domingo, 18 de janeiro de 2015

Ricos, famosos, idiotas e vazios

E se em vez dos pobres o alvo do esculacho fossem os ricos? 

Por Nathali Macedo

Lots of money
Lots of money
Todo rico tem alguma coisa da qual se orgulhar, seja real ou imaginária. O rico mantém uma obrigação de ser impreterivelmente melhor que todo mundo, inclusive que os outros ricos (porque melhor que os pobres ele já se considera, mesmo que não tenha um pingo de educação e bom senso).
O rico adora bajular os filhos, não importa o quão ruins eles sejam. O garoto é viciado em cocoaína e vai à faculdade uma vez por semana, mas a mãe faz questão de gritar, a plenos pulmões, pra toda e qualquer pessoa que se aproxime (especialmente para aquelas que não estão interessadas em ouví-la): “Ele vai se formar em medicina!”
Mesmo que o garoto faça racha com o carro do papai, passe as noitadas pedindo “a bebida que pisca” e agregando valor aos camarotes da vida, não saiba absolutamente nada sobre qualquer assunto (exceto sobre como gastar dinheiro), ele é um garoto de ouro, porque ter um garoto de ouro na família é sensacional.
Porque, para o rico, o importante é ser bem visto. É patético como ele vive em um teatro vinte e quatro horas por dia: ele sabe que o filho é um viciado, a filha é uma mimada burra e sem personalidade, o casamento vai mal e a família está em crise – e todas as outras pessoas ao redor também o sabem – mas passar a imagem de que tem uma vida perfeita é sua prioridade absoluta. Eles fingem que são felizes e os outros ricos infelizes fingem que acreditam.
Por isso o rico – especialmente aquele à beira da falência – não aceita não poder ter alguma coisa que o outro rico tem. É quase uma ofensa pessoal. Então, a mulher rica que é um pouco menos rica que a melhor amiga tem que ter uma jóia tão valiosa quanto a dela, mesmo que a reforma na casa seja adiada ou que precise parcelar. O rico precisa comprar um carro do ano para que continue se sentindo rico, mesmo que seu carro esteja funcionando perfeitamente.
O rico tem um discurso antidrogas patético. “Maconheiro” é a maior das ofensas para o rico, que dorme com uísque cawboy e acorda com rivotril – por isso rico é o bicho mais hipócrita que eu conheço. E adivinha quem são os maconheiros? Os universitários, os professores revolucionários, os “vândalos que destroem o patrimônio alheio”. O filho viciado em cocaína, ao contrário, é um cidadão de bem. E esse discurso – assim como todos os outros igualmente patéticos – não tem qualquer embasamento teórico. Por isso para um rico, todas as drogas têm igual efeito (menos as drogas lícitas, é claro): o de tornar as pessoas indesejáveis. E só.
Uma cultura incompreensível da classe A é a de ser mal-educado. Parece que você só faz parte efetivamente do distinto grupo das pessoas ricas se você desprezar o pobre e tudo o que lhe diz respeito, arrotar aos quatro ventos que você é melhor que o outro. Por isso aqueles filhos de ricos que resolvem fazer de conta que não se consideram melhores do que os outros – e são eventualmente de esquerda pra disfarçar o nojento ódio de classe impregnado em seus poros – são os garotos-problema das famílias ricas. Perdoa-se o filho usuário de cocaína, o que faz racha com o carro do papai, o que engravida a filha da empregada e viaja pra fora do Brasil pra não assumir – mas o que se mistura com os pobres é quase sempre renegado. “Vamos, tesouro, não se misture com essa gentalha!”
