quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Occupy Everything

 Como mudar o mundo
Por Alberto Dines em 18/09/2013 na edição 764
Editorial do Observatório da Imprensa na TV nº 701, exibido em 17/9/2013
Bem-vindos ao Observatório da Imprensa.
A questão é essa: quem expulsou o povo das ruas? Por que razão evaporou-se aquela vontade de manifestar-se que levou tanta gente às ruas do país em junho e julho para dizer o que sentia? Foi a repressão policial ou a violência dos Black Blocs a responsável pela repentina virada de página?
Como sempre, nossa mídia tem pressa em colocar o ponto final nos debates, não gosta de esticar as controvérsias, aparentemente com receio de dar voz àqueles dos quais discorda.
A legitimidade da violência política vem sendo discutida há 300 anos e não apenas nas assembleias, academias e também na literatura. Os possessos, de Fiódor Dostoiévski, vale para os dias de hoje. O anarquismo e o niilismo precisam ser atualizados, caso contrário transformam-se em equívocos.
Se a imprensa não discute os fenômenos gerados pela realidade mutante, quem o fará? E por que ninguém lembra das façanhas dos heróis da não-violência? O Mahatma Gandhi, o pastor Martin Luther King e o seringueiro Chico Mendes nunca pregaram quebra-quebras. É verdade: foram covardemente assassinados, mas mudaram o mundo.
Os Black Blocs conseguirão algo semelhante?
Fonte: OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA

Caro Dines,
A realidade é complexa, nova e global.
Para entendê-la é necessário ir além dos símbolos e conceitos do passado.
Os Black Blocs são apenas uma pequena expressão de toda essa complexidade.
Eles não irão mudar o mundo, eles fazem parte, apenas,  de um conjunto de mudanças em curso.
Assim como o caro Maringoni, em seu artigo de CARTA MAIOR intitulado ' Cobrir o Rosto é o de Menos ', o nobre observador reduz a complexidade em apenas uma de suas formas de expressão.
Sugiro a leitura do texto a seguir , assim como o manifesto da Adbusters.


Dê uma olhada pela janela hoje. Não foi sempre assim. Não será assim pra sempre”


No aniversário de dois anos do Occupy Wall Street, a Adbusters publica manifesto celebrando as novas formas globais de articulação e afirma que o capitalismo está em “estado terminal”
Da Redação

Ontem (17), no aniversário de dois anos do Occupy Wall Street, movimento no qual centenas de manifestantes protestaram acampados no coração do sistema financeiro mundial, a organização Adbusters publicou um manifesto que chama a atenção para as novas formas de articulação de movimentos e para o declínio do sistema capitalista.
A Adbusters descreve-se como “uma rede global de artistas, ativistas, escritores, estudantes, educadores e empresários que querem desenvolver um novo movimento ativista social da era da informação”. Criada em 1989 por Kalle Lasn e Bill Schmalz, em Vancouver (Canáda), a organização mantém a revista homônima, focada em causas políticas e sociais, na seu maioria com viés anticonsumista e anticapitalista. A publicação é integralmente mantida pelos leitores e possui tiragem bimestral de 120 mil exemplares.
No manifesto, a Adbusters destaca uma nova “arquitetura de protestos”, onde demandas pontuais geram um “amplo desejo de reiniciar a máquina por completo”. Para exemplificar este novo paradigma das ruas, o manifesto cita as manifestações de junho no Brasil. Por fim, a organização afirma que o capitalismo está em um “estágio de declínio terminal”.

Leia a íntegra do manifesto publicado pela Adbusters (a tradução é do Movimento Pró-Corrupção):
Fonte: REVISTA FÓRUM

occupy

“Ei, todos vocês respirando mundo afora.

No segundo aniversário do Occupy Wall Street, aqui vai um manifesto para encher seus pulmões:
Olhe pra fora da sua janela hoje e admire quão permanentes são todas as coisas.
Os carros seguem fiéis, aparecem e desaparecem sem fim. Os arranha-céus financeiros enquadram as ruas, investindo seus dólares e depositando seus cheques de pagamento com facilidade. As pessoas são derramadas pra fora de seus apartamentos tomando seu caminho ao escritório, visitando amigos, procurando emprego. A ordem social, todas as interações básicas do dia-a-dia, são previsíveis, normais, na maioria das vezes igual que ontem. A rigidez do sistema político não está em questão.
Agora imagine que tudo isso se rompa. Que tudo que você conhece seja virado de cabeça pra baixo. A cafeteria é fechada. A porta do banco é fechada. As pessoas param de seguir até os comandos mais básicos.
Olhando pra fora da janela hoje, temos aquele mesmo sentimento que tivemos no dia 16 de Setembro de 2011, o dia antes daqueles primeiros corajosos ocupantes armarem suas barracas e começarem suas ações em Wall Street. Apenas desta vez, quando contemplamos através do vidro, existe uma esperança de algo que possa mudar de fato a nossa passividade com a qual observamos o Mundo. Nós agora somos confiantes nesta geração que não éramos antes. Ainda existem chacoalhões que podem chocar a ordem financeira e psicológica. Existe uma crescente convicção que as coisas que podem acontecer, de fato acontecerão. O mundo ainda está pronto pra consegui-las.

