terça-feira, 29 de janeiro de 2013

A Culpa é da Lâmpada

A  CULPA  É  DA  LÂMPADA

 

El País’ caiu no conto do vigário

Por Alberto Dines em 29/01/2013 na edição 731
“Barriga” do ano, dizemos nós. “Tremendo error” acusa Tomàs Delclós, o “defensor del lector” (ouvidor, ombudsman).
“Una de las mayores equivocaciones de su historia”, admite o próprio El País na capa da edição de domingo (27/1). A dramática matéria de duas páginas com os pormenores, minuto a minuto, do espetacular fiasco teve um título destinado a entrar para os anais da autoflagelação e autocrítica: “El gran patinazo”, a grande derrapagem.
A falsa foto de Hugo Chávez entubado publicada na capa da edição da quinta-feira (24/1) não pode ser interpretada como um novo revés da mídia impressa. Ao contrário: é mais uma demonstração dos embustes e engodos que circulam e envolvem a rede mundial de computadores.
Os 37 anos de uma incomparável história de sucesso jornalístico e empresarial protagonizada pelo “periódico global en español” foram maculados não por uma desgraçada decisão, mas por uma incrível e arrastada indecisão.
Apesar da firmeza e presteza com que o jornal logo depois procurou interromper e reparar a divulgação da falsidade assumindo plenamente todas as responsabilidades, ficou registrada uma indelével e inadmissível vacilação. Vacilo, como dizem os nossos jovens.
História inverossímil
A partir da legenda da foto falsa até o relato do trágico suspense que a antecedeu [ver remissões abaixo] flagrou-se uma hesitação impensável, um espantoso titubeio num organismo que deveria estar firmemente amarrado por convicções seminais.
A premissa elementar que rege o processo decisório de um veículo jornalístico é que a sua credibilidade não pode ser colocada em risco. Ponto. Sob nenhuma hipótese. Ponto de exclamação.
Assumido este compromisso crucial, ontológico, torna-se mais fácil lidar com qualquer das dúvidas, desafios e, sobretudo, as infernais tentações do dia a dia.
A ausência do diretor de Redação, Javier Moreno – naquele momento em Davos, Suíça, acompanhando o Fórum Econômico Mundial –, contribuiu de alguma maneira para amaciar o dogma intocável. A cadeia de comando do El País funciona impecavelmente e não poderia ser diferente num jornal construído para ostentar um padrão contínuo de qualidade em todas as edições, páginas e secções.
Faltou, porém, logo no início do episódio, o murro na mesa destinado a dissolver, de saída, as primeiras dúvidas e consolidar certezas. Isso se comprova quando no meio da tarde da quarta (23/1), o diretor-adjunto Vicente Jimenez faz uma videoconferência pelo Facetime com o seu superior, Javier Moreno:
– Temos a foto de uma pessoa que parece Hugo Chávez em um centro cirúrgico. Está sendo oferecida por uma agência e estamos fazendo gestões para consegui-la porque primeiro foi oferecida a El Mundo [principal competidor, de tendência claramente conservadora].
– O que sabemos desta fotografia? – pergunta Moreno, experimentado jornalista, professor de jornalismo, químico de profissão, figura firme e tranquila.
Neste exato momento, e a partir da inocente pergunta, começa a fatal sucessão de erros: o prudente diretor caíra na armadilha da competição. O ardiloso vírus da disputa concorrencial trincou a cláusula pétrea da credibilidade. Moreno fascinou-se com o produto, sem se importar com as suspeições que o envolviam.
– Não entramos neste tipo de leilão, mandem a Gtres Online [nome da agência vendedora] enfiar a foto no... – teria dito o mesmo Javier Moreno se fosse dado a este tipo de imprecação e não estivesse a cerca de mil e quinhentos quilômetros da redação.
Aparentemente, os negociadores do El País não sabiam que o concorrente desistira do negócio. Mas sabiam – sem estranhar – que a agência vendedora da foto havia feito uma redução de 50% no preço do trambique (de 30 mil para 15 mil euros).
Pechincha dessas proporções é gritantemente suspeita, comprometedora. Coisa de embusteiro. A direção do diário também não desconfiou quando a agência ofereceu alguns dados sobre a foto: fora tirada por uma enfermeira cubana, enviada por e-mail à sua irmã, moradora na Espanha, que, por sua vez, procurou uma amiga que colaborava na agência.
Um estagiário recém-admitido no poderoso rotativo Voz de Cabrobó dos Matos teria percebido que o relato não se sustentava: uma enfermeira em Cuba – um estado policial – conseguiria entrar na sala de cirurgia ou UTI com uma câmera ou celular para fotografar o paciente mais vigiado do mundo e escapar incólume? Nem em filme de James Bond.
Imagem fajuta
Como exercício dialético, imagine-se agora se a foto fosse verdadeira: El País poderia badalar o furo de reportagem ou teria que admitir que comprou a foto na feira de bugigangas digitais? E o que aconteceria 24 horas depois de publicada a façanha? Além das congratulações de leitores bajuladores, matérias autogratulatórias, promessas de prêmios e outras mundanidades durante um par de dias (a fama tem vida curta também no segmento de jornais), qual seria a efetiva contribuição da foto para acabar com o secretismo que envolve a cirurgia na “região pélvica” do caudilho bolivariano?
Que interesse para o leitor e para a opinião pública teria a publicação da penosa foto de um líder político visivelmente sofrido, anestesiado e entubado num hospital? Se o paciente estivesse morto – ao contrário do que apregoa o governo venezuelano – a foto verdadeira teria um valor informativo. Mas estando vivo e a foto, verdadeira, constituiria uma clara invasão de privacidade.
Se o desafio jornalístico era questionar a cortina de silêncio em torno da saúde de Hugo Chávez (protegido há dois meses num bunker hospitalar cubano), existe pelo menos uma dúzia de opções menos arriscadas, mais legítimas e jornalísticas.
O erro maior dessa incrível coleção de infelicidades foi o de não mostrar a foto falsa ao correspondente em Caracas, Ewald Scharfenberg, por receio de que a conexão fosse interceptada pelas autoridades venezuelanas. Ou por concorrentes. Recomendaram apenas que ficasse atento às reações do governo porque preparavam algo importante.
Se a imagem fosse mostrada ao experimentado correspondente ele teria negado prontamente a sua autenticidade, como de fato o fez, quando já era demasiado tarde: a versão online do jornal já estava na rede e o jornal rodando (inclusive em São Paulo, onde se imprime a edição “brasileira”). Na verdade não se tratava de uma foto, mas do frame de um vídeo de 3m39s que rolava na web há vários dias, já conhecido na Venezuela e sem qualquer sinal de legitimidade ou veracidade.
Sentimento trágico
Moral da história: a internet é uma rede de comunicação, ferramenta de busca, arquivo de dados, não um veículo jornalístico. Ponto. É uma selva onde convivem grandes, médios e pequenos predadores, igualmente empenhados em ludibriar. Ponto de exclamação.
Há na web blogs, sites e portais que obedecem estritamente aos preceitos do bom jornalismo. A agência Gtres Online, acompanhada por milhões de cúmplices, não faz parte deste grupo. Estão no negócio do vale-tudo e da rapinagem.
El País caiu num conto do vigário. Ponto. Seu infortúnio – passageiro, certamente – servirá de lição aos tolos e basbaques que apregoam o triunfo próximo e definitivo do jornalismo cibernético. Ponto de exclamação.
A dignidade com que o jornal enfrenta a adversidade – herdeira do celebrado sentimento trágico da vida – jamais poderia prosperar nas nuvens digitais.