E, para a minha diversão, o filho do rico persiste naquele comportamento que irrita seus pais só pra se divertir um pouco naquela vida monótona em que nada mais é novidade. Alguém me traz uma pipoca?
O rico faz questão de parecer abastado culturalmente, mas em geral não o é. Preferiu fazer três viagens para a Disney do que conhecer os museus europeus ou as belezas naturais do Brasil. Diz que fala quatro línguas mas provavelmente não entende sequer a língua portuguesa e, geralmente, não se pode conversar com um rico sobre a situação política do país porque ele só sabe falar sobre corrupção. “São todos corruptos” é o seu bordão predileto para esconder a sua completa ignorância política.
O rico vai ao cinema assistir filmes hollywoodianos e reproduz as críticas cinematográficas que lê na internet para parecer inteligente, mas não faz idéia de quem seja Quentin Tarantino – e, quando faz, exclama agudamente: “Um horror, tem muito sangue! Por isso não gosto.”
Como todo bom perfeccionista, o rico precisa estar impecável em todos os momentos da vida. Botox, dieta dunkan, drenagem linfática, implante capilar e cirurgia íntima: Tudo precisa estar perfeito. E o mais curioso é que, em geral, eles permanecem feios mesmo depois de gastarem rios de dinheiro. Só que feios com a cara esticada e sem manchas.
O rico é aficionado por ostentação – mesmo que negue categoricamente, porque, para ele, ostentar é coisa de pobre que ouve rap. Ele acha ridículos aqueles clips em que os rappars jogam dinheiro pro ar e passeiam em carros rebaixados, mas acham o máximo contar para todo mundo que gastaram meio milhão de reais na festa de casamento do sobrinho ou que passaram férias na Europa. Ah, antes que eu esqueça, as fotos dos ricos nas redes sociais são sempre em alguma viagem internacional que fizeram: afinal, todos devem saber que eles são ricos e viajam para fora do país.
Pode ser uma foto em frente à torre Eiffel, ou na neve com uma toquinha de frio charmosa, ou em frente a um teleférico ou em um café francês. O importante é que a foto não tenha sido tirada em território brasileiro, porque até ser brasileiro é coisa de pobre pra ele. E por isso mesmo o rico adora tudo o que é internacional: perfumes, viagens, bebidas, línguas, pessoas.
E por isso mesmo ele adora expressões em línguas estrangeiras. Legendas em inglês, tatuagens em inglês e até conversas em inglês. Expressões francesas, costumes gringos, tudo isso é absolutamente chique para o rico. O zelador vira “Concierge”, a mercearia vira “delicatéssen”, o motorista vira Chofer, o cardápio vira Menu. Porque o rico, na verdade, despreza totalmente o português porque, se é de fora do país, é claro que é de bom gosto.
E o principal: o rico adora ser manchete, por isso alguns talvez amem esse texto, mas saiam por aí dizendo: “eu vejo como uma inveja!”
Realmente. Como são felizes. Babo de inveja.
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Nathali Macedo
Sobre o Autor
Atriz por vocação, escritora por amor e feminista em tempo integral. Adora rir de si mesma e costuma se dar ao luxo de passar os domingos de pijama vendo desenho animado. Apesar de tirar fotos olhando por cima do ombro, garante que é a simplicidade em pessoa. No mais, nunca foi santa. Escreve sobre tudo em: facebook.com/escritosnathalimacedo

Fonte:  DIÁRIO DO CENTRO DO MUNDO
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Um belo texto.

Da década de 1990 - quando o capitalismo supostamente triunfou - até os dias atuais, os ricos resolveram sair de seus esconderijos.

' Se sou rico  mereço toda visibilidade ', foi a máxima que passou a dominar a cena nacional desde então.

Como a internete ainda engatinhava, a solução para ser conhecido eram  os programas  de TV's e revistas semanais.

Ser rico ganhou um significado ainda maior após a queda do muro de Berlim, algo como ser alguém de extrema importância, até mesmo muito culto, mesmo sendo um ignorante, como eram e são de fato todos aqueles  que seguem a máxima.

Com isso, os eventos balados passavam a ser frequentados por socialites, jogadores de futebol, traficantes da moda, empresários , artistas de TV e outros, que juntos compunham a nova classe dos  ricos e famosos.

O surgimento da revista Caras turbinou ainda mais  nos ricos a obsessão pela visibilidade, o que o artista Ziraldo , na época, chamou de " uma enorme necessidade de evasão da privacidade".

De fato , tanto que muitos ricos, novos e velhos, faziam de tudo para ter um espaço ao sol, já que como ricos eram importantes, e como tal deveriam aparecer em alguma mídia.

Fazia-se de tudo para poder aparecer na Caras, e até mesmo um reforma no banheiro da casa era motivo para uma reportagem, onde o rico prestava informações detalhadas sobre o novo banheiro, sempre com um sorriso de felicidade e muita desenvoltura nas detalhadas informações prestadas à reportagem. Também informava, com uma riqueza de detalhes impressionante, como seria sua performance na ocupação do espaço e na utilização de utensílios e equipamentos.
Outra artimanha usada pelos ricos para justificar a visibilidade , eram as cirurgias, em que surgiam sempre mais jovens, alegres e repletos de detalhes sobre os procedimentos.

Muitos ricos também se aproveitavam do carnaval, mais precisamente o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro transmitido pela TV globo ( o objeto de desejo de todo rico ) para aparecer diante das câmeras, pois sabiam que teriam alguns momentos de visibilidade, fosse desfilando em uma escola no alto de um carro alegórico como destaque, ou mesmo circulando nos camarotes da passarela do samba Darcy Ribeiro, onde poderiam inclusive mostrar suas novas jóias.

A senha foi dada com a vinheta da TV globo para o carnaval, e os ricos correram para aproveitar;
" na tela da TV no meio desse povo, a gente vai se ver na globo "

Obviamente, e não poderia ser diferente, esse movimento exacerbou a mediocridade na cena brasileira  no tocante a visibilidade dos ricos, principalmente os novos ricos, afoitos pela visibilidade midiática que justificaria a importância que todos julgavam merecer.

O surgimento da internete, fez por diluir nos ricos  a obsessão pelas revistas e emissoras de TV, já que a rede de computadores ganhava espaço e permitia todo tipo de  demonstração , fossem em viagens de férias ou mesmo nos espaços das residências, como pode-se ver nos dias atuais. 

Como bem observado no artigo acima, a cultura foi relegada e expressões de violência e arrogância passaram a ditar a norma "culta" na sociedade.

De certa forma esse comportamento dos ricos é um reflexo da situação do mundo, onde governos foram capturados pelo sistema financeiro, os estados tidos como desnecessários e o darwinismo social torna-se uma realidade.

O resultado de tudo isso, se percebe claramente no estágio de decadência da cultura ocidental.

Como hoje é domingo, muitos ricos devem estar praticando stand up paddle,  a jangada chic.

Ontem, sábado, foi o dia dos ricos demonstrarem felicidade, como seu comportamento estranho pelas ruas de Ipanema e Leblon.

Já, os pobres, ahhhh, esses são felizes , não representam.

A respeito dos ricos, vale a leitura do artigo abaixo do PAPIRO, publicado em 18 de Junho de 2012.

Diz muito sobre todos, mas principalmente os ricos, crianças e de pouca maturidade, infelizes com a imensa quantidade de bens que possuem.




segunda-feira, 18 de junho de 2012


Encontros Cariocas - 5
Crianças & Sábados


  

Hoje não tem escola.

Não tem aula nem bronca, não tem prova nem cola.

Hoje é dia de brincadeiras com os amigos do bairro, do condomínio.

Hoje é dia de diversão, andar de bicicleta, jogar futebol, virtual , de campo ou de salão

.Hoje é o dia que as crianças esperam, por dias, cinco dias, para fazer o que mais gostam, durante todo o dia

Hoje é sábado.

O sábado não é um dia qualquer, é o mais esperado, desejado, festejado.

É um dia de encontros, com outros, com os próprios desejos, com o ideal que se deseja.

As manhãs de sábado , aqui em Ipanema, ou em outros lugares como Saquarema, Itapema, Guararema, Diadema, são sempre manhãs de sábado.

Manhãs estendidas até a metade do dia, afinal sábado não é apenas mais um dia.

Inevitável não sair às ruas, enquanto as crianças brincam.

Momento de rever os "amigos" do bairro", que nunca cumprimentamos, mas que conhecemos por décadas.

Referências mútuas, insumos para assuntos de vidas enfadonhas

Em sociedades em que o trabalho significa apenas uma forma de ganhar a vida, as manhãs de sábado são válvulas de escape.

A maioria aguarda, por dias, cinco dias, pelo dia sem obrigações, sem bronca do chefe, sem cartão de ponto.