A REVOLUÇÃO É UM RIZOMA

O que experimentamos em 2011 ainda está reverberando por todo o Mundo. Recentemente, na Turquia e no Brasil, aquele sentimento visceral, que o futuro não computa, é mais vibrante do que nunca. E devido a esta ansiedade corrosiva nas profundezas de uma crescente massa de pessoas, o novo modo de ativismo, o que o jornalista espanhol Bernardo Gutiérrez chama de “nova arquitetura de protesto”, está se espalhando como um frenesí: O que começa com simples demandas – Não corte as árvores, não aumente as tarifas de ônibus, não eleja este juíz corrupto – irrompe em um amplo desejo de reiniciar a máquina completa.
No horizonte político que está por vir, você pode esperar que a qualquer momento haverá uma quebra, um escândalo, uma greve de professores ou uma decepção em cadeia, você sempre encontrará um enxame de abelhas por baixo das coisas. Quando você tem uma geração conectada, todas as suas demandas únicas e individuais também são conectadas. Os protestos se tornam uma cornucopia, e não um caminho em linha reta. E o desejo não é destruir o sistema, mas hackeá-lo, recodificá-lo, requisitá-lo…. a ver que a revolução não é uma pirâmide, mas sim um rizoma… a ver que o sistema não é um texto imutável, mas uma linguagem de computação em mudança permanente, um algoritmo.
Mais do que nunca, estamos vendo a atualidade do altruísmo moderno, “somos todos um”. Agora, como temos a tecnologia para nos organizarmos, – e quem se importa que a NSA esteja lendo tudo isso? Damos as boas-vindas para que ouçam e inspirem-se – esta primeira geração global das história poderá se articular de forma mais clara, mais visceral, mais intensamente e numa frequência como nunca se teve antes.
Dê uma olhada pela janela hoje. Não foi sempre assim. Não será assim pra sempre.

UMA GERAÇÃO SOB PRESSÃO

Essa geração está sob pressão. Lideranças e especialistas como David Brooks e Andrew Sorkin riem de nós como garotos ingratos e radicais sem-causa, pessoas que apenas não querem trabalhar tanto quanto as gerações anteriores. Mas estes caras não entenderam nada. A luz da engenharia humana foi acesa. Mas nenhum mecânico ou velho paradigma pode arrumá-la. Estamos experimentando uma falência no sistema global como nunca se viu. Mas nenhum programador da velha linguagem pode reescrevê-lo. A Terra está ficando doente. A cultura está em uma decadência terminal. As doenças mentais são a causa número um para a perda de postos de trabalho nos EUA. Que outro indicador precisamos? A rejeição não é algo ingrato, mas é uma bela e sincera vontade de um amanhã são e sustentável. Mas como os parafusos estão cada vez mais apertados… bem… você pode ver o resultado em todos os lugares.
No último mês de Julho, quando centenas de milhares de manifestantes estavam marchando nas cidades por toda a Turquia e Brasil, o diretor criativo da Adbusters (Pedro Inoue) faltou no trabalho pra se juntar à magia das ruas. Ele nos enviou um testemunho do centro de São Paulo, um retrato que tornou-se a espinha dorsal de uma de nossas mais espirituosas e esperançosas publicações até hoje. Nós o acusamos por algum tempo de ser negativo demais… ainda que nossos leitores tenham visto aqui uma forte luz:
“É algo que você sente quando o amante está rindo nos seus braços e você se sente como se o seu coração fosse partir porque não existe mais espaço pra coisas boas lá dentro. A ‘brisa’ começa a fazer você flutuar. Nós estávamos andando em direção ao Palácio do Governador, tendo tempo pra conversar e olhar pras pessoas no caminho agitando bandeiras de seus apartamentos nas janelas, ouvindo os cânticos indo e vindo como ondas no mar de pessoas. Olhei para os olhos das crianças. Ele continuou falando, mas me lembro apenas destas 9 palavras:
‘Cara, que belo mundo é esse em que vivemos’, ele disse.
Eu estava hipnotizado pelo brilho em seu olhar. Faíscas. Flashes. Pulsos. Raios de luz. Quando a revolução global finalmente chega… Irá iluminar a todos os lugares como aconteceu.”
As condições que impulsionaram os anarquistas Gregos, a Primavera Árabe, os Indignados da Espanha, #OccupyWallStreet, a revolta estudantil do Chile, a banda Pussy Riot, a revolta em Quebec, #idlenomore, Yo Soy 132 no México, e as insurreições em Istambul, Lima, Bulgária e São Paulo têm apenas piorado. A desigualdade está alcançando proporções obscenas na América e em todos os continentes. Existe uma permanente concentração de riqueza, um permanente crescimento dos bancos, um aumento permanente das Operações de Alta Frequência (HFTs), confusões derivativas e outros algoritmos financeiros sorrateiros que fazem com que os mercados cada vez mais fujam de qualquer controle humano. US$1.3 trilhões em transações financeiras especulativas continuam passeando pelo planeta todos os dias. O palco agora está armado pra uma catástrofe financeira muito pior do que a de 2008. E dentro de cada um de nós, o desejo pelo Real está crescendo: Economia real. Democracia real. Possibilidades reais. Humanidade real. Liderança real. Horizontes reais. Interações reais. Coisas reais. Vidas reais.

