terça-feira, 7 de abril de 2015

Amnésia no PIG

O Brasil que não enxerga o seu lugar

Em 2010, a velha mídia tentou demonstrar que o governo havia cometido uma petulância em negociar com o Irã. Hoje teriam de reconhecer que Lula acertou


Há cinco anos, em maio de 2010, o Brasil subverteu a hierarquia mundial e se uniu à Turquia para firmar com o Irã, no dia 17 daquele mês, a Declaração de Teerã. Era o desfecho bem sucedido de uma intensa negociação para superar o impasse gerado pela determinação iraniana de dispor de urânio enriquecido para fins pacíficos, e o veto israelense-americano às pesquisas, que levariam, segundo esse ponto de vista, à bomba atômica.EBC

A negociação consistiu em estabelecer salvaguardas de controle sobre o urânio enriquecido, de modo a assegurar o direito iraniano à pesquisa e impedir o uso bélico desse material.

O veto dos EUA pôs a perder os esforços do Itamaraty e a mídia local festejou o ‘fracasso de Lula’ em criar um espaço de confiança e cooperação para abafar os tambores da guerra no Oriente Médio.

A torcida contra da mídia, algo grotesca, tinha objetivo claro: impedir que o governo Lula levasse mais esse trunfo ao escrutínio eleitoral que decidiria a sucessão entre o tucano José Serra e a então ministra Dilma Rousseff, meses depois.

Um gigantesco esforço de ‘jornalismo isento’ foi feito então, em parceria com a nafitalina tucana egressa do Itamaraty, para demonstrar que o governo Lula havia cometido uma petulância e deveria voltar aos trilhos. Talvez fosse melhor dizer à canga, renunciando a uma política externa de soberania frente à Casa Branca.

Na semana passada, após cinco anos de cerco e restrições impostas à população iraniana, levando a um aumento da tensão bélica na região, o governo Obama fechou um acordo com Teerã baseado exatamente no principal alicerce da Declaração de maio de 2010: a confiança ancorada em regras de transparência para conciliar o uso pacífico da energia nuclear à segurança anti-armamentista.

À exceção de um jornalista –Clóvis Rossi--  a mídia isenta declinou de reconhecer o acerto do pioneirismo brasileiro escarnecido na época como mais um sinal de que sob o governo do PT, o Brasil perdera o senso do seu lugar no mundo.

À época, Carta Maior publicou uma análise de José Luís Fiori que reverbera sua atualidade num momento em que o jogral midiático tenta, de novo, criar um consenso de que o Brasil é um esférico fracasso econômico. E deveria voltar aos trilhos do neoliberalismo pelo bem ou pelo golpe.

Nada como o tempo. Leiam a seguir o artigo de Fiori.

Um acordo e seis verdades:

“A mediação bem sucedida de Lula com o Irã alçaria Brasil no cenário mundial.”
O Globo, domingo, 16 de maio de 2010, p:38

Na terça feira, 18 de maio de 2010, foi assinado o Acordo Nuclear entre o Brasil, a Turquia e o Irã, que dispensa maiores apresentações. E como é sabido, quarenta e oito horas depois da assinatura do Acordo, os Estados Unidos propuseram ao Conselho de Segurança da ONU, uma nova rodada de sanções ao Irã, junto com a Inglaterra, França e Alemanha, e com o apoio discreto da China e da Rússia. Apesar da rapidez dos acontecimentos, já é possível decantar algumas verdades no meio da confusão:

1. A iniciativa diplomática do Brasil e da Turquia não foi uma “rebelião da periferia”, nem foi um desafio aberto ao poder americano. Neste momento, os dois países são membros não permanentes do Conselho de Segurança da ONU, e desde o início contaram com o apoio e o estímulo de todos dos seus cinco membros permanentes. Além disto, a diplomacia brasileira e turca manteve contato permanente com os governos destes países durante todo o processo das negociações. A Turquia pertence a OTAN, e abriga em seu território armas atômicas norte-americanas. E o presidente Lula recebeu carta de estímulo do presidente Barack Obama, duas semanas antes da assinatura da visita de Lula, e a Secretária de Estado norte-americana declarou – na véspera do Acordo - que se tratava da “última esperança” de solucionar de forma diplomática a “questão nuclear iraniana”.

