segunda-feira, 6 de julho de 2015

Ex-presidente da OAB, petista diz que Cunha e Moro rasgam a Constituição

Candidato em 2014, Wadih Damous teve quase 38 mil votos e ficou na suplência, mas saiu do banco de reservas e desembarcou em Brasília para ajudar na reconstrução do PT

Leandro Resende
Rio - O ano está tão difícil para o PT que uma articulação do partido, comandada pelo ex-presidente Lula, tirou Wadih Damous do banco de reservas e lhe garantiu uma vaga na Câmara dos Deputados. Candidato em 2014, ele teve quase 38 mil votos e ficou na suplência, mas desembarcou em Brasília para ajudar na reconstrução do partido. Ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio e da Comissão Estadual da Verdade, o deputado aponta erros do PT, dispara contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o juiz federal Sérgio Moro, responsável pelas investigações da Operação Lava Jato. Para Wadih, os dois estão rasgando a Constituição.

"A oposição é boa para ganhar pesquisa, mas não ganha eleição”, diz deputado
Foto:  Alexandre Vieira / Agência O Dia

ODIA: A Câmara dos Deputados aprovou, na semana passada, a redução da maioridade penal para crimes violentos, menos de 24 horas depois de um texto semelhante ser rejeitado em plenário. Qual sua avaliação?
WADIH: Na primeira noite de votação, a civilização venceu a barbárie. Depois, a barbárie venceu com base no golpe comandado pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha. A Constituição foi violada e está sendo suja por ele, que faz manobras e age como se fosse proprietário do Legislativo.
Está jogando lama na Carta Magna: se ele perdesse, ele ia colocar várias emendas até ganhar. Mas creio que o Senado irá corrigir essa monstruosidade. Espero que essa discussão seja feita sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que é uma lei ordinária. A Constituição deve ser mexida o mínimo possível.

Houve mudança de posição de deputados, determinante para aprovação do novo texto para reduzir a idade penal. Por quê? Houve pressão?
Essas pressões não acontecem à luz do dia. Não ocorreram em público. Não sei se foi num restaurante, no gabinete do presidente... Hoje, na Câmara, não há a menor possibilidade de vencer qualquer votação que o Eduardo Cunha não queira.

Para defender-se das acusações de ‘golpista’, Cunha e seus aliados têm dito que interpretações do regimento não podem ser judicializadas. Esse argumento é plausível?
Quem diz isso ou não sabe o que está dizendo ou age de má-fé. Não há nada acima da Constituição. O que acontece lá é a manipulação do regimento. Enquanto a Câmara estiver com esta presidência, vamos caminhar na mediocridade e tudo o que há de pior vai passar. Estou lá pela primeira vez, mas tenho certeza de que esta é a pior representação da história do Legislativo.

Cunha, teoricamente, faz parte do partido que é a base aliada do governo. E o PT nada conseguiu fazer para evitar sua presidência. Lançou o Arlindo Chinaglia (SP), mas ele foi derrotado. O partido, então, não tem culpa na sua própria insatisfação?
Não tenho elementos para avaliar quem estava certo ou errado. Não estava lá. O PT comete erros. Talvez o partido não tenha entendido o impacto que seria o Eduardo Cunha ali. Talvez tivesse sido melhor apoiar outro candidato, de outro partido, para a presidência da Câmara. Não há nada independente na Casa hoje. A maioria está dominada pelo presidente Cunha. O que se pode fazer é dialogar com movimentos sociais, recorrer ao Supremo Tribunal Federal, como fizemos neste caso da maioridade penal. Esse mal não vai durar para sempre.

Segundo pesquisa Ibope, a presidenta Dilma Rousseff atingiu apenas 9% de aprovação. Há salvação para o governo?
A oposição é boa para ganhar pesquisa, mas não ganha eleição. Dilma ainda tem três anos e meio de governo e pode reverter isso. Agora, não minimizo que esse é o pior quadro já enfrentado desde que o PT chegou ao governo. É um momento muito grave. A economia vai mal, a política vai mal, mas há ainda chances de melhorar. Depende da política econômica, da atitude do governo.

As ‘pedaladas fiscais’, como são chamadas as maquiagens feitas nas contas públicas de 2014 do governo e apontadas pelo Tribunal de Contas da União, podem resultar em impeachment?
A oposição procura uma razão para impeachment desde que acabaram as eleições. As pedaladas foram inventadas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e ninguém nunca falou disso. O PT contribui para esta crise no TCU, porque não acabou com a indicação política e com o apadrinhamento no órgão, por conta de uma suposta base aliada. O PT fez aliança para governar e hoje é subalterno nela.

No fim de junho, o ex-presidente Lula disse que, hoje, o PT só se preocupa com cargos. Concorda com a tese?
Isso acontece com todos os partidos populares que chegam ao governo. O PT percebeu que governar é diferente de ser oposição, que o buraco é mais embaixo, mas se descaracterizou muito. Não tem mais o militante que veste a camisa, vai panfletar.

Acabou o orgulho de ser militante do PT?
O orgulho não foi perdido. Está adormecido. Quando esse militante viu o risco da derrota em 2014, foi para a rua. Não sei como recuperar. Agora, é necessário provar para as pessoas que o ajuste vai melhorar.

Há insatisfação de petistas com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo? Seu nome é incluído no rol dos que estariam criticando o ministro por causa dos rumos da Operação Lava Jato, que investiga o escândalo de corrupção na Petrobras.
Desminto qualquer coisa nesse sentido. Sou amigo do ministro Cardozo. Em qualquer governo, há insatisfeitos. No PT, muitos estão insatisfeitos com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, por exemplo. O problema da Lava Jato não é o Ministério da Justiça e sim o juiz federal Sérgio Moro (responsável pelos processos da Lava Jato em primeira instância).

O que há de errado?
Tudo. Ele age contra a Constituição e estabeleceu a prisão preventiva como padrão e não como exceção. Essa Operação Lava Jato apreendeu arquivos de defesa, coisa que a ditadura militar fez em apenas um caso. Com todas as arbitrariedades, o juiz Sérgio Moro pode estar decretando a nulidade de tudo o que construiu. Juiz não é salvador de nada.

Essas prisões preventivas são feitas com qual objetivo?
Obter delações premiadas, que nada mais é do que o ‘dedo-duro’. O delator é o mau-caráter. Não existe nenhum arrependido. E, quando o juiz aceita a delação, aceita-se o mau-caratismo como prática. Não se sabe se é verdade, mentira, mas só que são pessoas dando depoimentos para amenizar suas penas. E esses delatores estão há meses presos. Falam o que se quer ouvir.

São nessas delações que se baseiam as investigações. Depoimento do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, por exemplo, serviu como mote para que o Superior Tribunal de Justiça investigasse o governador Luiz Fernando Pezão e o ex-governador Sérgio Cabral.
Nenhum está preso, pois não estão sobre a guarda do Sérgio Moro. Que provas esses delatores têm? Eles não as apresentam. Hoje, o fascismo brasileiro não é feito por baionetas, e sim pelos órgãos do Estado, do Judiciário. É um Estado de exceção.

A alta popularidade do juiz Sérgio Moro pode ser comparada àquela obtida pelo ex-presidente do STF Joaquim Barbosa durante o julgamento do Mensalão?
A Constituição é entrave para esse tipo de julgador, que acha que pode sair julgando só porque tem apoio popular. Hitler teve apoio popular. Jesus foi crucificado com apoio popular. As autoridades tem que combater qualquer ilícito, mas não se pode jogar a lei no lixo em nome disso. A ministra do STF Rosa Weber disse durante o julgamento do Mensalão que poderia condenar sem provas. Sabe quem era o assessor penal dela? O juiz Sérgio

A Operação Lava Jato vai chegar ao ex-presidente Lula?
Não sei por que chegaria. Ele seria preso porque incentivou empresas a fazerem negócios no exterior? Então, prendam o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton também. E todos os presidentes que tentaram fazer negócios fora de seu país.

O senhor foi colocado na CPI da Petrobras para tirar o foco do PT?
Participei da segunda sessão na CPI. Ela não substitui a PF, o Judiciário, o MP. Se quiser trabalhar sério, vai aperfeiçoar a lei para punir quem vaza delação premiada, por exemplo. Há na CPI atropelo seletivo da ordem. Tem deputado que ofende o depoente e vai embora
.
Envolto em tantas turbulências, é possível projetar de que forma o partido sairá para disputar as eleições presidenciais de 2018?
Não sei como fica a conjuntura até lá. Não vai ser fácil. Já vai ter eleição no ano que vem, e será um termômetro. O PT está numa situação complicada, é claro que ele vai ter que enfrentar esse quadro. Hoje, quando se tenta chegar ao Lula de qualquer maneira , fica claro de que não querem de jeito algum que ele seja candidato. Se ele disser que não quer ser candidato, vão parar de pegar no pé dele: enfrentá-lo no voto não é algo que está a altura do senador Aécio Neves (PSDB-MG) e do governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB).

Num cenário melhor que o atual, então, o partido fecha questão em torno do nome dele.
Fecha. Infelizmente, a única liderança nacional que o PT tem é o Lula. Deveria aproveitar, aliás, para forjar novas lideranças agora, pois não existem líderes que surjam em bons momentos, só em crises. Seria bom que o PT tivesse outras alternativas.

O que se comenta, também, é de uma possibilidade de composição futura do Lula com o prefeito do Rio Eduardo Paes (PMDB). Eles são bem próximos.
O ex-presidente tem grande estima pelo Eduardo Paes. A despeito de qualquer restrição ao Paes, trata-se de uma liderança. Se o prefeito assumisse determinadas bandeiras, com um governo hegemonizado pelo PT... Há resistências no partido, mas ainda falta muito tempo para as eleições.

Para 2016, prevê-se novamente um desembarque de petistas insatisfeitos com a aliança com o PMDB no Rio na candidatura do deputado estadual Marcelo Freixo (Psol). De que lado o senhor ficará?
O PT, por mais atormentado que esteja, precisa pensar em ter uma candidatura própria. Escolher entre o Pedro Paulo (PMDB) e o Freixo não conta com minha simpatia. Devemos apostar sem prejuízos em um candidato com as tradições do partido.

Fonte: O DIA
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Casuísmos, bonapartismo e avacalhação

Por Alberto Dines em 07/07/2015 na edição 858
 
Assembleias ou parlamentos costumam adotar liturgias apropriadas ao ato de criar, recriar ou excluir dispositivos da Lei Maior. Não necessariamente pomposos, porém minimamente decorosos tais ritos se impõem em circunstâncias semelhantes às atuais, quando os representantes do povo se dispõem votar um rol de emendas a uma Constituição adotada democraticamente há mais de um quarto de século, depois de duas décadas de uma brutal ditadura.
O volume, a velocidade e a dimensão das reformas propostas pelo presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, confere ao plenário da casa uma aparência de Constituinte que a indecorosa farra legiferante converte em paródia.
O descaso em preservar qualquer traço simbólico ou litúrgico, o atabalhoamento da pauta, a ausência de um master-plan e os sucessivos atropelos adotados pelo parlamentar fluminense na condução das votações conferem ao atual momento político uma indisfarçável aparência de casuísmo e oportunismo. Se o pacote de reformas pretende o aperfeiçoamento do Estado de Direito democrático, a patuscada que é oferecida desde a Praça dos Três Poderes em Brasília chega com forte e inequívoca conotação voluntarista, cesarista, bonapartista e, principalmente, caudilhesca.
A incrível reviravolta propiciada pela geminação de votações com apenas 24 horas de diferença tornou quase secundária a questão da maioridade penal. O debate mudou de foco drasticamente deixando de lado uma controvérsia que absorve as atenções e interesses de grande parte da sociedade e descambou para a vala comum das manobras duvidosas e pedaladas legais.
É possível que o presidente Eduardo Cunha tenha razão em gabar-se de sua expertise em matéria regimental, mas o seu notório descaso com os instrumentos legais complementares faz dele um político ególatra mais preocupado em ganhar votações do que um legislador empenhado em buscar soluções justas e equilibradas. Qualquer que seja a idade adotada para tornar imputável um jovem infrator a emenda exige ajustes simultâneos no Estatuto da Criança e do Adolescente e em códigos correlatos. Isolada, funcionará inevitavelmente ao contrário.
A atabalhoada reforma política concebida por Eduardo Cunha é outro casuísmo engendrado por seu febril temperamento, verdadeira colcha de retalhos, irregular e contraditória. Para ser emendado e liberado dos atuais vícios e deformações, o processo politico-eleitoral exige um conjunto multidisciplinar, integrado, holista. O fim da reeleição não pode ser decretado por capricho, sem um minucioso estudo preliminar sobre a extensão de mandatos, função dos pleitos intermediários, equilíbrio entre os poderes, etc.
Em novembro passado, o ex-presidente José Sarney ofereceu em artigo um surpreendente mea-culpa combinado com um testamento político. Harmonizou com excepcional poder de síntese sua experiência de operador político em diversos regimes, abdicou de planos e projetos pessoais.
O deputado e correligionário passou os olhos pelo documento, mas não enxergou um dado fundamental: Sarney pendurava as chuteiras. Cunha, ao contrário, pretende coroar-se como coronel.

Fonte: OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA
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