de crimes contra a fauna, a lei considera crime  “Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida“.
Ou seja, qualquer interação com um animal silvestre é qualquer contato, mesmo. Se o agente achar que você está perseguindo, pode multar. Se manusear um animal, qualquer um, dependendo da interpretação do agente, pode ser considerado crime. E isso é para evitar abusos, que realmente ocorrem. E eu concordo integralmente.
Porém, fica aberto às autoridades a interpretação se essas interações devem ser penalizadas. E, aí, também ocorrem abusos.
Tenho visto problemas sérios ocorrerem com pesquisadores, que têm como ofício o trabalho com animais, e com a população em geral.

Viomundo – Que tipo de problemas?
Rogério Bertani – A história de velhinha com papagaio é emblemática. Uma discussão recorrente.
Uma pessoa que tem o seu papagaio há 40 anos, portanto anterior à lei, deve ter seu animal de estimação apreendido e enviado a um local sem condições de recebê-lo? Ou soltá-lo, sem que tenha aprendido a sobreviver na natureza? Ou deve permanecer com o dono, com quem já está habituado?
Tenho um amigo estudante de biologia, que é um grande inimigo do tráfico e profundo conhecedor da fauna e flora. Ele mora num sítio e alguns animais aparecem lá. Acredite. Ele foi multado por colocar na internet fotos em que ele manuseia esses animais. Só que esses animais não estavam em cativeiro, eles simplesmente aparecem lá.
Por outro lado, temos circunstâncias nas quais os danos contra o meio ambiente são muito mais sérios, sem que tenhamos visto punições proporcionais. No caso específico de Mariana, não é um espécime animal ou vegetal que sofreu maltrato ou foi morto, mas todo um ecossistema que foi atingido.
Se uma pessoa matar ou apanhar um animal de espécie que esteja incluída na lista de animais ou plantas ameaçados de extinção as penas são aumentadas. O que dizer então de um evento da magnitude de Mariana, que não deve ter apenas matado animais de espécies ameaçadas de extinção, mas também, como estão afirmando vários especialistas, levado à extinção espécies inteiras?
Nunca vi nada parecido no Brasil. Ou seja, a extinção de espécies e a destruição de um ecossistema por um único evento causado subitamente por ação humana. É como a região ser atingida por um meteorito, ou a explosão de um vulcão. Algo que somente a própria natureza teria poder para fazer.

Viomundo – O senhor acha que os presidentes  da Samarco, Vale e BHP Billiton deveriam ir para a cadeia?
Rogério Bertani — Não  lembro de ler ou ouvir que executivos de alguma grande empresa tenham sido punidos criminalmente no Brasil pela prática de crime ambiental. Assistimos à prisão de madeireiros e garimpeiros, que provocam grandes danos ao meio ambiente. Porém, não vemos nenhum grande empresário sendo algemado pela Polícia Federal.
Se prender um madeireiro é possível, por que não a prisão de grandes empresários  num caso muito muito grave,  inclusive com a perda de vidas humanas? Os presidentes da Samarco, Vale e BHP não podem ficar impunes!

Viomundo – O que a sociedade brasileira tem que exigir nesse caso?
Rogério Bertani — A sociedade brasileira não pode mais se calar diante da arrogância e poder de grandes empresas e da timidez do poder público em enfrentá-las. A Lei de Crimes Ambientais está aí para garantir um meio ambiente ecologicamente equilibrado, como consta na Constituição Federal.
Não pode ser aplicada contra velhinhas que têm papagaios em casa e deixar de processar criminalmente empresários poderosos que destroem todo um ecossistema.

Fonte: VIOMUNDO
____________________________________________________________

Rompimentos de barragens de mineradoras têm se tornado mais graves nas últimas décadas, dizem especialistas


Avanço tecnológico da mineração não tem conseguido reduzir intensidade de eventos como o ocorrido em Mariana (MG); evitar próximo desastre só será possível com melhor regulamentação ambiental da atividade
19/11/2015
Por Rachel Costa,