OS  LIMPOS E SAUDÁVEIS  BLOGUES  SUJOS



Não é de hoje que o jornalista Alberto Dines não aceita a tese da internete como um veículo  de jornalismo. 

Isso fica claro em muitos de seus textos, assim como é escancarada sua admiração pelo jornal espanhol El País.  

São posições, normais, em um ambiente novo, transformador e fascinante.

De fato na internete temos de tudo, até mesmo esse blogue e o observatório da imprensa. 

A internete não é boa nem má, ela é um espaço, anárquico, onde proliferam todas as formas de conteúdo, até mesmo conteúdos jornalísticos  praticados por pessoas que não passaram pelos ritos de iniciação na profissão de jornalista.

Profissão, aliás, que não é exigida uma qualificação, formação de nível superior para exercê-la. 
A título de exemplo, o jornalista do jornal nacional da tv globo, Willian Bonner, declarou , em alto e bom som, que necessita apenas de quatro meses para formar um jornalista. 
Formar ou adestrar ?
Formar ou iniciar ?  
Estamos em um ambiente, o ambiente da imprensa, onde os incensados jornalistas não necesariamente são formados, informados e na maioria esmagadora dos veículos da grande imprensa, reproduzem, com ecos poderosos, a voz do dono dessas mídias.  
É fato, queira ou não o nobre observador, que o jornalismo vive um momento de crise existencial. 