Caminhando por Ipanema, mas poderia ser Diadema, Itapema, Saquarema vou revendo os "amigos".

Alguns posso avistar ainda à distância, anunciando um cruzamento pelo passeio.

Logo que sou identificado , a expressão do "amigo" muda.

Olha em direção ao chão, como se estivesse verificando algo nos pés, quando na realidade busca referências internas sobre mim para que possa rearrumar o rosto, e ter a expressão correta para o cruzamento inevitável.

Ao cruzar comigo, os rostos falam no cumprimento mudo, entre "amigos" de décadas que nunca se cumprimentaram mas que dizem tudo o que pesam um do outro, sem saber que a verdade foi dita pelo susto , expresso na face, ao avistar o "amigo"

Avisto um colega com quem trabalhei em uma empresa, há alguns anos.

Estrangeiro, viveu dez anos na cidade, em Ipanema e voltou para seu país.

Certamente estava de férias.

Seu caminhar, pelo calçadão da praia, demonstrava segurança, satisfação, revelando , para ele e outros atentos, conhecimento da cidade, dos hábitos, das esquisitices das pessoas.

Fazemos o mesmo quando visitamos cidades em que já conhecemos.

Sábado é um dia fantástico,para as crianças e adultos.

É no sábado, por exemplo, que se vai comprar aquilo que se viu em um "amigo", ou "amiga", no sábado anterior e que foi motivo de longas conversas na família, entre crianças, adultos.

Na sociedade do consumo turbinado e insustentável, sábado é o dia do consumo.

Consumo de bens, a maioria dispensável, consumo de referências, necessidade de pertencimento, do bairro , da cidade de ser igual entre os "amigos" que se conhecem há décadas.

As crianças, entre amigos, brincam com seus brinquedos.

Os adultos , homens na maioria, levam seus carros para lavagem em um posto de combustível.

Sim, o sábado é o dia nacional da lavagem de carros.

Muitos ficam horas nos postos de combustível aguardando pacientemente o momento em que seus carros serão tocados por mãos estranhas, ameaçadoras, descuidadas, perigosas e, que por isso , devem ser observados atentamente até o momento final, quando o veículo, com um brilho diamantino, é devolvido para o êxtase de seus proprietários.

No meu caminhar, na manhã de sábado em Ipanema, que poderia ser em Saquarema, Diadema, Itapema, avisto um grupo , umas quatro pessoas, todos homens, parados na calçada em descontraída conversa.

Reconheço um dos participantes, com quem mantive contatos em situações profissionais.

Ao me reconhecer, sua expressão de sorriso vai diminuindo, fora flagrado em descontração, sua boca se contrai, necessário uma nova face para o encontro repentino, mesmo que mudo, apenas um cumprimento com movimentos de rostos.


Sábado é o dia do consumo.
 

Consumo que na sociedade de consumo se transformou em um valor em si.

Consumo que é estimulado para adultos e crianças.

Crianças que pedem aos pais e ganham seus brinquedos e, a medida que crescem, descartam alguns, e partem para outros.

Adultos que tem no consumo uma válvula para amenizar angústias, sofrimentos, vazios existenciais, que logo voltarão para mais consumo, pequenos momentos de felicidade, com a novidade.

Na sociedade de consumo de crescimento ilimitado, de bens descartáveis que cada vez duram menos, onde o valor do conhecimento não é um valor, o vazio existencial impera.

No momento em que a conferência da ONU discute a sustentabilidade, o modelo de consumo é insustentável para o planeta, e o consumo como valor não sustenta as pessoas, não garante felicidade.

A sustentabilidade, assim compreendida, é muito mais que a preservação dos recursos naturais do planeta.

O sábado, também, é o dia da insustentabilidade.

As crianças brincando, inevitavelmente, nos levam ao pensamento de Nietzsche;
 

" Maturidade é quando atingimos a seriedade, o comprometimento, a dedicação, a transparência, a sinceridade das crianças quando brincam"

Hoje é sábado , aqui em Ipanema, em outra cidade grande ou pequena,ou em outra localidade agitada ou serena, que pensa em momento de reflexão sobre sustentabilidade, que a vida apenas pelo consumo não vale a pena.

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