Foto: Reprodução
Itália, 1985, África do Sul, 1994, e Hungria, 2010. Estas foram as rupturas de barragem de mineradoras mais mortíferas nos últimos 30 anos em países ocidentais. A primeira deixou 268 mortos, a segunda, 17, e a última, 10 vítimas fatais. Em Minas Gerais, o rompimento da barragem de Fundão no último dia 5 em Mariana já fez 11 mortos (quatro deles ainda sem identificação) e outras 12 pessoas seguem desaparecidas. Calcula-se em 62 milhões de metros cúbicos o volume de rejeitos lançados no meio ambiente. Grande parte dele atingindo o Rio Doce, um dos maiores do estado. A chegada ao rio tem causado uma segunda tragédia, com cidades sem água e moradores sem saber o que lhes espera. Governador Valadares, um dos principais municípios abastecido pelo rio, com 278 mil habitantes, decretou estado de calamidade pública desde o dia 10.
Falta água e faltam informações, o que torna difícil calcular a dimensão exata do desastre. A Vale e a BHP, as duas empresas multinacionais por trás da Samarco, companhia responsável pelos reservatórios, terão de desembolsar pelo menos 1 bilhão de reais neste que é um dos maiores desastres ambientais no Brasil e um dos maiores episódios de rompimento de barragem de rejeitos nos últimos 30 anos.
E o grande problema é que o avanço tecnológico da mineração não tem conseguido reduzir a intensidade de eventos desse tipo. Muito pelo contrário, afirma o geofísico David Chambers, doCenter For Science In Public Participation (CSP2) [Centro para a Ciência em Participação Popular, em tradução livre], nos Estados Unidos. Chambers mantém desde 2009 uma base de dados com o registro de problemas em barragens de rejeitos em todo o mundo, cobrindo todo o último século. O que se pode aferir pelos números é que, se a quantidade de eventos diminuiu com o avançar da tecnologia, em contrapartida eles se tornaram muito mais graves e a previsão do cientista é que eles sigam ocorrendo em uma média de um grande desastre a cada ano.

Problema internacional
Na lista mantida por Chambers, o último evento classificado como grave também aconteceu no Brasil: foi a ruptura na barragem de uma mina em Itabirito, em setembro de 2014, deixando três mortos. Entretanto, o pesquisador faz questão de enfatizar que tragédias envolvendo reservatórios não estão limitadas ao país. “Quando divulguei os dados da minha pesquisa, a resposta que recebi da indústria foi de que na América do Norte isso nunca aconteceria. Seis meses depois, houve o rompimento da barragem em Mount Polley, no Canadá”, diz Chambers.
Na tragédia canadense, a maior da história desse tipo no país, não houve mortos, mas 23 milhões de metros cúbicos de rejeitos foram lançados no ambiente, atingindo reservatórios de água da região. Em agosto de 2015, um ano depois do desastre, uma equipe da Anistia Internacionalvoltou à área e encontrou moradores ainda inseguros em relação à qualidade da água, aumento nos níveis dos lagos e muitas dúvidas em relação à possível contaminação dos peixes, uma vez que havia criadores de salmão na área.
“No caso da Imperial Metals, que operava a mina de Mount Polley, eles são uma companhia muito menor, não são um conglomerado internacional”, avalia Chambers. No Canadá, a mina onde ocorreu o desastre voltou a operar neste ano, alegadamente para a companhia ajudar a cobrir os custos ambientais do acidente causado por ela própria. “É diferente do caso brasileiro. Espero que BHP e Vale cubram os custos operacionais envolvidos. Elas são as donas da Samarco”, fala o cientista, enfatizando que usar companhias locais para fazer a exploração é um procedimento comum entre multinacionais e, portanto, não pode ser usado como pretexto para isentá-las de culpa.

Falta de dados
Durante a apuração dessa reportagem, Opera Mundi consultou três cientistas que acompanham desastres provocados por empresas mineradoras. Para todos eles, a falta de dados oficiais é um problema para definir a dimensão exata da tragédia ocorrida em Minas. Até agora, dados sobre a contaminação da água foram divulgados por Governador Valadares e Baixo Guaiú, no Espírito Santo, mostrando altos índices de alumínio, magnésio e arsênio (este último apareceu nas provas capixabas).
Apesar de alarmados com os índices obtidos pelas provas, os cientistas acreditam que o método usado para a coleta não foi o mais adequado. “Neste momento, o que mais importa é testar a contaminação da água”, diz Chambers. “Pelos resultados dos testes já feitos, parece que eles foram realizados sem filtrar os sedimentos”, completa o geofísico, esclarecendo que o risco maior ocorre quando os metais estão dissolvidos na água.
Sem informações exatas, fica ainda mais complicado montar o intrincado quebra-cabeças do impacto ambiental provocado pelo vazamento. Magnésio em excesso na água, por exemplo, pode afetar o desenvolvimento mental das crianças, lembra a geoquímica Kendra Zamzow, também da CSP2. Zamzow acredita que o mais provável no caso brasileiro é que os metais estejam “presos” aos sedimentos, reduzindo o risco de contaminação. Entretanto, outro problema pode ocorrer, este relacionado ao depósito dos rejeitos: a formação de uma espécie de “cimento” no leito do rio, o que pode afetar a vida dos seres vivos presentes nas águas.
“Este caso da Samarco é muito maior que o de Mount Polley. No rompimento da barragem canadense, os rejeitos se espalharam por apenas oito quilômetros. Eles poderiam ter ido mais longe, mas foram parados pelo lago de criação de salmão”, diz a geoquímica Kendra Zamzow, também da CSP2.