2. O que provocou surpresa e irritação em alguns setores, portanto, não foram as negociações, nem os termos do acordo final, que já eram conhecidos. Foi o sucesso do presidente brasileiro que todos consideravam impossível ou muito improvável. Sua mediação viabilizou o acordo, e ao mesmo tempo descalçou a proposta de sanções articulada pela Secretaria de Estado norte-americana depois de sucessivas concessões à Rússia e à China. E alem disto, criou uma nova realidade que agora já escapou ao controle dos Estados Unidos e seus aliados, e também do Brasil e da Turquia.

3. A reação americana contra o Acordo foi rápida e ágil, mas o preço que os Estados Unidos pagarão pela sua posição contra esta iniciativa pacifista será muito alto. Perdem autoridade moral dentro das Nações Unidas e perdem credibilidade entre seus aliados do Oriente Médio, com a exceção de Israel, por razões óbvias. E já agora, passe o que passe, o Brasil e a Turquia serão uma referência ética e pacifista, em todos os desdobramentos futuros deste contencioso.

4. Existe consenso que a estrutura de governança mundial estabelecida depois da II Guerra Mundial, e reformulada depois do fim da Guerra Fria, já não corresponde à configuração do poder mundial. Está em curso uma mudança na distribuição dos recursos do poder global, mas não se trata de um processo automático, e dependerá muito da capacidade estratégica e da ousadia dos governos envolvidos neste processo de transformação. O Oriente Médio faz parte da zona de segurança e interesse imediato da Turquia, mas no caso do Brasil, foi a primeira vez que interveio numa negociação longe de sua zona imediata de interesse regional, envolvendo uma agenda nuclear, e todas as grandes potências do mundo. A mensagem foi clara: o Brasil quer ser uma potencia global e usará sua influencia para ajudar a moldar o mundo, além de suas fronteiras. E o sucesso do Acordo já consagrou uma nova posição de autonomia do Brasil, com relação aos Estados Unidos, Inglaterra e França, e também, com relação aos países do BRIC.

5. O Acordo seguirá sendo a melhor chance para prevenir um conflito militar em todo o Oriente Médio. As sanções em discussão são fracas, já foram diluídas, não são totalmente obrigatórias, e não atingirão a capacidade de resistência iraniana. Pelo contrário, se foram aprovadas e aplicadas, liberarão automaticamente o governo do Irã de qualquer controle ou restrição, diminuirão o controle norte-americana e da AIEA e acelerarão o programa nuclear iraniano, e aumentarão a probabilidade de um ataque israelense. Porque os Estados Unidos já estão envolvidos em duas guerras, e não é provável que a OTAN assuma diretamente esta nova frente de batalha, a despeito do anti-islamismo militante, dos atuais governos de direita, da Alemanha, França e Itália.

6. Por fim, o jornal O Globo foi quem acertou em cheio, ao prever - com perfeita lucidez - na véspera do Acordo, que o sucesso da mediação do presidente Lula com o Irã projetaria o Brasil, definitivamente, no cenário mundial. O que de fato aconteceu, estabelecendo uma descontinuidade definitiva com relação à política externa do governo FHC, que foi, ao mesmo tempo, provinciana e deslumbrada, e submissa aos juízos e decisões estratégicas das grandes potências. 

Fonte: CARTA MAIOR
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Lembro que na ocasião, em 2010, alguns especialistas da velha mídia repetiam que Lula era ingênuo, inocente, em questões com as quais o governo brasileiro se envolveu.

Tais declarações dos especialistas mídiaticos nada mais eram que repetições da declaração da então secretária de estado dos EUA, Hilary Clinton, de que Lula seria bem intencionado, mas estaria sendo enganado pelo presidente do Irã. 
Hoje, os mesmos especialistas não falam nada.

Talvez sofram de amnésia de um passado próximo, estando as lembranças de um passado distante bem preservadas, haja visto os movimentos golpistas em curso.

Eita turma grotesca e escrota , esse pessoal da velha mídia.

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