TRÊS METAMEMES PARA O FUTURO

Aqui no Adbusters, nós vemos 3 grandes ideias táticas de revolução, três metamemes, que têm o poder de desviar esse nosso trem global desgovernado de seu encontro com o desastre. Não tenha dúvidas, o crash é um mundo brutal – uma realidade bárbara. Acontece que nenhum de nós deveríamos buscá-lo de forma feliz e contente. Ainda, não podemos apenas seguir o fluxo, acompanhar a velocidade e acreditar na inércia de nossa máquina econômica do juízo final.

A primeira coisa que podemos fazer é chamarmos a uma reflexão radical de nossos sistema econômico global. O capitalismo neoconservador desenfreado está fazendo com que a humanidade regrida sem nenhuma oposição a ele por quase duas gerações até agora. Ele ainda não deu respostas e não tem respostas para as maiores ameaças do futuro, chamadas às vezes de mudanças climáticas. Estudantes de economia e economistas heterodoxos precisam levantar-se nas universidades de todos os lugares e demandar uma mudança nas fundações teóricas das ciências econômicas. Nós precisamos abandonar quase tudo o que pensamos que sabemos a respeito dos deuses do progresso, felicidade e conhecimento. Nós precisamos reinventar a indústria, a nutrição, a comunicação, os transportes, a moradia e o dinheiro em novos tipos pioneiros de economias, bionomias, psiconomias e economias ecológicas, que estejam prontas para o trabalho de gerenciar nosso abrigo na Terra.

A segunda coisa que podemos fazer é inaugurar uma nova era de transparência radical…. adicionar o direito de viver em um mundo permanente como um novo direito na constituição das nações e na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Os recentes acontecimentos na Síria são um exemplo perfeito de quanto o sigilo dos maiores poderes do mundo levam à confusão e à catastrófica possibilidade da falência. Assad deve sair com um tipo de apetite assassino como nunca se viu desde a II Guerra Mundial, por nenhuma outra razão senão o fato de que não se pode mais confiar nos EUA. A transparência radical é o único caminho a uma democracia viável no futuro.

A terceira coisa que podemos fazer é inspirar-nos e aprender lições de uma nova revolucionária tática no ativismo global – o algoritmo da revolução. A internet inverteu uma dinâmica de poder vinda de vários séculos. As ruas agora têm um poder sem precedentes. Através do hackeamento, da organização rizomática, dos memes virais, se pode paralisar cidades, trazer países inteiros a areias movediças… os protestos e revoltas podem assustar mercados impactando em 10% suas ações em um único dia, como aconteceu recentemente na Turquia, e, se as pessoas estiverem com revoltadas o suficiente, podemos forçar até o mais arrogante dos presidentes ou primeiros-ministros à discussão democrática.

No século XXI, a democracia pode parecer como isso: um feedback dinâmico, visceral e sem fim entre as estruturas de poder entrincheiradas e as ruas. Neste novo modelo, o poder corporativo será sempre atenuado pelas claras demandas articuladas em novas regras de novos modelos econômicos, ambientais ou políticos, por debates viscerais e referendos sobre questões críticas, pela revogação dos alvarás de corporações que quebrarem a confiança pública e por novas leis e emendas constitucionais sobre fundamentos democráticos como o sigilo, a pessoalidade corporativa e as regras pelas quais as nações travam guerras. Todo departamento de governo, todo ministro e todo estabelecimento político, ou mesmo qualquer grupo de reflexão, comunicadores midiáticos e CEOS, estarão sob uma pressão mortal, em uma base quase diária, para que se dobrem a qualquer pulso de mudança emanado pelas pessoas.
Com o passar desse segundo aniversário do Occupy Wall Street, talvez com chamas fumegantes, talvez com apenas algumas faíscas, nós podemos nos consolar com uma coisa: Nosso sistema global atual – o capitalismo – está em um estágio de declínio terminal… e enquanto seu cadáver ainda está se remexendo, nosso trabalho – seu, meu, de todos nós – é manter-nos atentos e em estado de vigilância, seguindo trabalhando em nossas próprias vidas… Nós coibimos as grandes corporações, nós recusamos comprar produtos massivamente divulgados, nós exploramos meticulosamente informação livre de toxinas, nós comemos, viajamos, socializamos e vivemos o mais positivamente possível… nós lutamos por nossa felicidade… nós construímos confiança uns nos outros e jogamos o #killcap pelo menos uma vez ao dia… e o mais importante, nós focamos nossos olhos no horizonte e esperamos até que chegue o nosso próximo momento.”

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