Fonte: BRASIL DE FATO
____________________________________________________________

Beatriz Cerqueira: Samarco comanda a apuração do crime que cometeu, controlando políticos, vítimas e jornalistas

publicado em 18 de novembro de 2015 às 15:40
Mariana e Bia Cerqueira
Novos capítulos da tragédia em Mariana

por Beatriz Cerqueira
Após 12 dias do rompimento das duas barragens de rejeitos da Samarco/Vale/BHP, em Mariana, a Assembleia  Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou a primeira audiência pública, em Belo Horizonte, para debater o assunto.
Em tese, seria o momento para que deputados estaduais ouvissem os atingidos pela tragédia e órgãos do governo e de fiscalização colhessem informações para os trabalhos da Comissão Especial recém-criada.
Mas a audiência se transformou na mais demagógica atividade protagonizada por nossos políticos.  Era uma audiência conjunta com a Câmara dos Deputados.  Mas estes, após tirar fotos, dar entrevistas à imprensa e falar primeiro, foram embora.
Tiveram o mesmo comportamento no dia anterior, na cidade de Mariana, durante a audiência da Comissão de Direitos Humanos: falaram, não ouviram ninguém e foram conduzidos pelas mãos bondosas da Samarco para conhecer o local da tragédia.
Na capital mineira, assistimos a uma deprimente reunião conduzida de modo a não ter efeito nenhum, apesar do esforço isolado de alguns deputados comprometidos com os movimentos sociais.
Ouvimos o Ministério Público falar em “acidente” e se vangloriar de um Termo de Ajustamento de Conduta com o qual a mineradora rapidamente concordou para melhorar sua imagem e cujos termos todos desconheciam. Ouvimos também o representante do Governo de Minas dizer que não podemos “satanizar” as mineradoras.
Poucos prestaram atenção quando uma convidada explicou que a empresa errou ao calcular os possíveis impactos do rompimento de barragem, considerando que atingiria apenas o distrito de Bento Rodrigues e não outras dez localidades, além de toda a bacia do Rio Doce.
Poucos se importaram com a fala do representante dos trabalhadores, que denunciou desconhecer as condições a que estão submetidos os 20 trabalhadores que estão na linha de frente da barragem de Germano, que está trincada.
Aliás, quem informou quantos trabalhadores  estavam desaparecidos foi a empresa, livremente, sem qualquer fiscalização, pois ela impede que se tenha acesso à informações detalhadas.
Os deputados não entenderam nada do que o Padre Geraldo disse, de que é preciso respeitar os atingidos, os verdadeiros protagonistas dessa história. Só que, infelizmente, os protagonistas foram os próprios deputados, na maioria preocupados em falar e não em ouvir.
Enquanto isso o povo atingido está nas mãos da Samarco, que atua livremente em Mariana e região.  Onde está o Estado? Ainda não chegou. A Samarco já está presente, contrariando o lamento da deputada desavisada que reclamou da suposta ausência da Samarco. O desconhecimento da realidade leva a equívocos assim.
A Samarco está mais presente do que nunca: demitiu no dia anterior à audiência 90 trabalhadores terceirizados, dos quais muitos já eram vítimas da tragédia, pois suas famílias perderam tudo na lama.
A Samarco controla todo o acesso aos atingidos que estão nos hotéis e pousadas da cidade, impedindo que se organizem livremente.
A Samarco reúne-se com os atingidos sem nenhuma proteção do poder público. Nas horas das infinitas reuniões com a população, não há Ministério Público nem Governo do Estado presentes e os movimentos sociais são impedidos de acompanhar.
A Samarco controla a cena do crime e chega a selecionar quais jornalistas podem entrar. Assim como controla o acesso da população ao Comando de Operações da Defesa Civil e do Corpo de Bombeiros, que funciona dentro da sede da empresa.
Livremente, a Samarco chantageia a cidade de Mariana pelo poder econômico e pelos impactos que a suspensão do seu trabalho na região causará, como se não tivesse que dar assistência à cidade por todos os prejuízos causados.
Pelo que se vê, muita gente já está dando retorno ao investimento que as mineradoras fizeram nas eleições de 2014. Na verdade, quem está pagando esta conta é povo!

Beatriz Cerqueira é presidenta da CUT/MG e coordenadora-geral do Sind-UTE/MG

Fonte: VIOMUNDO
_________________________________________________________

Com avanço tecnológico que se vivencia neste início do século XXI, é inaceitável que barragens se rompam com frequência.

Outro aspecto diz respeito a tecnologia de construção e manutenção de barragens como algo  consagrado e de domínio em todo o mundo, já por algumas décadas.

Mesmo assim, o que deveria ser motivo de segurança para as pessoas se transformou em pânico, com bombas de líquidos, contaminados ou não, prontas para destruírem tudo que encontram pela frente.

A supremacia das finanças e das corporações sobre os governos, aspecto marcante do capitalismo global atual, explica, em grande parte , a ocorrência de tantas tragédias.

Pelo  lucro, para o lucro e com o lucro, as empresas ignoram protocolos de segurança e até mesmo conceitos básicos de engenharia. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário