terça-feira, 5 de maio de 2015

O Poeta e o Sociólogo

Resposta Ao Funk Ostentação



Edu Krieger



                      Você ostenta o que não tem

                      Pra tentar parecer mais feliz

                      Mas não sabe que pra ser alguém

                      Tem que agir ao contrário do que você diz

                      Você pensa que tem liberdade

                      Exibindo riqueza e poder

                      Mas não vê que na realidade

                      O sistema é que lucra usando você




                      E o sistema tem a cor

                      Do racismo e da escravidão

                      Cada vez que você dá valor

                     À roupinha de marca e à ostentação

                     A elite burguesa e branca

                     Que é dona das lojas de grife

                     Se dá bem, pois você bota banca

                     Mas é o sistema que aumenta o cacife



                    Clipe norte-americano

                    De artista que faz hip hop

                    Você quer imitar por engano

                    Pensando que assim vai ganhar mais ibope

                    É a regra do capitalismo

                    Eles querem que a gente consuma

                    Pra vivermos à beira do abismo

                    A gente pra eles é porra nenhuma



                   Você pensa que é modelo

                   Pras crianças da comunidade

                   Sinto muito, mas devo dizê-lo

                   Que o que você faz é uma puta maldade

                   Se o moleque não tem condição

                   De entrar nesse mundo grã-fino

                   Isso pode virar frustração

                   E você vai foder com o pobre menino



                  Que pra ter um tênis foda

                  Pode até assaltar um playboy

                  Pois se fica excluído da moda

                  Recebe desprezo e isso lhe dói

                  E as mulheres que dão atenção

                 Que te cobrem de beijo e afeto

                 Valem menos do que seu cordão

                 Pois você trata elas pior que objeto



                Quem batalha pra viver

                E botar a comida na mesa

                De repente te vê na TV

                Dirigindo carrão e exibindo riqueza

                Ostentando pra ter atenção

                E achando que isso é maneiro

                Sem saber que essa ostentação

                Faz o branco do banco ganhar mais dinheiro



               Negro tem que ter poder

               Negro tem que ser protagonista

               Tem que estar no jornal, na TV

               No outdoor e na capa de toda revista

               Mas não tem a menor coerência

               Ostentar um anel de brilhante

               Isso só vai gerar violência

               Inveja e recalque no seu semelhante



              Que legal sua conquista

              Sua história de vida também

              Mas seu papo é tão consumista

             Que faz de você um artista refém

             Dessa pose fajuta e falida

             Que só finge aumentar autoestima

             Infeliz de quem sobe na vida

             E não sabe o que faz quando chega lá em cima

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Vencer a batalha das ideias

Os governos de esquerda têm que enfrentar o elemento de maior força do neoliberalismo: sua força ideológica do 'modo de vida norte-americano.'


por Emir Sader em 05/05/2015 às 06:14



Emir Sader
“E quando, finalmente, a esquerda chegou ao governo, tinha perdido a batalha das ideias.”A afirmação de Perry Anderson sintetiza o maior desafio para os que queremos superar e substituir o neoliberalismo em todas suas dimensões.

Significa que o neoliberalismo fracassou como proposta econômica, o que abre a possibilidade para que a esquerda apareça como alternativa de governo. Quando chega ao governo, tem que enfrentar toda a herança maldita do neoliberalismo: recesso, enfraquecimento do Estado, desindustrialização, fragmentação social, entre outras coisas.

Mas, além disso, tem que enfrentar o elemento de maior força do neoliberalismo, a nível de cada pais, mas também a nível internacional: sua força ideológica, a força do “modo de vida norte-americano”, que impõe sua hegemonia de forma quase inquestionada em escala global.

O estilo de consumo shopping center se globalizou de maneira aparentemente avassaladora. É uma espécie de ponta de lança do neoliberalismo, materializando seu principio geral, de que tudo é mercadoria, tudo tem preço, tudo se vende, tudo se compra. Por isso o shopping center é o exemplo mais claro do que se convencionou chamar de “não lugares”.

O shopping costuma não ter nem janela, nem relógio. Entrar em um desses espaços é se desvincular das condições de vida nas cidades como efetivamente existem, para se articular com a rede de consumo globalizada, mediante às marcas e seu estilo de consumo. Com o conjunto de “vantagens” que traz o shopping center -  proteção do mal tempo, do roubo, com lugar para estacionar, com grande quantidade de cinemas, de lugares para comer, além da diversidade de marcas, todas globalizadas – representa um instrumento poderoso de formas de vida, de sociabilidade, construídas em torno do consumo e dos consumidores.

O shopping center é a utopia neoliberal e expressa, da forma mais acabada – junto com a publicidade, as marcas, a televisão e o cinema norte-americanos, entre outros instrumentos – a hegemonia do modo de vida norteamericano. Lugar que ocupa praticamente sem questionamentos, salvo resistências do islamismo ou dos evangélicos.

A luta antineoliberal conseguiu impor consensos no plano econômico contra a centralidade do mercado, a favor da prioridade das políticas sociais, por exemplo. Mas não gerou ainda valores, formas de sociabilidade, alternativas ao neoliberalismo e a seu mundo de valores mercantilizados. É certo que há mecanismos monstruosos de promoção dos valores neoliberais, mas também é certo que não temos valores alternativos – solidários, humanistas – que apareçam como alternativas.

As politicas sociais dos governos pós-neoliberais tem um caráter solidário e humanista, mas não fomos capazes de traduzi-las em formas de sociabilidade, em valores, alternativos ao egoísmo consumista do neoliberalismo.

Não se pode simplesmente incorporar propostas anti-consumistas, em sociedade em que o acesso ao consumo é uma conquista para a grande maioria da população. Acesso que traz, junto, as vantagens do consumo e, por extensão, promove o mundo do consumo – incluído o shopping center – como um objetivo de vida. Assim, não se trata de uma batalha simples. Mas é indispensável para a construção de um mundo solidário e humanista.

Sem a critica do egoísmo consumista dominante, da falta de solidariedade – especialmente com os mais frágeis -, não conseguiremos avançar contra a forte hegemonia ideológica do neoliberalismo e ganhar a decisiva batalha das ideias, decisiva nos enfrentamentos centrais do mundo de hoje.

Fonte: CARTA MAIOR
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Dois estilos e a mesma crítica, profunda e precisa.

Edu Krieger, cantor,compositor e instrumentista  não faz o tipo celebridade e no entanto é considerado um dos melhores nomes na cena musical da atualidade.

A canção acima ,certamente , não é muito divulgada nas emissoras de rádio e de TV.

A batalha das idéias, citada pelo sociólogo Emir Sader, em todas as suas expressões.

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