Já a internete protagonizou muitos momentos em que informações, cuidadosamente bloqueadas pela grande imprensa, foram disponibilizadas para o público.  
Talvez o wikileaks seja um bom exemplo e, cabe lembrar, que o portal de Julian Assange atuou como uma agência fornecendo conteúdos para inúmeros jornais, ou melhor, jornalões.  
Em função do conteúdo disponibilizado por  Wikileaks, muitos jornalões e jornalistas colocaram em dúvida divulgar ou não as informações, claro, levando em conta os filtros ideológicos e políticos dessas mídias. 

Informação é poder, não é meu caro observador ?  

Algumas informações de wikileaks, é bom lembrar, envolviam a imprensa e alguns jornalistas no furos apresentados.  
Mas isso, apesar da semelhança com o que tratamos agora, é um outro assunto em que podemos aprofundar esse debate, que aliás é sempre saudável e muito agradável.

Voltando ao seu artigo,  agência Gtres online é apenas mais uma agência, entre muitas que existem por aí, ou não ?

Cabe então ao jornal, no caso o espanhol El País, verificar a veracidade das informações fornecidas antes de publicá-las e a internte, no caso, não tem nada a ver com isso. Ao colocar a responsabilidade na internte, o nobre observador, imagino, deve culpar o fabricante de lâmpadas pela falta de energia elétrica.

O El País errou e errou feio. 
Recentemente, aqui no Brasil maravilha, a revista Veja publicou na capa um foto de Hugo Chavez totalmente modificada com os recursos do photo shop (que imagino que o nobre observador conheça. não o photo shop mas  a capa de veja). 

O objetivo era transformar o rosto de Chavez em alguém ameaçador e cruel, algo que  sua expressão de bonachão não contempla.  A foto alterada propositalmente ocupou a capa da revista Veja, mas, como tem ocorrido com frequência, a farsa foi desmascarada na internete que disponibilizou a  foto verdadeira sem maquiagens. 

Cabe ainda lembrar a fúria do Rei de Espanha, aquele que gosta de matar elefantes, ( os elefantes nunca esquecem) quando se dirigiu a Hugo Chavez , no melhor estilo colonizador, pedindo para que o presidente venezuelano se calasse.

O que tem em comum o jornal El País, a revista Veja e o Rei .Ponto de interrogação. A resposta é simples e até mesmo um jornalista iniciante sabe responder: A oposição a Hugo Chavez. Isso seria normal se fosse uma oposição sadia  e civilizada, porém sabemos todos, até mesmo os inocentes do leblon, que todo e qualquer regime que se oponha a ordem, ou melhor, a desordem neoliberal vigente é alvo de tentativas de golpes( alguns com a participação da grande imprensa como no caso da Venezuela no início da década de 2000) de estado. 

A História recente da América Latina nos últimos 15 anos está aí para comprovar o que escrevo, tanto na tentaiva de golpes  quanto na participação popular na preservação de novos caminhos civilizatórios e democráticos, o que também derruba a tese que a História teria acabado. Mas isso também é uma outra história em que terei o imenso prazer de debater com o nobre observador.

Voltando ao assunto, o nobre observador refere-se a internação de Hugo Chavez em um bunker, protegido de todas as formas de atentado e sem a fartura de informação para a imprensa. Penso , que pelo histórico de atentados, tal preocupação é justificável. 
No caso de Wikileaks, o excesso de informação foi duramente criticada pela grande imprensa. Interessante, não é meu caro. Ponto de interrogação. 

Cabe ainda lembrar que  a secretária de estado Hilary Clinton, recentemente, teve desmaios e internações para tratar de um suposto "coágulo" sem que o assunto ganhasse tanto destaque na grande imprensa. Nenhuma enfermeira, em um ambiente supostamente democrático e livre,( imagino que ela Sr. Clinton não esteve internada em um bunker) se interessou em tirar fotos da secretária para vender `a grande imprensa. Ponto. 

E que dizer do  ex-primeiro ministro israelene, Ariel Sharon, vítima de um AVC e em coma já por alguns anos. ponto de interrogação. Além obviamente da ausência de supostas fotos do  ex primeiro ministro no leito hospitalar, nada se produz na grande imprensa. 

Então, meu caro observador, o diário espanhol, errou feio  por conta de sua obsessão política, e  que nada tem a ver com a produção da internete, o futuro do jornalismo. 

A credibilidade é algo que se conquista, independente de nossas orientações políticas que em hipótese alguma podem influenciar os conteúdos a ponto de distorcer os fatos e a realidade. 

Infelizmente a grande imprensa, não apenas brasileira mas de todo ocidente, está mergulhada em um esgoto de mentiras, falsificações, manipulações e tentativas de golpes de estado. 

Vida longa para a internete e para o jornalismo alternativo.

A propósito, meu texto teve como referência  informações obtidas na Agência Carta Maior e no Jornal Brasil de Fato. Ponto final.

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