quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Democratizar o futebol brasileiro




Ontem ao final de mais uma tarde que desaparecia rapidamente assim como a queda de um viaduto, como diz o poeta, liguei meu jurássico e atual  radinho de pilha e tive uma grata surpresa.

No horário de inúmeros, cansativos e  repetitivos programas esportivos fui surpreendido com uma entrevista do treinador de futebol, Cristóvão Borges, na rádio CBN, do grupo globo
.
Ao ouvir a chamada para entrevista do treinador, mantive sintonizado na emissora mais pelo fato de ser o treinador do meu tricolor, do que propriamente por ouvir alguma novidade nesse universo enfadonho e rasteiro de nossa imprensa esportiva.

Imaginei que Cristóvão falaria sobre o próximo jogo do Fluminense e sobre o bom momento do time no campeonato brasileiro.

Nada disso.

Cristóvão falou sobre o futebol brasileiro,o calendário de competições, e o grande desgaste dos jogadores em função da maratona de jogos.

Sempre bem articulado, o treinador apontou o campeonato brasileiro de futebol com um dos mais difíceis do mundo, tendo em vista que sempre sete ou oito equipes iniciam a competição com condições de conquistar o título da competição, algo que não acontece nos principais e milionários campeonatos nacionais de outros países, onde a disputa pelo título fica restrita sempre a duas ou três equipes e sempre as mesmas.

O mesmo acontece na Liga dos Campeões da Europa, onde os finalistas são quase sempre os mesmos.

Disse, ainda, que o nosso calendário de competições deve ser revisto, já que é praticamente impossível jogar duas ou três competições ao mesmo tempo sem sofrer baixas no elenco, e que para manter o bom nível de um equipe seriam necessários grandes investimentos para ser ter um elenco onde as modificações por contusões e mesmo por desgaste dos atletas fossem pouco sentidas no rendimento da equipe.

O treinador acerta quando diz que o nosso campeonato seja talvez o mais difícil e competitivo do mundo, porém erra, quando diz que o problema são as várias competições jogadas ao mesmo tempo e a necessidade de mudança de calendário.

Não que o calendário brasileiro seja perfeito e não necessite de ajustes, porém o problema principal não passa pelo calendário.

Em toda a Europa, onde se situam  os torneios mais balados, jogam-se três competições ao mesmo tempo, os campeonatos nacionais, as copas nacionais e a Liga dos Campeões ou Copa da UEFA.

Impossível imaginar um calendário ,anual, onde se jogasse apenas um campeonato por vez, como os campeonatos estaduais, depois a copa do Brasil,  em seguida o campeonato brasileiro,  e ainda a copa libertadores e a copa Sul americana. 
Isso sem contar ainda os dois jogos da Recopa  Sul americana e da Super Copa do Brasil  que deve voltar, em um único jogo, em 2015.

Os campeonatos devem ser jogados ao mesmo tempo, isso é fato.

A questão, então , se volta para as equipes que tem melhores condições financeiras para formar um bom elenco , e assim podem planejar e disputar todas as competições do ano em condições de disputar os títulos dessas competições.

E  é aí que se encontra o ponto chave para que se mantenha o  campeonato brasileiro como o mais competitivo, criando-se condições para que não tenhamos aqui, em um futuro próximo, apenas duas ou três equipes disputando o título dos torneios. 
E isso não passa por mudança do calendário.

Em outros esportes, como no voleibol e no automobilismo, as entidades que organizam as competições impedem que equipes sejam bem mais fortes que as demais, de maneira a garantir competitividade e de se ter um bom produto paras ser comercializado.

Isso acontece no voleibol do Brasil e na Fórmula Indy americana.

No caso, o voleibol e o automobilismo são esportes em que o grau de previsibilidade em um jogo ou em uma corrida são infinitamente superiores ao grau de previsibilidade de uma partida de futebol.

Uma excelente equipe de voleibol que lidere um campeonato se jogar dez vezes seguidas contra a equipe que estiver na última  posição, tem grande probabilidade de ganhar os dez jogos. 
O mesmo no automobilismo, onde um carro bem superior aos demais dificilmente deixa de repetir as vitórias em todas as corridas do campeonato .

No futebol é bem diferente. 
Se colocarmos o líder atual do campeonato brasileiro, o Cruzeiro, para fazer dez jogos contra o último colocado do campeonato, o Criciúma, é bem  provável que o Cruzeiro vença no máximo sete partidas.

As condições e combinações que podem acontecer em uma partida de futebol são infinitamente maiores que nos outros esportes citados.

No entanto, pelo paixão que o futebol produz, é praticamente impossível se fazer qualquer tipo de nivelamento nas equipes de maneira que os campeonatos tenham equipes equilibradas e o produto seja de qualidade.

O que se vê em todo o futebol europeu é que as equipes com melhores condições financeiras se distanciam cada vez mais e tornam-se praticamente imbatíveis, aumentando a previsibilidade quanto as conquistas das competições.

Isso é péssimo, pois o produto a ser comercializado - o campeonato - tem um algo grau de previsibilidade quanto a competitividade e  ao resultado final e os jogos perdem em muito o interesse do publico.

O mesmo acontece com as corridas de Fórmula 1, sempre enfadonhas , sem competitividade e com resultados repetitivos e previsíveis.

O caro leitor que chegou até aqui deve estar pensando que vou apresentar como solução a socialização do futebol. 
Nada disso.

A estrutura do futebol brasileiro tem vários problemas, porém se a CBF e Rede Globo - emissora que sequestrou e aprisionou os clubes pelo poder econômico -  fossem atacadas, o futebol brasileiro poderia estancar o processo que em breve levará o campeonato brasileiro a ter no máximo três equipes sempre disputando título.

Empoderar o clubes é o caminho, que hoje, em função de dívidas gigantescas, se curvam as migalhas oferecidas pela Rede Globo, que junto com a CBF , são as organizações que mais lucram, e muito, com o futebol brasileiro.

A receita dos clubes tem como rubrica principal as verbas de TV, essas verbas tem uma divisão que em breve levará os campeonatos a serem disputados apenas  pelos clubes de maiores torcidas, como Flamengo e Corinthians.

Isso foi estabelecido pela Rede Globo, que mistura propositalmente e em seu benefício, tamanho de torcida com índice de audiência.

Ora , um clube com uma grande torcida deve se beneficiar disso nas rendas dos jogos em que participa, fazendo da arrecadação das partidas uma fonte de receita e um diferencial no orçamento anual em relação aos demais clubes.

Já a Rede Globo estabelece - dentre outros menos relevantes aspectos - o tamanho das torcidas para definir o percentual  de verba que o clube receberá, estabelecendo assim uma relação de tamanho de torcida com o índice de audiência desejado .

Ocorre, no entanto, que uma boa audiência deve ser resultado de um produto de qualidade, ou seja, bons jogos, um campeonato competitivo com vários clubes com chances de conquistar o título do torneio.

Para que isso possa ser viabilizado, se faz necessário rever o percentual de verbas de transmissão de TV hoje em dia praticados por Globo, além, claro de democratizar as transmissões por TV aberta dos campeonatos de futebol.

Com isso os clubes teriam uma receita anual maior do que a atual já que a verba de TV é a principal fonte de receita dos clubes, que por sua vez  poderiam se planejar melhor para as competições, que por outro lado manteriam ainda mais o equilíbrio, e a TV ganhara em audiência pela qualidade do produto.

E assim, caro Cristóvão, as competições continuariam sendo disputadas simultaneamente, em maior equilíbrio e com muitos mais atrativos.

Onde tem Globo tem atraso e retrocesso.

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